Interferência interrompe transmissão da BBC no Irã. Estudantes denunciam cerco às universidades 15/06/2009
- BBC
Os serviços de rádio e televisão da BBC enfrentam interrupções no Irã nesta segunda-feira, devido a uma interferência nos satélites que a empresa usa no Oriente Médio para emitir o sinal do canal BBC Persian (noticiário da BBC em persa) no país. Técnicos especializados rastrearam o problema e disseram que a interferência está vindo do Irã.
As falhas começaram logo depois das 13h45 da última sexta-feira (hora em Londres, 9h45 em Brasília), mas segundo a BBC, a situação vem piorando gradativamente.
"No domingo, a interferência se tornou tão séria que afetou outros serviços da BBC, como o canal BBC Arabic (noticiário da BBC em árabe) e as transmissões de rádio em partes da Europa, do norte da África, do oeste da Ásia e do Oriente Médio, além de outros usuários dos satélites", afirmou Peter Horrocks, diretor do Serviço Mundial da BBC, do qual a BBC Brasil faz parte. "Nesta segunda-feira, a interferência tem sido intermitente."
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"Aparentemente, as autoridades iranianas têm um padrão de comportamento de limitar a circulação de notícias sobre os resultados e os fatos pós-eleições", disse Horrocks. Além disso, segundo ele, o correspondente da BBC em Teerã, John Simpson, e seu cinegrafista foram detidos brevemente depois de terem realizados algumas filmagens na cidade.
Outros órgãos de imprensa estrangeiros também reclamaram da dificuldade de atuar no Irã nos últimos dias. A rede de TV estatal italiana RAI disse que, quando uma de suas equipes de filmagem cobria um protesto nas ruas, seu intérprete iraniano apanhou da polícia e suas fitas foram recolhidas.
O canal sueco STV anunciou que seu enviado especial recebeu ordens de "sair do Irã o mais rápido possível, porque as eleições já acabaram".
A rede de televisão árabe Al Arabiya afirmou que seus escritórios no país foram fechados por "motivos desconhecidos" por uma semana. E a organização Repórteres sem Fronteiras afirmou que as transmissões em farsi da Voz da América foram bloqueadas no fim de semana.
Segundo o jornal reformista iraniano "Aftab-e-Yazd", a imprensa doméstica também está enfrentando problemas, com muitos jornais sendo censurados antes de serem impressos e restrições nas transmissões de notícias sobre os candidatos que teriam perdido as eleições.
A entidade Repórteres sem Fronteiras disse que vários jornalistas do Irã foram presos, inclusive alguns famosos no país. Ainda segundo o grupo, a internet e as redes de telefonia celular têm funcionado com bastante lentidão. Mesmo assim, muitos iranianos estão usando blogs e sites de relacionamento para exibir fotos, vídeos e informações sobre os protestos.
Universidade de Teerã está isolada, dizem estudantes
Estudantes relataram por e-mail e telefone à BBC Brasil que a Universidade Teerã se transformou num dos maiores focos de tensão da capital do Irã nesta segunda-feira.
O iraniano Parham D. relatou que as imediações da universidade, tradicional ponto de encontro de intelectuais e reformistas iranianos, estão cercadas por forças de segurança, e que muitas lojas e bancos estão fechados por medo de mais violência. "Eu estou do lado de fora e outros estudantes vieram me falar que há vários manifestantes presos em um dos campus. A polícia não deixa eles saírem para evitar que se juntem a outros manifestantes."
Parham acrescentou que o maior medo por parte das pessoas é a polícia secreta. "Eles andam à paisana, se misturam entre os estudantes. Se nós nos reunimos em um grande grupo, a polícia chega e bate com cacetetes", explicou ele, afirmando que a determinação de estudantes protestarem contra a reeleição do presidente Mahmoud Ahmadinejad é grande.
"Todos nós iremos protestar, não temos mais nada a perder. Tem pessoas entre nós que não querem mais ficar caladas, a frustração foi muito grande".
Protestos eclodiram em Teerã no sábado (13), depois que Ahmadinejad foi reeleito com mais de 62% dos votos. O adversário reformista Mir Hossein Mousavi, que aparecia como favorito em pesquisas, ficou com 33% no pleito. O resultado levantou suspeitas de fraude por parte de Mousavi e outros líderes de oposição.
Manhã tensa
Segundo outro estudante, Yashar K., algumas lideranças alertaram para o fato de as forças de segurança iranianas terem sido autorizadas a usar munição letal nas imediações da universidade. "Isso causou um medo muito grande, decidimos que as mulheres ficariam mais comedidas nas marchas para evitar que se machucassem, mas muitas recusaram".
Em 1999, a Universidade de Teerã foi palco de manifestações estudantis contra o regime e culminou com a morte de vários estudantes. "A lembrança de outras manifestações nos causa preocupação, mas não vamos recuar", disse Yashar.
Outros líderes reformistas se juntaram às críticas contra o resultado da eleição e novos protestos ganharam força, inclusive em outra universidade, a Universidade Sharif. O programador Kamyar disse que presenciou esta manhã confrontos entre partidários de Mousavi e de Ahmadinejad.
"Eu estava passando por um dos bairros onde havia uma manifestação quando homens com cacetetes chegaram e entraram em brigas com o pessoal do Mousavi", relatou Kamyar. Ele explicou que há um medo muito grande na capital de que o pior ainda estaria por vir. "Muitas pessoas, especialmente as mais velhas, recordam de cenas parecidas em outros anos e os resultados foram mortes por causa da repressão da polícia".
Kamyar também disse que viu várias pessoas, inclusive mulheres, serem presas e levadas em carros por estarem reunidos em grande número. "Em alguns casos, os militantes revidavam, atirando pedras nos policiais, que saíam correndo. Os presos então conseguiam escapar da polícia", falou Kamyar.
O governo bloqueou o envio de mensagens por celular, páginas de relacionamento social e, segundo relatos, fechou jornais pró-reformas.
Revolução
O ativista Naeim K. disse que há um clima de motivação entre os militantes por reformas. "Pode parecer exagerado, mas eu me sinto no meio de uma nova revolução. Há muita revolta entre as pessoas, principalmente os jovens, com o resultado da eleição", enfatizou Naeim, que também revelou que estaria indo a qualquer protesto que estivesse para acontecer.
Segundo ele, os jovens estudantes estão "muito motivados para trazer uma reforma ao país e que a intimidação não faria que recuassem".
Segundo ele, havia na manhã e na tarde desta segunda-feira um grande contingente de policiais no centro da capital, onde milhares de partidários de Mousavi se reuniram para protestar contra os resultados eleitorais. "A presença do Mousavi nos dará mais força. Vamos até o fim agora".