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Planalto reinterpreta fala de Lula sobre pleito iraniano
21/06/2009 - Cláudia Antunes - Folha de S.Paulo

Enquanto a polarização política no Irã aumenta o debate sobre o tom mais adequado das reações de governos estrangeiros, o Planalto tenta relativizar as declarações feitas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva --que comparou a oposição iraniana a uma torcida de futebol perdedora-- e afirma que o Brasil ainda não tem posição final sobre o tema.

"Nós temos que observar. O governo, informado pela embaixada, fará suas análises. Vamos discutir isso com o presidente, e isso vai servir para orientar nossa postura concreta", diz Marco Aurélio Garcia, assessor para assuntos internacionais da Presidência.

Ele não quis adiantar o que o governo fará caso o confronto entre linha dura e reformistas resulte em mais violência: "Vamos ver. Pode ter certeza de que o Brasil não vai se omitir". Ao mesmo tempo, reitera que a orientação "não é ficar distribuindo certificado [de comportamento democrático]".


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"Se você começa a distribuir certificado, esses países vão se fechar, isso será usado como um argumento conservador-nacionalista."

Garcia estava com Lula em Genebra na segunda-feira passada, quando o presidente, mesmo ressalvando que esperava mais informações, disse ter a impressão de que era "protesto de quem perdeu" a reação opositora à proclamação da vitória do presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad.

Questionado então se o Brasil reconhecia a reeleição de Ahmadinejad, o chanceler Celso Amorim disse que era preciso aguardar. Mas Lula depois reafirmou que achava difícil que tivesse havido fraude, dada a vantagem de 30 pontos do vencedor na contagem oficial.

Exceção

O Brasil não costuma se pronunciar de maneira tão direta sobre a política interna alheia, e as frases de Lula causaram críticas e estranheza.

Antônio Carlos Lessa, professor do Instituto de Relações Internacionais da UnB (Universidade de Brasília), acha que a posição adequada no caso seria aguardar o desfecho da crise. "É um assunto interno do Irã, e o Brasil não tem motivos para se pronunciar. O desejável seriam manifestações menos específicas, como afirmar que a verdadeira vontade dos eleitores deve ser respeitada."

Também da UnB, Eduardo Viola se diz perplexo -"foi a única democracia que reagiu assim"- e recomenda fórmula parecida. Ele considera que de fato houve fraude, mas que apontá-la de fora "daria argumentos à linha dura".

Já Maria Regina Soares de Lima, do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio), defende Lula. Para ela, o presidente quis indicar que "não se poderia lutar contra um resultado" eleitoral. "A frase tem que ser colocada no contexto de uma política externa de não intervenção."

A professora diz que a polêmica baseia-se na "visão equivocada" de que o Brasil poderia evitar relacionar-se com governos "complicados". "Se o Brasil pretende ter um papel internacional, terá de ter relações com países cujo sistema político não é igual ao nosso."

Marco Aurélio Garcia argumenta que Lula trabalhava com a "posição ponderada" do governo americano e com declarações de Javier Solana, chefe da diplomacia da União Europeia --que, em visita ao Egito, dissera que "a análise das eleições levará algum tempo".

Mas, no mesmo dia, o Conselho Europeu divulgou nota em que, sem tomar partido sobre o resultado eleitoral, dizia-se "seriamente preocupado com o uso da força contra manifestantes pacíficos". Logo depois, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, falou em "fraude".

Na ocasião, Sarkozy acabava de voltar do enterro do ditador Omar Bongo, que governou por 41 anos o Gabão, Estado-cliente da França. A coincidência mostra como é difícil manter coerência quando um país tem relações globais. "Em todas as grandes potências há contradições entre o interesse nacional imediato e os valores", comenta Viola.

Marco Aurélio Garcia rejeita a comparação entre a posição de Lula e a do venezuelano Hugo Chávez, que manifestou solidariedade a Ahmadinejad ante o "ataque do capitalismo mundial" --a linha dura iraniana atribui os protestos, cujos líderes fazem parte da elite do regime, a orquestração externa. "Não há uma aliança estratégica Brasil-Irã, nem isso está em perspectiva", disse Garcia.

  

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