Ações do Carrefour tombam após divulgação de rombo no Brasil 01/12/2010
- Reuters com Folha Online
As ações do Carrefour desabavam 10% nesta quarta-feira, depois que o maior grupo de varejo da Europa cortou estimativa de lucro em 2010 pela segunda vez em seis semanas, aumentando preocupações sobre a credibilidade de suas estimativas e capacidade da administração em controlar riscos internos.
A segunda maior rede de varejo do mundo em vendas afirmou na terça-feira que está esperando um lucro operacional de 3 bilhões de euros (US$ 3,9 bilhões) para o ano em base pro-forma.
O número é 130 milhões de euros (US$ 169,84 milhões) mais baixo que a estimativa anterior.
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O grupo francês atribuiu o ajuste a aumento de encargos no Brasil, onde a empresa está tentando melhorar vendas em hipermercados, e a condições mais duras de negócios na França e sul da Europa.
"Isso de novo piora a confiança do mercado sobre a ação, depois da comunicação ruim desde meados de outubro. O grupo perdeu sua credibilidade em termos de estimativas e em termos de controles internos", disseram analistas do Exane BNP Paribas em nota.
Às 8h26 (horário de Brasília), as ações do Carrefour exibiam perda de 8,35%, a 31,93 euros (US$ 41,71), depois de terem chegado a cair a até 31,32 euros (US$ 40,91) mais cedo. O papel era o de maior perda no índice da Bolsa de Paris.
Em meados de outubro, o Carrefour reduziu sua meta de lucro em 2010, citando encargos no Brasil de 180 milhões de euros (US$ 235,17 milhões). Mas uma auditoria final da situação no país revelou que os encargos seriam de 550 milhões de euros (US$ 718,57).
"Este último alerta de lucro reforça o ceticismo sobre as metas financeiras de longo prazo do Carrefour, especialmente uma vez que em um ambiente cada vez mais competitivo na França torna mais difícil para a empresa reter os benefícios de suas iniciativas de corte de custo", disse o analista Chris Hogbin, do Bernstein.
A administração do Carrefour insistiu na terça-feira que a situação no Brasil não ameaça as estimativas de longo prazo do grupo e que está confiante numa solução rápida dos problemas.
Mas analistas não mostram tanta certeza.
"Os encargos no Brasil criam dúvidas sobre a lucratividade, bem como sobre a administração das operações internacionais do Carrefour", disse Hogbin.
Auditoria de rombo do Carrefour é a mesma do PanAmericano
A auditoria nas contas do Carrefour Brasil detectou um rombo contábil de R$ 1,2 bilhão. O valor é o triplo do que foi reconhecido em outubro pela matriz francesa, de R$ 400 milhões.
Em julho, a revelação de irregularidades nas contas da rede varejista no Brasil provocou a saída do então presidente, Jean Marc Pueyo, e de toda a diretoria.
Também provocou o rompimento do contrato com a auditoria Deloitte, a mesma envolvida no escândalo do banco PanAmericano.
A Deloitte foi responsável por auditar as contas do Carrefour nos cincos anos até 2009. Auditou, portanto, as contas de toda a gestão de Pueyo, que assumiu o cargo em 2006.
O prejuízo total da empresa foi revelado após a conclusão das auditorias interna e externa realizadas pela KPMG, contratada após a demissão de Pueyo.
Em entrevista a analistas ontem na França, o presidente mundial do Carrefour, Lars Olofsson, afirmou que o valor se refere a problemas apurados "nos últimos cinco anos ou mais".
Em nota, o Carrefour diz que as perdas, que serão incorporadas como despesas não recorrentes em 2010, envolvem itens como ajustes de depreciação e provisões ligadas a litígios trabalhistas.
A Folha apurou que a maquiagem no balanço da rede varejista decorre de uma prática considerada comum no varejo brasileiro no passado, mas que não combina com as regras de governança.
Trata-se de descontar, das despesas, bonificações negociadas com a indústria na compra de produtos. Mas nem sempre os descontos se materializam, e o balanço registra como despesa um valor inferior ao gasto.
A mesma prática teria provocado a saída do presidente do Walmart Brasil, Hector Nuñez, também neste ano.
Procurada, a Deloitte nega irregularidades nas contas do Carrefour. "Se o problema fosse relativo a anos passados, eles não seriam contabilizados em 2010, mas seria necessário refazer os balanços anteriores", diz Maurício Resende, sócio da auditoria.
Ele diz que tanto a Deloitte quanto a KPMG auditam contas do Carrefour globalmente e que sua substituição pela KPMG no país faz parte um rodízio determinado pelo cliente.
O Carrefour ressalta que há investigações em curso "que permitirão determinar a existência de possíveis responsabilidades". Essa apuração, de acordo com a companhia, deverá ser concluída até o fim do ano.
Apesar das perdas, Olofsson declarou que o Brasil é prioritário e que os planos de expansão estão mantidos.