Belgas queriam desfazer negócio com a Petrobras já em 2006 05/04/2014
- Ana Clara Costa - Veja.com
A lua de mel entre a Astra Oil e a Petrobras após a assinatura do acordo de acionistas para a compra da refinaria de Pasadena durou poucos meses. O memorando de entendimentos entre as duas empresas foi assinado em março de 2006 e o acordo foi fechado em setembro daquele ano. Contudo, já em dezembro, diretores da Astra trocavam e-mails apontando diferenças estratégicas irremediáveis entre ambas e a necessidade de saída da companhia belga do negócio.
A troca de mensagens consta de documentos obtidos pelo site de VEJA na Justiça do Texas e aponta que a diretoria da empresa belga se articulava um mês antes da reunião de diretores da refinaria (que ocorreria em janeiro de 2007 e contaria com a participação da Petrobras) para pensar numa estratégia de saída do negócio.
Em e-mail enviado ao presidente da Astra, Mike Winget, e ao brasileiro Alberto Feilhaber, ex-funcionário da Petrobras e então diretor da empresa belga, o diretor Tom Nimbley afirmava que “as profundas diferenças culturais e filosóficas entre as duas empresas” dificultavam a criação de uma parceria de longo prazo construtiva.
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“Nós devemos considerar seriamente a execução de uma estratégia de saída que atenda aos interesses da Astra”, escreveu o executivo.
De acordo com as mensagens trocadas entre os executivos, a Petrobras havia assumido a operação da refinaria e, de forma arbitrária, teria redesenhado a estratégia do negócio sem levar em consideração os anseios da empresa belga.
O principal ponto de discordância estava na intenção de ampliar a capacidade da planta — e nos gastos que sua execução implicaria. Com a modernização, a Petrobras vislumbrava que a produção de Pasadena saltaria de 100 mil barris por dia para 200 mil.
A ampliação da capacidade, segundo os diretores, seria “jogar dinheiro fora”. Os executivos apontavam que o refino do petróleo do campo de Marlim, no Golfo do México, seria mais dispendioso do que havia sido previsto -- e que mesmo em posse desta informação, a Petrobras insistia em levar adiante a ampliação da capacidade.
Nimbley afirmou que tal estratégia fazia parte de “uma agenda política da Petrobras” que não era, necessariamente, a melhor escolha para Pasadena.
Ao insistir na ampliação, a Petrobras colocava em risco justamente o retorno anual de 6,9% à Astra nas operações de refino, previsto na cláusula Marlim.
Em resposta, o diretor Terry Hammer afirmou que o aumento dos custos criava “um abismo” entre a forma como a Astra enxergava o negócio e a visão da Petrobras.
“Nós simplesmente não temos os mesmos objetivos. Enquanto nós estamos lutando para ganhar alguns dólares otimizando a refinaria, a Petrobras é uma empresa completamente integrada que está olhando para os números de forma muito diferente”, escreveu Hammer.
Para o executivo, os gastos eram o último item da lista de preocupações da estatal. “Como Alberto (Feilhaber) disse tantas vezes, a Petrobras não tem nenhum problema em gastar dinheiro”.
O executivo relata uma conversa que teve com o então presidente da Petrobras América, Robson Bertoni, em que perguntou se Pasadena era o projeto mais caro da estatal no exterior.
Bertoni afirmou que não e que o plano estratégico para a produção de petróleo no exterior custaria 5 bilhões de dólares apenas na primeira fase.
Em documento enviado ao Comitê de Investimento Estrangeiro dos Estados Unidos (CFIUS, na sigla em inglês), a Petrobras se comprometeu a investir, no mínimo, 2 bilhões de dólares em Pasadena.
Tom Nemley respondeu afirmando que a estatal seria uma fonte constante de perda de recursos e capital humano -- e que negociar a venda da participação da Astra a um valor “aceitável” era a melhor saída, permitindo à empresa belga buscar outras oportunidades “mais alinhadas com seus interesses”.
A briga judicial que colocou fim à sociedade se iniciou apenas em 2009 e durou mais de dois anos, com a Petrobras assumindo um rombo total de 1,18 bilhão de dólares pela compra de 100% da refinaria.
A estatal dos escândalos
Se a imagem da Petrobras já não está boa no mercado devido às fortes perdas que a estatal vem amargando graças ao forte intervencionismo do Estado em sua gestão, episódios recentes parecem arranhar ainda mais a imagem da petroleira.
A estatal é alvo de, pelo menos, cinco investigações que envolvem recebimento de proprina e superfaturamento.
Conheça algumas das denúncias que têm provocado dores de cabeça para o governo e para a presidência da Petrobras:
Refinaria de Pasadena, no Texas
A compra da refinaria de Pasadena, no Texas, é alvo de uma série de investigações e suspeitas. A estatal já desembolsou um total de 1,18 bilhão de dólares com a refinaria.
A compra, realizada em 2006, garantia a posse de 50% do ativo. A outra metade ficou com a trading belga Astra Oil.
A parceria chegou ao fim em junho de 2012, após uma batalha judicial entre Petrobras e a empresa belga. Para pôr fim ao litígio, a estatal brasileira comprou os outros 50% restantes da refinaria.
A empresa teve, contudo, uma triste surpresa ao tentar colocar a refinaria à venda: a única oferta recebida -- da norte-americana Valero -- foi de cerca de 180 milhões de dólares, pouco mais de um décimo do valor pago.
Refinaria de San Lorenzo, na Argentina
A venda da refinaria San Lorenzo -- localizada em Santa Fé, na Argentina -- é alvo de investigações da Polícia Federal. A Petrobras vendeu o ativo em 2010 para o empresário Cristóbal López, que é próximo da presidente Cristina Kirchner e é conhecido como o "czar dos jogos" no país.
A PF está apurando denúncias do pagamento de comissão de 10 milhão de dólares a lobistas, montante do qual 5 milhões iriam para políticos do PMDB, partido responsável por indicar diversos diretores na estatal.
Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco
Além dos problemas com refinarias fora do país, uma brasileira também é alvo de investigações.
Abreu e Lima, localizada em Pernambuco, teve seu custo aumentado em quase dez vezes -- passando os 2,5 bilhões de dólares iniciais para 20 bilhões de dólares de hoje.
A refinaria é investigada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) por suspeita de faturamento. Um dos alvos da investigação é o ex-diretor da refinaria Paulo Roberto da Costa, preso pela Operação Lava Jato.
Investigação sobre contratos com a Odebrecht
Em meados de 2013, a Petrobras anunciou a redução de contratos com a Odebrecht. A decisão aconteceu após auditoria na estatal que contestou contratos da petroleira com o grupo para trabalhos em dez países.
O valor foi reduzido de 840 milhões de dólares para quase a metade -- 480 milhões de dólares. Entre os trabalhos previstos nesse contrato estava a manutenção da refinaria de Pasadena, no Texas.
Investigação sobre pagamento de propina da SBM
No início deste ano, mais um escândalo sober a Petrobras veio à tona. Desta vez, as suspeitas são de que funcionários da estatal receberam proprina da empresa holandesa SBM Offshore, maior fabricante de plataformas marítimas de exploração de petróleo do mundo.
A companhia holandesa deu início a uma investigação interna para apurar denúncias de que seus funcionários pagaram cerca de 30 milhões de dólares no Brasil para consegui contratos bilionários com a estatal brasileira.