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Dilma, ministra, foi advertida sobre suspeita de MPs serem compradas
13/02/2016 - Hugo Marques e Robson Bonin - revista VEJA



Em 2009, quando Lula assinou a medida provisória 471, agora investigada na Operação Zelotes, o servidor Luiz Alberto dos Santos alertou a então titular da Casa Civil para a forma afoita com que o assunto era tratado

O servidor Luiz Alberto dos Santos conhece como poucos os meandros da burocracia dos governos do PT.


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Concursado do Senado e professor da Escola de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas, ele atuou por mais de onze anos, entre janeiro de 2003 e julho de 2014, como subchefe da Casa Civil, o ministério mais importante da República.

Nesse período, assessorou José Dirceu, Dilma Rousseff, Erenice Guerra, Antonio Palocci, Gleisi Hoffmann e Aloizio Mercadante - todos ministros da Casa Civil.

Sua tarefa era eminentemente técnica.

Em novembro de 2009, logo depois de o ex-presidente Lula assinar a medida provisória que concedia incentivos fiscais às montadoras, agora investigada pela Polícia Federal, Santos alertou Dilma sobre a forma afoita com que o assunto estava sendo tratado.

Foi ignorado.

Qual foi a razão do alerta?

- No governo do presidente Lula, e depois também no da presidente Dilma, tornou-se muito comum o ministro levar a medida provisória e despachar diretamente com o presidente. Saía do gabinete já com o sinal verde. No mesmo dia, à noite, chegava a proposta de MP, às vezes pelo e-mail, com a seguinte orientação: "Olha, tem que sair amanhã". Isso é absolutamente equivocado. Enfraquece a própria lógica da análise de mérito da matéria, uma das atribuições da Casa Civil.

O senhor está dizendo que medidas provisórias eram aprovadas sem a devida análise técnica?

- O papel de coordenação governamental da Casa Civil é exatamente o de dizer se uma matéria pode ou não ser submetida à decisão presidencial. Isso não estava acontecendo. Por isso, a nossa preocupação. Ao não se seguir o rito técnico de análise da matéria, o risco de ocorrer uma decisão manipulada e vinculada a interesses é muito maior. O presidente tem legitimidade para tomar a decisão diretamente, sem seguir os ritos, mas ele é responsável por isso.

As medidas provisórias e os decretos que estão sob investigação do Ministério Público tramitaram dessa maneira?

- Sim. O Ministério da Fazenda levava direto para o presidente as suas propostas de MP, e a orientação era "para sair amanhã". Chegava a ser constrangedor. O sistema existe para prevenir problemas. A instância final de análise técnica e jurídica é a Casa Civil.

O Ministério Público suspeita que essas medidas que beneficiaram o setor automobilístico foram compradas.

- Tenho visto tudo isso com preocupação. É óbvio que ninguém assinou um contrato firmando o compromisso de entregar uma MP a A, B ou C, mas não é totalmente absurdo que isso possa ter acontecido. Nesse caso específico, do setor automotivo, se alguém pagou, foi enganado, comprou um terreno na Lua. Era quase impossível que aquele benefício não fosse prorrogado.

Essa MP sob suspeição foi "analisada" e aprovada pela Casa Civil em menos de 24 horas?

- Exatamente. Isso aconteceu em muitos casos.

​O senhor informou a então ministra Dilma Rousseff?

- A Casa Civil passou por um processo de enfraquecimento muito forte em relação à área econômica. Na nossa área, nós sempre questionávamos isso. Decisões tomadas, anunciadas, questionávamos internamente. O papel do burocrata é trabalhar para dentro do governo. Nesses casos se fazia um alerta: "Olha, essa medida provisória não deu para analisar, estamos preocupados".

E qual foi o resultado?

- Não adiantava reclamar porque os ministros da Casa Civil não tinham força nem queriam comprar esse tipo de briga. Quando alertei, disseram apenas que o assunto já estava resolvido, que já havia sido discutido com o presidente e que a decisão já estava tomada. Isso dificulta o trabalho das áreas técnicas. Se a decisão já estava tomada pelo presidente, não havia o que fazer.

Quando o senhor alertava a então ministra Dilma, havia algum tipo de explicação?

- Normalmente tínhamos reuniões nas quais esses assuntos podiam ser falados: "Olha, tal situação está acontecendo". Sempre se dizia que "é matéria que já foi decidida, já foi levada ao presidente pelo próprio ministro". O nosso pessoal na área técnica cansou de alertar, mas sempre ouvia: "Isso está resolvido, vai ter de sair no Diário Oficial".

A medida provisória dos carros, que não passou pelo crivo técnico da Casa Civil, envolvia uma renúncia fiscal de mais de 1 bilhão de reais.

- Todas essas matérias envolviam renúncias tributárias enormes, muitas vezes mal estimadas. Nós cansamos de alertar: "Olha, isso aí não está de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal".

Alertavam o pessoal do Ministério da Fazenda?

- Sim, mas eles sempre diziam que aquilo já estava decidido. Davam uma envernizada na exposição de motivos para tentar justificar, faziam umas contas lá que ninguém sabia se estavam certas e levavam direto ao presidente. Às vezes, a gente ficava sabendo dos detalhes pela imprensa.

Dilma não se insurgia contra essa situação?

- Ela era a ministra da Casa Civil que colocou como prioridade zero o PAC, o Minha Casa Minha Vida, o marco regulatório do pré-sal e algumas outras coisas. Mas no varejão, e particularmente nessas matérias econômicas e tributárias, ela não se envolvia muito.


  

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