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Mercado virtual da beleza tem sorteio, mutirão de implantes e briga por cliente
22/07/2018
- O Estado de S.Paulo
No mercado virtual da beleza, anúncios de perfis com milhares de seguidores prometem bumbum, rostos e seios perfeitos.
As estratégias vão de promoções a sorteios e há até “mutirões†para fazer os procedimentos estéticos.
Os grupos também servem de arenas de batalha: de um lado, médicos, a maioria não especialistas, e de outro as chamadas “bombadeirasâ€, sem diploma na área.
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Na última semana, esse universo veio à tona após a prisão do médico Denis Furtado, o Doutor Bumbum, acusado pela morte da bancária LÃlian Calixto.
O preenchimento do bumbum, técnica aplicada por Furtado em LÃlian, é o carro-chefe de quem faz a bioplastia.
E o polimetilmetacrilato (PMMA) é a substância mais anunciada nas redes sociais, embora não seja recomendada por entidades médicas.
“Não tenho vergonha de falar que faço bioplastiaâ€, diz Eduardo Costa, pediatra, sem especialização em cirurgia, que realiza o procedimento com PMMA em quatro capitais.
Nas redes, ele e outros profissionais interagem com pacientes e tiram dúvidas em textos e vÃdeos ao vivo.
“Tudo é feito em poucas horas, sem internação e somente com anestesia localâ€, escreveu outro médico em sua página no Facebook, com 41 mil inscritos.
Em grupos privados, não é raro ver imagens de bumbuns definidos e comparações do tipo “antes e depois†– o que é vedado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM).
O agendamento dos procedimentos também é simples.
Em comum, quem faz as bioplastias oferece canais de atendimento via WhatsApp.
Basta mandar uma mensagem para receber instruções.
Para acelerar, é possÃvel fazer o que chamam de “pré-atendimento†online, com envio de fotos de costas e de lado.
Depois, é feita uma consulta presencial e o procedimento pode ser realizado no mesmo dia ou no dia seguinte.
PROMOÇÃO
Mulheres que supostamente já fizeram a bioplastia se tornam promoters do procedimento e enviam à s outras a lista de médicos parceiros do grupo, onde é possÃvel obter desconto.
Em fórum no WhatsApp com mais de 200 membros, são anunciados quatro profissionais – um no Rio, dois em São Paulo e outro em Porto Alegre.
Segundo o anúncio, seriam cobrados R$ 10 mil para aplicar 200 mililitros de PMMA em cada nádega.
Outro tópico indica uma mulher, identificada só pelo primeiro nome, que faz a aplicação do “bumbum padrão†– de 800 ml, a R$ 14,4 mil.
Também há sorteios de bioplastia entre autoras dos primeiros comentários em grupos fechados no Facebook e a organização de mutirões.
“Eu e duas amigas nos juntamos e pagamos as passagens aéreas e hospedagem dela (autora da página). Ela fez nossa bioplastia com todo confortoâ€, disse uma jovem em um desses grupos.
Um dos temas nesses fóruns são os riscos e vantagens de se fazer esse tipo de procedimento com médicos ou outros profissionais, como enfermeiros, biomédicos e esteticistas.
“Todo mundo está injetando tudo em todo mundo. As pessoas começaram a se aventurar e tem o ‘braço’ (vertente) das ‘bombadeiras’, diz Costa, em referência a mulheres que não têm formação médica.
Ele defende a exclusividade dos médicos e diz “seguir o bom senso†ao definir a quantidade de PMMA.
Presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, NÃveo Steffen diz que o procedimento não é recomendado.
“A bioplastia dentro da cirurgia plástica é muito pontual. Não há recomendação disso com finalidade estética.â€
Ele explica que, embora não exija cortes, o procedimento deveria pressupor cuidados semelhantes aos de cirurgias, como antissepsia do local de aplicação, o que nem sempre ocorre.
Outro problema é o tiro no escuro.
“O paciente não sabe o que está sendo injetado. Em vez de colocar PMMA, pode colocar substâncias piores.â€
A professora Mônica Fernandes, de 34 anos, é uma das que acompanham as técnicas em grupos virtuais.
Em 2017, foi a uma clÃnica de estética no Rio para injetar PMMA no bumbum, mas acabou convencida a, antes, “melhorar†o formato do rosto.
Concordou com a injeção do que imaginava ser ácido hilaurônico – substância permitida –, mas se surpreendeu após três meses.
“Desceu, começou a ir para a bochecha, como se estivesse caindo pelo rosto.â€
Ela não sabe a formação de quem fez a aplicação.
“Veio com a seringa pronta e jogou no meu rostoâ€, diz.
“Quis fazer porque estava mais em conta.â€
Corregedor do CFM, José Fernandes Vinagre explica que a promessa de resultados, comuns nos anúncios, é vedada.
“Há o ‘Vai entrar cheia de celulite e sair sem nenhuma’. Esse tipo de coisa não pode ser prometida.â€
Sobre o PMMA, o CFM indica que a substância só pode ser injetada em pequenas doses – sem especificar quantidades –, por médicos, e não há estudos sobre a ação a longo prazo do produto.
O Conselho Federal de Enfermagem não prevê a prática entre seus profissionais.
Já a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou que o PMMA é classificado como de “máximo risco†e o procedimento deve ser feito por um profissional habilitado.
"CURTIDAS" E SUPOSTA PRATICIDADE SEDUZEM PACIENTES
A suposta facilidade das técnicas anunciadas nas redes sociais e o número de seguidores – só o Dr. Bumbum, preso na semana passada, tinha 660 mil – atraem interessados em procedimentos estéticos.
“Resolvi procurá-lo por causa da facilidade de recuperação, eu não precisaria ficar afastada das minhas atividadesâ€, contou ao Estadão uma ex-paciente do Dr. Bumbum.
Ela teve hidrogel injetado nos seios – técnica proibida – e pagou R$ 7 mil pelo procedimento, há quatro anos.
Agora luta para se livrar das deformidades e cicatrizes no corpo.
Na internet, profissionais oferecem serviços que não estão credenciados a fazer e inventam especialidades.
“Isso é simples de checarâ€, diz o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, Alexandre Hohl.
“Basta entrar na página do Conselho (Regional de Medicina) e digitar o nome do médico para saber se ele tem especialização.â€
Segundo o Conselho Federal de Medicina (CFM), médicos não podem alardear supostos resultados, nem anunciar especialidades médicas que não existem.
Algumas delas são “terapia antienvelhecimentoâ€, “fisiologia hormonalâ€, “hipertrofia muscular†e “chip da belezaâ€.
Há 57 especialidades médicas regulamentadas, diz o CFM. E medicina estética – uma das mais citadas nas redes – não é uma delas.
“E mesmo um especialista, um cirurgião plástico ou dermatologista não pode postar foto de pacientes em nenhuma hipótese, a Constituição não permite, até mesmo se houver autorização (da paciente)â€, diz José Fernandes Vinagre, corregedor do CFM.
“Ainda confiamos naqueles com mais seguidoresâ€, afirma a especialista em comunicação e redes sociais Ana Erthal, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).
“Cada foto do Dr. Bumbum tem 10 mil, 20 mil curtidas. Enche os olhos das pessoas.â€
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