Mídia é alvo de Bolsonaro no Twitter a cada 3 dias 12/03/2019
- O ESTADO DE S.PAULO
Em pouco mais de dois meses de governo, o presidente Jair Bolsonaro usou sua conta no Twitter para publicar ou compartilhar mensagens nas quais critica, questiona ou ironiza o trabalho da imprensa brasileira.
Foram 29 publicações desde a posse até ontem, segunda-feira, uma média de uma vez a cada quase três dias na rede social que o presidente tem utilizado como principal meio de comunicação com a população.
Quase metade das críticas e acusações contra a imprensa que aparecem na conta de Bolsonaro é feita por meio de retuíte de aliados e familiares, como dos filhos Carlos e Eduardo e as páginas que costumam reunir simpatizantes do presidente.
PUBLICIDADE
Foi o caso do site Terça Livre, que no domingo, 10 publicou texto que falsamente atribui à repórter do jornal O Estado de S. Paulo Constança Rezende a declaração “a intenção é arruinar Flávio Bolsonaro e o governo”, ao tratar da cobertura jornalística das movimentações suspeitas de Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador e filho mais velho do presidente.
Na noite de domingo, o próprio Bolsonaro escreveu no Twitter: “Constança Rezende, do ‘O Estado de SP’ diz querer arruinar a vida de Flávio Bolsonaro e buscar o Impeachment do Presidente Jair Bolsonaro. Ela é filha de Chico Otavio, profissional do ‘O Globo’. Querem derrubar o Governo, com chantagens, desinformações e vazamentos”.
A gravação do diálogo, porém, mostra que Constança em nenhum momento fala em “intenção” de arruinar o governo ou o presidente.
A conversa, em inglês, tem frases truncadas e com pausas.
Só trechos selecionados foram divulgados.
O texto publicado no Terça Livre tem como origem uma postagem no site francês Mediapart, que ontem disse que as informações que serviram de base para o tuíte de Jair Bolsonaro “são falsas”.
O texto original é assinado por Jawad Rhalib, que se apresenta como “autor, cineasta, documentarista e jornalista profissional”.
A publicação no site brasileiro é assinada por Fernanda Salles Andrade, que ocupa cargo no gabinete do deputado estadual Bruno Engler (PSL), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
ENTIDADES
O caso envolvendo a repórter do Estado ganhou repercussão internacional e enfática reação de entidades que representam empresas de comunicação, jornalistas profissionais e a liberdade de expressão.
A Associação Nacional de Jornais (ANJ), a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e a Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner) emitiram nota conjunta em que lamentam o ataque do presidente ao Estado e à repórter Constança Rezende.
As entidades afirmaram que os ataques à repórter têm o objetivo de desqualificar o trabalho jornalístico.
“Abert, Aner e ANJ assinalam que a tentativa de produzir na imprensa a imagem de inimiga ignora o papel do jornalismo independente de acompanhar e fiscalizar os atos das autoridades públicas”, diz nota.
Para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), o episódio mostra por parte do presidente o “descompromisso com a veracidade dos fatos” e se caracteriza como “o uso de sua posição de poder para tentar intimidar veículos de mídia e jornalistas”.
Presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Maria José Braga afirmou que o ataque é um atentado à liberdade de imprensa.
“O presidente e seus seguidores tentam intimidar os profissionais jornalistas por meio de agressões verbais e ameaças”, declarou.
Procurados ontem, integrantes do governo Bolsonaro não quiseram comentar o caso.
Ao eleger a imprensa e veículos de comunicação como alvo, o presidente costuma fazer comentários em tom irônico e acusações de fake news.
Em quatro postagens, consideradas em levantamento anterior do Estadão, Bolsonaro também divulgou entrevistas que concedeu à TV Record e a um canal italiano, e um discurso seu em que fala sobre liberdade de imprensa.