|
RELEITURA
Senhores candidatos
22/10/2006
- Gaudêncio Torquato*
Srs. candidatos Luiz Inácio e Geraldo Alckmin, por favor, tenham consciência do simbolismo do pleito do dia 29. O eleitorado irá às urnas profundamente dividido e com a convicção de que o voto, principal arma da democracia, mesmo legitimando uma de V. Exas. como mandatário da Nação, não deverá ser endosso para a continuidade do descalabro que corrompe o tecido político e desmoraliza as instituições. O Brasil chegou ao fundo do poço em matéria de mercantilismo político, praticado todos os dias no balcão de recompensas que paga indivíduos sem compromissos com o ideal coletivo. Essa é a raiz da crise que esfrangalha a República. A indignidade na política multiplica os trânsfugas morais que constroem feudos e capitanias dentro de um Estado intensamente partidarizado. A conseqüência se faz ver na mediocridade de cortes servis, nos bolsões de lenocínio que arrebentam os cofres públicos e nas artimanhas que juntam, no mesmo covil, dirigentes, burocratas corruptos e empresários espertalhões.
Quem de V. Exas. chegar à Presidência e não tiver clara noção de que o País precisa voltar a conviver com o respeito e a confiança nas instituições e a solidariedade entre classes será arrastado pelo turbilhão da crise intermitente, a que se deve dar um basta sob pena de aumentarmos o fosso entre sociedade e sistema político. Conscientizem-se de que a confiança nos Poderes constituídos se assenta, primeiro, no respeito dos mandatários às funções para as quais foram investidos, o que exige resgatar o conceito de política como missão, não como profissão. Dignificar o mandato é priorizar o ideal coletivo. Não fazer da coisa pública um negócio particular. É bom lembrar, o patriotismo é a vitamina das nações. Urge, portanto, resgatar a comunhão das esperanças perdidas, conclamar classes e grupos a acreditar que teremos, sim, um amanhã melhor que o hoje. Não há maneira mais torpe de servir à Pátria do que pregar a desunião de seus filhos. Atentem, essa tem sido uma nota lúgubre destes tempos virulentos.
Sr. candidato Luiz Inácio, a recorrência de que a elite paulista odeia o resto do País e de que a oposição só olha para o Sul e o Sudeste não contribui em nada para a construção de uma Pátria forte, indivisível, e de uma coletividade nacional que anseia por harmonia e solidariedade. O caráter nacional repele conflitos que envolvam gentes. Prefere impregnar-se da seiva da confraternização. Que V. Exa. evite colocar tempero exagerado no menu de preconceitos. Disseminar ódio entre classes, espalhar que regiões discriminam outras e usar o boato como forma de cooptação eleitoral são pérfidas maquinações de um vale-tudo que se esperava eliminado da política. Até se pensava que V. Exa. havia guardado velhos preconceitos no baú de onde o sindicalismo do ABC, na década de 70, retirou as primeiras idéias. A desgastada luta de classes morreu e está sepultada no cemitério do socialismo revolucionário. Não há motivo para ressuscitá-la, até porque V. Exa., mais perto da vitória que o adversário, deverá ter como desafio-mor integrar as metades de um Brasil fragmentado: de um lado, a banda que mais paga, de outro, a banda que mais recebe. Divisão que aponta para uma ação governamental que, se desafogou a base da pirâmide, dando-lhe maior poder de compra, apertou as classes do meio e exagerou nas concessões ao topo, onde está a elite econômica, que tanto critica.
Sr. candidato Geraldo Alckmin, assuma sua verdadeira identidade. Defenda a idéia de um Estado menor, sem tropas partidárias de ocupação, sem gorduras, sem espetacularização, eficaz e produtivo. Não tenha medo de dizer que a privatização das telecomunicações fez o País abrir os caminhos da modernização, sendo hoje exemplo da comunicação rápida, acessível e abrangente, bastando anotar o número de celulares, quase 96 milhões. Mostre que a privatização da Vale do Rio Doce aumentou a capacidade de produção de 82 milhões de toneladas de minério de ferro para um volume estimado em 270 milhões de toneladas, fazendo, ainda, a empresa atuar em 21 países, quando, como estatal, estava apenas em cinco. Não tenha medo de defender abertamente sua identidade religiosa e freqüentar atos litúrgicos que certos políticos costumam exibir apenas em tempos eleitorais. Expresse maior conhecimento da realidade nacional, fazendo uma exposição densa de propostas para a Previdência, saúde, segurança pública, emprego e renda, crescimento do PIB, indo além da intenção consubstanciada nas expressões “vamos melhorar, vamos expandir, vamos investir pesado”.
Srs. candidatos, é claro que a meta de domínio da inflação e da economia estável deve ser preservada. Mas o País precisa expandir o crescimento, aumentar a oferta de empregos e exigir contrapartidas viáveis para os programas assistencialistas, sob pena de continuarmos a ver o Bolsa-Família como instrumento de manutenção da miséria, em vez de mecanismo de promoção social. Decidam dar um basta na escalada de impostos, fazendo mais gente pagar, mas pagar menos. Enxuguem a estrutura do Estado. Presidente Lula, tire ervas daninhas, quadros incompetentes. Forme uma grande equipe de técnicos. Candidato Geraldo, se lá chegar, diminua os 35 ministérios para 15, como promete. Transformem a educação em prioridade máxima, começando com o reforço no ensino fundamental. Essa é a viga mestra do futuro. Dividam com os Estados a responsabilidade sobre a segurança, com estruturas aparelhadas, quadros motivados, sistemas de prevenção. Antes de construir novas unidades hospitalares, façam check-up total nas existentes, melhorando o atendimento.
Não tenham medo da verdade. Mandem apurar as denúncias. Falem menos e ajam mais. Cumpram a lei. Peçam punição para os culpados. Reconheçam os erros. Dignifiquem o cargo. Não joguem brasileiros contra brasileiros. Sejam humildes. Governem sem ódios, prevenções ou reservas. “Para o bem do povo e felicidade geral da Nação.”
...
*Gaudêncio Torquato, jornalista, é professor titular da USP e consultor político. E-mail: gautor@gtmarketing.com.br
Compartilhe:
|
|