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RELEITURA
Fidelidade partidária
17/10/2006
- Milton Córdova Júnior*
O gesto anti-partidário, patrocinado pelo Governador Blairo Maggi (ex-PPS), do Mato Grosso, de apoio ao candidato Lula, do PT, no segundo turno, contrariando orientação de seu Partido, o PPS, afronta literalmente o principio constitucional da Fidelidade Partidária.
Como conseqüência, desfiliou-se do PPS, nessa terça-feira, 17/10/2006, antes de sua diplomação. Ou seja: usa e abusa da estrutura do Partido, à sua conveniência e, depois de eleito, solicita sua desfiliação – para não passar pelo constrangimento de ser expulso por infidelidade partidária – do PPS, partido que lhe abrigou.
Há muito que se vem exigindo uma tomada de atitude firme e decidida em direção da fidelidade partidária, do fortalecimento dos partidos políticos e, consequentemente, da própria Democracia. Nem vou perder tempo enumerando tudo o que já se disse a respeito, pois é de conhecimento geral.
O caso em evidência é um absurdo, um verdadeiro estelionato eleitoral contra o PPS e contra o eleitorado que o elegeu. Diga-se de passagem que isso não aconteceu no primeiro turno, quando ele se manteve neutro em relação à disputa presidencial entre Lula e Alckmin, até 11 de outubro, momento em que declarou apoio a Lula.
Importante lembrar que a questão da fidelidade partidária está atrelada à questão da vinculação partidária-eleitoral. Não foi por outro motivo que o TSE ¨verticalizou¨ as eleições, em 2002, mantendo-a até o momento. Note-se que o Tribunal Eleitoral foi inflexível e implacável, nesse ponto.
Os princípios de um (verticalização) e de outro (fidelidade partidária) são os mesmos, não há como dissociar. Todos convergem para a autonomia, fortalecimento dos partidos políticos, e com mais razão, da fidelidade partidária.
O presidente do TSE, Ministro Marco Aurélio afirmou, em seu comentado discurso de posse (disponível no site do Tribunal), que a sociedade e todos no Brasil vivem, de modo geral, ¨num mundo faz-de-conta¨. Todos fazem-de-conta que respeitam as leis, mas ninguém respeita lei alguma.
Penso que chegou a hora de se tomar uma decisão firme, a respeito, e acabar de uma vez por todas com esse “faz-de-conta”.
Explico.
Com a desfiliação de Blairo Maggi, ele não poderá ser diplomado e, por conseqüência, não poderá tomar posse em 2007. Está “indiplomável” e “impossável”, pois está sem partido. Sem a necessária filiação partidária – que é exigência constitucional de elegibilidade – é impossível ele ser diplomado e, por conseqüência, tomar posse para o cargo que se reelegeu.
Ainda que ele ingresse imediatamente em outro partido, ele terá menos de um ano de filiação partidária, que, repito, é atributo constitucional indispensável para a sua elegibilidade, nos termos do art. 14, § 3º, V, da Constituição.
A elegibilidade é causa para o efeito ser votado, que por sua vez gera o efeito ser diplomado, que gera o efeito tomar posse. Portanto, é a lei da causa e efeito; uma coisa vincula a outra coisa. O objetivo da elegibilidade é tomar posse no cargo para o qual o candidato foi eleito. Portanto, é evidente que, da interpretação sistemática e integradora da Constituição, a filiação partidária é requisito para a diplomação. E também, para a posse.
Por ocasião das eleições (primeira etapa), o governador Maggi estava de fato filiado. Mas antes da diplomação (segunda etapa) e da posse (terceira etapa), não está filiado a Partido algum. Ainda que ele venha a ingressar em outro Partido Político, terá menos de um ano de filiação partidária no momento da diplomação ou da posse.
Evidentemente, como ele superou a primeira etapa do processo eleitoral – ser eleito – é possível que existam controvérsias a favor ou contra a hipótese. Todavia, um fato é evidente: ele foi eleito (superou a primeira etapa) mas ainda não foi diplomado, e muito menos tomou posse (não superou a segunda e terceira etapas)
Trata-se de situação diversa dos casos tão comuns, dos denominados ¨troca-troca¨ partidários que acontecem no curso do mandado, chegando alguns a permanecerem sem partido durante muito tempo (o que é, ao meu ver, um absurdo, pois viola a natureza da Constituição, eis que no nosso ordenamento político-eleitoral não existe a possibilidade de um ¨legislativo sem partidarismo¨, tese defendida por uma corrente minoritária).
Assim, penso que o governador Maggi não terá direito a ser diplomado nem tomar posse. Está ¨indiplomável¨ ou ¨impossável¨. O PPS pode e deve – assim como qualquer outra pessoa legitimada para tal – ingressar com a competente e pioneira ação no TSE, para impedir a diplomação e/ou a posse do eleito, por descumprir integralmente os requisitos constitucionais. Será um grande e expressivo precedente, o qual poderá desencadear, de uma vez por todas, a “Reforma Política”.
E assim, fortalecer os partidos políticos brasileiros e, consequentemente, fortalecer a Democracia. Acabando com o mundo do “faz-de-conta”.
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*Milton Córdova Júnior é advogado em Brasília/DF. Texto originalmente publicado no site Migalhas
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