Um agosto sem fim 15/10/2015
- Carlos Brickmann - Observatório da Imprensa
“O mês de agosto chegou”, não disse Júlio César ao vidente que havia previsto uma tragédia para a data.
E o vidente não respondeu: “Mas ainda não passou”.
É o agosto mais longo de todos os tempos. Ultrapassou setembro, chegou a outubro, ameaça chegar às festas e férias de fim de ano, quando a crise será interrompida porque ninguém é de ferro.
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A questão do impeachment se transformou num jogo de xadrez -- que nos perdoem por usar essa palavra perto desses personagens.
Todos calculam várias jogadas à frente, embora saibam que, no final, a questão será resolvida pela força bruta.
Quem tiver votos ganha a partida.
Só que esses votos não estão cristalizados.
O governo, se agir com habilidade e distribuir cargos suficientes, ganha parlamentares para seu lado; novas revelações -- como a delação premiada sobre pixulecos para um dos filhos de Lula -- levam votos para o impeachment.
Manifestações contra o governo, Dilma recua várias casas; quem mostrar força no Congresso atrairá os parlamentares que gostam de ficar ao lado do vencedor, e catar pelo menos alguma sobra.
No caso Collor, um deputado de sua tropa de choque viajou de São Paulo para Brasília para votar contra ele, no momento em que viu que o impeachment seria vitorioso.
Esqueça moralidade, ética, não pergunte por que gente confiável se junta a bandidos notórios.
É jogo decisivo.
Delações premiadas serão tratadas conforme as vítimas: instrumento moralizador quanto atingem adversários, dedoduragem vil quando atingem aliados.
Se Dilma fica ou cai, não importa: agosto continua.
Pega que o emprego é teu
Há várias lutas simultâneas: a da oposição para provar que a família de Lula foi beneficiada por algum tipo de pixuleco -- o que o levaria ao centro da guerra do impeachment; a do governo para que as acusações contra Eduardo Cunha se formalizem logo e o inabilitem politicamente para conduzir o processo (tanto o governo quanto a oposição aceitam numa boa que Cunha é mais eficiente que os demais parlamentares, e que sem ele o impeachment fica difícil).
Há as batalhas judiciais (até o momento, o governo está ganhando) para discutir os ritos do impeachment.
Há as tentativas de acordo, me deixa em paz que te deixo em paz, para que Eduardo Cunha vá devagar com o impeachment e, em troca, o governo não dramatize as inexplicadas contas na Suíça.
E há aquela briga em que muitos ganham e todos nós pagamos: a farta distribuição de cargos oficiais.
Feita a lambança do Ministério -- que, além de imoral, foi ineficiente -- abriu-se a porteira para nomeações a rodo nos escalões inferiores.
Vale tudo para que o governo federal consiga número suficiente de parlamentares para barrar o impeachment.
Baiano perigoso
Fernando Falcão Soares, Fernando Baiano, teve sua delação premiada aceita pelo Supremo Tribunal Federal.
O conteúdo ainda não é conhecido, mas o couvert é quente e vai alimentar por muito tempo as investigações:
1 - disse que deu a Antônio Palocci, um dos coordenadores da campanha de Dilma, R$ 2 milhões, desviados da Petrobras. Confirmada a informação, cabe pedir a anulação da chapa Dilma-Temer e o afastamento de ambos do governo.
2 - disse (antes que o governo suíço mandasse as informações) que tinha pago despesas de Eduardo Cunha, que viria a ser o presidente da Câmara;
3 - disse que pagou despesas pessoais de Fábio Luís Lula da Silva, filho mais velho do ex-presidente Lula, no valor aproximado de R$ 2 milhões.
Todos negaram as informações.
Onde a roda pega
Fernando Pimentel, governador de Minas, só pode ser investigado ou julgado pelo Supremo.
Eduardo Cunha, presidente da Câmara, também tem foro privilegiado.
Mas Carolina de Oliveira, esposa de Pimentel, e Cláudia Cruz, esposa de Cunha, que vêm sofrendo acusações, se forem chamadas a Curitiba terão de ir.
Nhô ruim…
Feliz com o eventual afastamento de Eduardo Cunha da presidência da Câmara?
Modere seus sentimentos: o vice-presidente da Câmara e substituto de Cunha é o deputado federal Waldir Maranhão, do PP maranhense.
Ninguém precisará pesquisar sua vida: já chegaria envolvido em dois inquéritos no Supremo, por suspeita de lavagem de dinheiro.
Foi também citado pelo doleiro Alberto Yousseff, meio depreciativamente: como um dos deputados do PP de menor importância.
Por isso, seu pixuleco não era dos grandes, ficando na faixa de R$ 30 mil a R$ 150 mil por mês.
Mas não era ligado só a Yousseff: relacionava-se também com o doleiro Fayed Trabulsi, atingido pela Operação Miquéias.
Não é dos maiores, mas é acusado de fraudes de uns R$ 300 milhões com fundos de pensão.
…nhô pior
Caso Eduardo Cunha deixe a presidência da Câmara, Waldir Maranhão terá 30 dias para marcar a eleição que escolherá o substituto.
O grupo do PMDB que ficou com Dilma gostaria de eleger Leonardo Picciani -- que era ligadíssimo a Eduardo Cunha mas preferiu negociar com o Planalto a reforma ministerial que não deu certo.
Os oposicionistas preferem buscar um nome inatacável (e que sempre foi adversário de Eduardo Cunha): o pernambucano Jarbas Vasconcelos.