Troque viado por negro ou mulher 10/11/2015
- Alexandre Vidal Porto*
Quando eu penso em totalitarismo, o que me vem à mente é a supressão da diversidade; é não permitir que minorias sociais, religiosas ou políticas se expressem livremente.
Nas democracias modernas, essa mentalidade totalitária de supressão de minorias é cada vez mais rara entre os jovens, mas ainda eclode em ambientes conservadores mundo afora. Trata-se de uma ideologia arcaica, que não faz sentido econômico ou social no contexto da globalização.
O presidente norte-americano Thomas Jefferson dizia que o preço da liberdade é a eterna vigilância. Eu diria que, para as minorias, o preço da liberdade é a eterna necessidade de representação.
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Quem não é visto ou ouvido não é respeitado. Por isso, a visibilidade e a expressão política das minorias são importantes.
A questão é mundial.
Tomemos o caso das mulheres: ganham menos no Japão, sofrem violência doméstica nos Estados Unidos, são escravizadas na Nigéria e assediadas no Brasil. Não é por acaso que movimentos feministas pululam em todo o mundo. Ninguém protesta por esporte.
No caso das minorias sexuais, o problema é semelhante.
Faz uns meses, um ex-embaixador do Brasil no Paraguai, agora aposentado no Rio de Janeiro, comentou a respeito de eu ser abertamente homossexual: "No meu tempo, os viados do Itamaraty conheciam o seu lugar".
Troque-se a palavra "viado" pelas palavras "negro" ou "mulher" –ou pela minoria de sua predileção. Dará no mesmo.
Para esse embaixador, homossexuais (e mulheres, macumbeiros, negros, judeus?) são seres inferiores, indignos de se expressarem plena e publicamente. Pobre embaixador...
Estadistas e líderes mundiais modernos já se deram conta de que a diversidade em empresas, governos e ambientes sociais é um capital a ser explorado e deve ser estimulado.
Todo mundo ganha. Não é à toa que a recém-divulgada Lista da Diversidade Global, da revista "The Economist", é financiada por empresas e bancos internacionais como KPMG, AT Kearney, União de Bancos Suíços e BNP Paribas.
O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) foi incluído nessa lista.
No mês passado, ele já havia sido escolhido o melhor deputado de 2015 pelo Congreso em Foco. Com ele, na lista da "The Economist", estão Bill Gates, da Microsoft, Sheryl Sandberg, do Facebook, Malala Youssufzai, Prêmio Nobel, Barak Obama, idem, entre outros.
Parece companhia mais distinta do que a com que conta o deputado no Congresso Nacional.
É bom para o Brasil que o valor do deputado Jean Wyllys ganhe reconhecimento e apoio internacionais. Concorde-se ou não com ele, não há como negar a importância de sua atuação.
Em um recente perfil de Wyllys na revista "Piauí", FHC chama-o de "fenômeno político". Eu concordo com FHC.
A pauta política que Jean Wyllys defende no Brasil, especialmente em relação às minorias, é o fenômeno político que os nossos tempos pedem.
Ele fala por brasileiros que só agora começam a ter idade para voltar. Não é por acaso que, de uma eleição para outra, ele mais que decuplicou seu número de votos.
Como minoria sexual, mas sobretudo como brasileiro que quer e precisa de um país diverso, a presença de Jean Wyllys na Câmara dos Deputados me deixa mais tranquilo.
É bom saber que há quem me defenda quando alguém -- embaixador, deputado ou senador --, disser que eu, viado, tenho de conhecer o meu lugar.
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*Escritor e diplomata, mestre em direito (Harvard). Serviu na missão na ONU e no Chile, EUA, México e Japão. É autor de "Sergio Y. vai à América" (Cia das Letras).