FHC só teria inveja de Lula se sonhasse desde menino com a falência do Brasil 12/11/2015
- Blog de Augusto Nunes - Veja.com
O ex-presidente Lula confirmou ontem que jamais se livrará da assombração que lhe confisca o sono desde o século passado.
“Fernando Henrique Cardoso tem inveja do meu sucesso”, repetiu o palanque ambulante castigado por rachaduras que anunciam o desabamento inevitável.
O embusteiro em seu ocaso não consegue esquecer o homem que o surrou nas urnas.
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Duas vezes, ambas no primeiro turno.
“É só comparar meu governo com o dele para saber por que o FHC não se conforma com um operário que deu certo na Presidência”, delirou o parteiro da conjunção de crises que ameaça o país com a falência política, econômica e moral.
“Vejam o que eles fizeram e o que nós fizemos”.
Se a oposição fosse menos inepta e mais altiva, teria aceitado há muito tempo o confronto proposto pelo recordista mundial de bravata & bazófia.
A mirada no retrovisor refletiria as incontáveis abjeções que escurecem a trajetória do PT, conduzido desde sempre pelo sinuelo desprovido do sentimento da vergonha.
Em novembro de 1984, por não enxergar diferenças entre Paulo Maluf e Tancredo Neves, o partido optou pela abstenção no Colégio Eleitoral que escolheria o primeiro presidente civil depois do ciclo dos generais.
Em janeiro de 1985, os deputados federais Airton Soares, José Eudes e Bete Mendes votaram em Tancredo.
Foram expulsos do PT por ordem do comandante.
Em 1988, a bancada do PT na Constituinte recusou-se a assinar o texto da nova Constituição.
No mesmo ano, num discurso em Aracaju, o deputado federal Luiz Inácio Lula da Silva informou que o presidente José Sarney era “o grande ladrão da Nova República”.
Lula e Sarney não demoraram a descobrir que haviam nascido um para o outro.
Hoje são amigos de infância.
Na campanha presidencial de 1989, o candidato do PT acusou Fernando Collor de “filhote da ditadura”.
Depois do impeachment, “corrupto” foi a palavra mais branda que usou para qualificar o inimigo.
Collor revidou com dois adjetivos no fígado (“ignorante” e “cambalacheiro”) e uma frase no queixo:
“Lula é incapaz de distinguir uma fatura de uma duplicata”.
As duas almas gêmeas saberiam que também dividiam a paixão pela fortuna súbita que precede a vida perigosamente mansa.
No momento, o senador do PTB de Alagoas e o chefão do partido que virou bando são colegas de Petrolão.
Fora o resto, estiveram juntos no esquema que esvaziou os cofres da estatal.
Poderão juntar-se de novo na traseira do mesmo camburão.
Em 1993, a ex-prefeita Luiza Erundina, uma das fundadoras do partido, aceitou o convite do presidente Itamar Franco para participar do ministério.
Foi empurrada para fora do PT.
Em 1994, ainda no governo Itamar Franco, os parlamentares petistas lutaram com ferocidade para impedir a aprovação do Plano Real.
No mesmo ano, transformaram a revogação da mudança que erradicara a praga da inflação na bandeira principal da campanha presidencial.
Entre o começo de janeiro de 1995 e o fim de dezembro de 2002, a bancada do PT votou contra todos os projetos, medidas, sugestões ou ideias encaminhados ao Legislativo pelo governo Fernando Henrique Cardoso.
Todos, sem exceção.
Uma das propostas mais intensamente combatidas foi a que instituiu a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Desde a ressurreição da democracia, a ação do PT oposicionista foi permanentemente subordinada a sentimentos menores, interesses mesquinhos, objetivos sórdidos e sonhos liberticidas.
Em janeiro de 1999, mal iniciado o segundo mandato, o deputado Tarso Genro propôs a deposição do presidente reeleito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
O lançamento da campanha com o mote “Fora FHC!” evocou acusações que Tarso enfeixou num artigo publicado pela Folha.
Trecho:
“O presidente Fernando Henrique está pessoalmente responsabilizado por amparar um grupo fora da lei, que controla as finanças do Estado e subordina o trabalho e o capital do país ao enriquecimento ilegítimo de uns poucos. Alguns bancos lucraram em janeiro (evidentemente, por ter informações privilegiadas) US$ 1,3 bilhão, valor que não lucraram em todo o ano passado!
Depois da eleição de 2002, FHC impediu que a inflação fosse ressuscitada pelo medo decorrente da ascensão do PT.
Entre o começo de novembro e o fim de dezembro, FHC comandou a primeira transição civilizada da história republicana e entregou a casa em ordem.
Um surto de juízo aconselhou o sucessor a entregar a direção do Banco Central a Henrique Meirelles, eleito deputado federal pelo PSDB de Goiás.
Três meses depois da posse, o oportunista de nascença começou a costurar a fantasia repulsiva da “herança maldita”.
O reizinho malandro finalmente está nu.
O vigarista que prometia moralizar o país é o padroeiro de quadrilhas insaciáveis.
O oposicionista que ignorou a mão estendida por Tancredo Neves passou a confraternizar com qualquer caso de polícia.
A vestal de bordel institucionalizou a roubalheira impune.
Meteu-se até o pescoço nos maiores escândalos registrados desde a chegada das caravelas.
E ensinou os filhos a fazer o que fazem.
A nação enfim acordou, e entendeu que o inventor do Brasil Maravilha era o disfarce do farsante boquirroto.
O milagreiro de araque recebeu de FHC um país pronto para o ingresso no mundo civilizado.
Com a ajuda do poste que instalou no Planalto, reaproximou o Brasil do tempo das cavernas.
É ele o pai da verdadeira herança maldita.
Mas nem fica ruborizado ao recitar que FHC sempre quis ser Lula quando crescesse.
“É inveja”, esbraveja o marechal do que o ministro Celso de Mello qualificou de esquema criminoso de poder.
O espelho berra o contrário.
Nenhum homem culto prefere ser ignorante.
Gente civilizada despreza a tribo dos primitivos.
Um estadista honrado quer distância de um politiqueiro fora da lei.
Sobretudo, o vencedor não tem motivos para invejar um vencido que também sucumbiu à espécie de ressentimento para o qual não há remédio -- e o tempo não cura.