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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

Ano-novo chinês
05/01/2016 - Míriam Leitão - O GLOBO

O ano começou com o susto da bolsa chinesa, cujos índices despencaram e levaram à suspensão do pregão. O governo chinês desvalorizou o yuan, e o indicador de atividade do setor industrial veio fraco. Foi o suficiente para que os poupadores tivessem a mesma reação de outras vezes, em que vendem pelo temor de novas quedas. Durante o ano, a dúvida continuará em relação à China.

— A queda da bolsa chinesa reflete a enorme incerteza que ronda o PIB chinês em 2016. O PMI, que é uma sondagem com gerentes do setor industrial, ficou abaixo de 50 pontos e veio mais fraco do que o esperado. Então fica aquela dúvida: será que o PIB vai ficar abaixo de 6%? O governo vai conseguir atingir a meta de crescimento de 7%? Como a China é a segunda maior economia do mundo, ela consegue provocar essa forte volatilidade em todos os mercados -, explicou o economista Sérgio Vale, da MB Associados.

Além disso, a China foi a economia que mais puxou o PIB global na última década e foi a grande formadora de preços dos produtos que exportamos. O que acontece lá nos afeta diretamente, e isso fez o ano inaugurar com desvalorização do real. Há outra variável pressionando as moedas dos países emergentes, que é a elevação da taxa de juros nos Estados Unidos, mas o grande enigma continua sendo o que acontecerá com a China, diz Sérgio Vale:


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— O governo chinês tem pouco espaço para estímulos monetários ou fiscais. Então, quando acontece uma desvalorização do yuan, fica o temor de que o governo esteja pensando em usar a moeda como forma de estímulo, ou seja, que isso seja mais um sinal de que os problemas da economia do país são maiores do que o mercado consegue enxergar.

Esse é sempre o ponto em relação à China. Uma desvalorização da moeda poderia ser vista como um impulso para a manutenção da competitividade das exportações chinesas, mas na verdade a pergunta que surge é: o que o governo chinês está escondendo? Há sempre o temor de que as autoridades estejam camuflando parte da fragilidade. É isso que eleva o temor em relação a uma economia que, no fim das contas, permanece crescendo em ritmo invejável, ainda que reduzindo o patamar ano a ano.

Os juros americanos em alta também afetam o mundo inteiro, inclusive a China, pela intensidade e complexidade das relações entre as duas maiores economias do mundo. A desvalorização do real poderia ser vista também como uma forma de aumentar a capacidade brasileira de exportar, mas há dúvidas sobre por quanto tempo os Estados Unidos subirão os juros e até se esta é a política certa. A economia americana está retomando o crescimento e já recuperou o alto nível de emprego, mas a inflação permanece ainda muito baixa. A elevação dos juros é uma forma de prevenir a formação de bolhas, mais do que o combate a alguma pressão inflacionária.

Na China, há também o temor de que os ativos estejam valorizados demais. As ações tiveram anos de alta e chegaram a mais que dobrar de valor. Depois, caíram, devolvendo parte da valorização. Existe a dúvida sobre se ainda assim as ações estão valorizadas.

Com juros em alta e a incerteza sobre a China, o mundo fica mais hostil para um país como o Brasil, que tem tantos motivos para dúvidas dos investidores. O Brasil está em recessão, com inflação alta, um processo de impeachment em andamento, já perdeu o grau de investimento por duas agências — Standard & Poor’s e Fitch — e pode perder também pela Moody’s. A perspectiva não é boa também para 2016.

O economista Ilan Goldfajn, do Itaú Unibanco, contou em relatório divulgado ontem aos clientes que na viagem que acaba de fazer aos Estados Unidos defrontou-se o tempo todo com perguntas sobre o desdobramento da crise econômica e política.

Ele diz que, se a China desacelerar a economia mais do que o esperado, deve ocorrer mais queda das commodities, o que desvalorizaria mais o real.

Quando a presidente Dilma assumiu, o dólar estava em R$ 1,66. Ontem, fechou em R$ 4,03. A valorização do dólar foi de 145%; a queda do real foi de 58%.

Essa mudança cambial é uma das razões do superávit comercial de quase US$ 20 bilhões em 2015. O que, pelo menos, é uma boa notícia para o ano-novo brasileiro.


  

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