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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

Wendell, um brasileiro
24/01/2016 - Roberto Pompeu de Toledo - VEJA

O nome não poderia ser mais brasileiro: Wendell. Os brasileiros de sua classe, quando não se chamam Wendell, chamam-se Wellington, Welton, Werley, Wanderson ou Wallyson. Wendell Lira, este o seu nome completo, ganhou na semana passada, em cerimônia na sede da Fifa, na Suíça, o prêmio de gol mais bonito de 2015.

O leitor deve ter visto, na TV ou no YouTube, e se não viu deve ver, de tão inspirado e raro, o gol que lhe valeu o prêmio: um movimento acrobático, chute de costas para o goleiro, o corpo no ar.

Wendell fez o gol quando jogava pelo modesto Goianésia, time da cidade do mesmo nome, de 65.000 habitantes, a 170 quilômetros de Goiânia. O adversário naquele dia era o Atlético Goianiense, num jogo pelo campeonato goiano, e o público era de apenas 342 espectadores no Estádio Serra Dourada, em Goiânia.


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Wendell Lira era um intruso na festa da Fifa. Aquilo é evento para os barões do futebol. Messi, Cristiano Ronaldo e Neymar concorriam, como finalistas, a melhor jogador do ano (ganhou Messi). Com Wendell Lira, na disputa do gol mais bonito, concorriam Messi, de novo, e o italiano Florenzi.

O brasileiro ganhava no Goianésia 3 000 reais por mês. Era ilógico encontrá-lo naquele ambiente, ele que, no competitivo mundo do futebol, estava até ali talhado para perder.

Por todas essas razões, o mais emocionante da festa foi a reação do humilde brasileirinho Wendell no momento em que anunciaram sua vitória. Também, para quem não viu, vale a pena ver no YouTube.

Ele não pula de alegria, não levanta os braços em triunfo, não ensaia sequer um esboço de sorriso. Só abaixa lentamente a cabeça, de olhos fechados, contido e circunspecto.

Uma parte de sua vida acabava naquele segundo, outra começava. A que acabava não deixava saudade. A que começava acenava com um tanto de esperança e outro de incerteza. Wendell Lira tem 27 anos. É uma idade em que quem tinha de ser craque já é.

Alcançar o topo, no mundo do futebol, é para poucos. No Brasil, 82% dos jogadores profissionais, segundo o Bom Senso Futebol Clube (entidade criada para defender os direitos dos jogadores), ganham até dois salários mínimos e 85% dos clubes permanecem inativos por mais de seis meses ao ano.

Wendell Lira teve um início promissor, nas divisões de base do Goiás, o principal time do estado, e chegou a integrar uma seleção brasileira juvenil. Dali para a frente acumularam-se os contratempos, inclusive contusões no joelho.

Em 2014, desempregado no futebol, foi trabalhar na lanchonete Goiânia Bacana, de sua mãe. Ali fazia de tudo, segundo apurou o repórter Roberto Oliveira, do UOL.

Acordava às 3 da manhã para fazer as compras, atendia os fregueses no balcão e operava a caixa. No ano seguinte, com o convite para jogar no Goianésia, veio a oportunidade de retomar a carreira.

Com um terno bem-comportado, oferecido por uma loja de Goiás, e penteado caprichado, Wendell Lira apresentou-se à festa da Fifa com a compostura singela de quem vai pela primeira vez ao castelo.

Iniciou seu discurso agradecendo “em primeiro lugar a Deus” e terminou-o com uma versão popular da história de Davi e Golias segundo a qual, se diziam que Golias era grande demais para ser vencido, Davi respondia que Golias era grande demais para não ser acertado.

Neymar, de chapéu-coco, gravata-borboleta brilhante, brincos que pendiam das orelhas e tatuagem no pescoço, como se permite aos habitués do castelo, diria depois sobre Wendell que “Deus não dá um prêmio à toa para um grande cara”.

É assim no mundo dos Wendells, dos Weltons, dos Werleys, e até dos Neymares: Deus dá o passe, ajuda a empurrar a bola para a rede, escolhe os campeões e distribui os prêmios, se é que também não cobra o lateral.

Wendell Lira era o brasileiro, na festa. Neymar já escapou a essa condição. O gol que premiou Wendell Lira, mesmo se tivesse sido marcado por um craque de primeira linha, seria difícil de repetir.

Exige a coincidência de uma série de fatores: a corrida precisa em direção ao gol; o perfeito posicionamento do corpo; uma noção de espaço que permita intuir, sem vê-los, onde estão o gol e o goleiro; o chute certeiro.

Sobre Wendell Lira disputam lugar o sol e uma nuvem. O sol é o convite que talvez lhe venha da China ou das Arábias. A nuvem é voltar à lanchonete da mãe, onde o troféu que ganhou na semana passada será apenas um enfeite na prateleira.


  

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