União fraterna 27/06/2016
- DORA KRAMER - O ESTADO DE S,PAULO
Senadores ficaram indignados com a “batida” da Polícia Federal em um dos apartamentos funcionais da Casa, ocupado pela colega Gleisi Hoffmann, em operação para busca e apreensão de provas para instruir o inquérito contra o marido da senadora, ex-ministro Paulo Bernardo, preso preventivamente sob a acusação de crime de corrupção.
Os senadores, no entanto, não pareceram se espantar nem a eles acometeu sentimento de indignação diante do motivo da investigação: o desvio de R$ 100 milhões das operações de crédito consignado, no Ministério do Planejamento, entre 2010 e 2015.
Segundo os investigadores, parte do dinheiro teria ido para Paulo Bernardo (titular da pasta no governo Luiz Inácio da Silva) e parceiros do esquema, parte destinada aos cofres do PT sob a gerência do notório João Vaccari Neto.
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Esse o real desvio de foco que o cinismo de uns e a apressada simplificação da realidade de outros apontam como a motivação e/ou consequência da Operação Custo Brasil – cria da Lava Jato – do Ministério Público de São Paulo.
Segundo versão corrente, a prisão de Paulo Bernardo teria o condão de “desviar o foco” do noticiário político policial do PMDB para o PT levando “alívio” ao Palácio do Planalto.
Se não é má-fé é autoengano.
Mais de dois anos depois de iniciada, a Lava Jato e seus desdobramentos chegam aos políticos com uma força que ultrapassa a tarefa levada a cabo em Curitiba.
Evidente que a prisão de um graúdo é um baque para o PT. Mas é só mais um. Outros piores vieram e alguns piores ainda virão para se somar ao passivo do partido, cujo acerto de contas se dá agora na Justiça e, logo mais, dar-se-á nas urnas.
Essa é a fatura a ser paga pelos petistas. O que não significa que a cobrança às contas em aberto de outros grupos políticos desapareça no turbilhão da galeria como se fosse possível contabilizar o prejuízo alheio como benefício. Polícia Federal, procuradores e juízes empenhados em esmiuçar o funcionamento do aparelho corrupto de Estado já mostraram que não fazem cerimônia ideológico/partidária.
O PMDB safou-se por ora de ver alguns de seus ilustres na prisão. Mas os inquéritos, os processos, as denúncias e os fatos (tanto passados quanto ainda a serem comprovados) estão em andamento e, como vemos dia sim outro também, os personagens se revezam no infortunado destaque à medida que avançam as investigações. Portanto, o coadjuvante de hoje pode ser o protagonista de amanhã. E vice-versa.
De onde não há que se falar em “desvio de foco por motivação política”.
Se tentativa de mudar de conversa há – e claramente há –, parte de suas excelências cuja unidade de discursos ultimamente (desde o pedido de prisão para Romero Jucá, José Sarney e Renan Calheiros feito pela Procuradoria-Geral e negado pelo Supremo Tribunal Federal) está acima das diferenças partidárias.
A ordem da estação é a crítica à condução das investigações. Nisso estão unidos petistas, tucanos (à exceção do senador Aloysio Nunes Ferreira), pemedebistas e todo “arco da sociedade” parlamentar.
No pedido de prisão para os colegas mais do que encrencados, protestou-se que Rodrigo Janot havia “extrapolado”.
Agora, na visão dos senadores, quem extrapolou foi o juiz que ordenou a busca e apreensão relativa a Paulo Bernardo, que não tem foro especial, porque teria “violado” a sacrossanta residência da senadora casada com o investigado.
A súbita e fraterna união teve efeito apaziguador até na Comissão Especial do impeachment, onde o espírito de corpo achou por bem não tocar no assunto e arquivar temporariamente os embates. Qualificou-se de “silêncio respeitoso”.
Em contraponto, estabeleceu-se um absolutamente desrespeitoso silêncio em relação ao desvio de dinheiro do crédito consignado, certamente a título de pedágio por uma das grandes obras sociais do PT.