Risco de falta de gás forçou Petrobras a assinar acordo 30/10/2006
- Agnaldo Brito - O Estado de S.Paulo
Ao Brasil, a Petrobras dirá que o acordo assinado com a estatal boliviana Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPFB) na madrugada de domingo em La Paz foi positivo. Uma questão de ponto de vista: o contrato é muito pior se comparado à situação da companhia no país antes do ato de nacionalização dos Hidrocarbonetos, em 1º de maio, mas, de fato, é muito melhor do que o que vigorou desde então.
Foram três as razões que levaram a Petrobras a ceder e aderir ao novo modelo imposto pelo governo boliviano. Dois deles têm motivos comerciais: garantia de retorno na operação dos dois megacampos de San Alberto e San Antonio e a manutenção de uma posição estratégica na Bolívia, onde grandes reservas ainda podem ser exploradas. Mas foi a necessidade de garantir o abastecimento do mercado brasileiro que, desde o início da negociação, impôs a exigência de ficar na Bolívia.
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Metade do gás consumido no Brasil sai do subsolo boliviano e a avaliação da Petrobras foi que, se deixasse o país, como previa o artigo 3º do decreto de nacionalização, caso não fechasse o acordo, teria mais dificuldade de assegurar o fornecimento de 30 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia aos consumidores brasileiros.
O atraso em projetos de gás no Brasil - ao mesmo tempo em que houve estímulo ao consumo - obrigou o País a aceitar as novas condições de produção.
O CONTRATO
O presidente da Petrobrás Bolívia, José Fernando Freitas, rechaçou a avaliação de que a companhia se converteu desde ontem numa mera prestadora de serviço na atividade de Exploração e Produção (E&P) de petróleo e gás. Segundo ele, a companhia assinou um contrato de operação, mas com feições de um contrato de produção compartilhada, como o que a Petrobras tem em Angola.
Depois de avalizado pelo Congresso, a empresa brasileira passará a pagar 50% de imposto e não 82% diretos, como o previsto a partir de maio, com o decreto. A outra metade será dividida da seguinte forma: a Petrobras receberá os valores relativos ao custo de produção e a amortização de investimentos. A sobra (ou o lucro) será dividida entre a Petrobrás e a YPFB.
Mas essa parcela de margem não foi informada. A alegação de Freitas é de que o porcentual de lucro dependerá da produtividade dos campos e dos investimentos. “Portanto, esse será variável ao longo do tempo. Quando a Petrobras investir mais e produzir mais, receberá um valor maior. Se ocorrer o contrário, receberá menos”, disse Freitas.
O presidente da Petrobras Bolívia disse que esse será um modelo “mais próximo de um contrato de produção compartilhada. Portanto, aquela situação de um contrato puro de prestação de serviço não se traduz na prática.” Segundo ele, num contrato de prestação de serviço “a empresa não participa nem das vantagens nem das desvantagens do negócio. Este não é o caso.”
O monopólio da comercialização passa para as mãos da YPFB, que transfere a responsabilidade de cumprimento desse contrato para as petroleiras. Freitas disse que a gestão do contrato se tornou muito mais complexa, diferente do que ocorria antes da nacionalização.
As mudanças por enquanto atingem apenas a área de Exploração e Produção (e não envolvem as refinarias) e podem não alterar o faturamento da Petrobras Bolívia de US$ 1,2 bilhão por ano. Essa cifra poderá cair, caso a Petrobras venda as refinarias. O nível de rentabilidade da operação também continua adequado, mas será menor do que aqueles obtidos antes da nacionalização.
Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), afirmou que a assinatura do contrato no último momento mostrou como o Brasil conduziu mal a crise com a Bolívia.
“Ninguém assina um contrato desse tipo na última hora. Essa simpatia ideológica do governo brasileiro com a Bolívia não permitiu a frieza necessária para uma negociação melhor”, afirmou. Segundo ele, por tudo isso, a Petrobras não tinha outra alternativa.