Gostaria de ter ido a Salvador para conhecer e mostrar a Igreja de Santo Antônio da Barra, o Forte de São Diogo e o Cemitério dos Ingleses. Na igreja, você assiste à missa e contempla a Baía de Todos os Santos. O Forte de São Diogo foi erguido para defender o flanco sul da cidade, no tempo em que Salvador era a capital do Brasil.
Só que os inimigos não chegaram pelo mar. Vieram de dentro de Salvador, capitaneados por Geddel Vieira Lima. Construiriam um prédio de 30 andares, que, segundo o Iphan, arquitetos e moradores, arruinaria a paisagem.
Felizmente, a paisagem foi salva. Geddel tentou pressionar o ministro da Cultura, mas acabou perdendo a batalha. Quase continuou no cargo. O governo Temer é feito de cumplicidades pretéritas com o objetivo de escapar da Lava Jato.
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Ao tentar manter Geddel no cargo, Temer queria impedir que ele caísse nas mãos de Sérgio Moro. Ele é investigado pela Lava Jato. O apartamento de Geddel no prédio La Vue custou R$ 2,5 milhões. Ou comprou ou ganhou. Em ambas as hipóteses, aumentaria a suspeição da Lava Jato.
Lembro-me de Geddel ainda na década dos 1990. Antônio Carlos Magalhães divulgou um dossiê intitulado “Geddel vai às compras”.
Os líderes políticos que, inutilmente, lhe deram apoio para evitar sua queda são uma espécie de Bessias, aquele mensageiro cuja missão era evitar que Lula caísse nas mãos de Moro.
Não adiantaria muito tentar salvar Geddel, esconder-se nas barras das togas dos ministros do Supremo. A grande delação da Odebrecht vai colocar todo o mundo político na roda.
Existem fortes manobras para decretar uma autoanistia. Essas manobras são conduzidas por Renan Calheiros e Rodrigo Maia, mas têm o apoio de Temer. Eles acreditam que podem deter a Operação Lava Jato através de um golpe parlamentar.
Na verdade, podem aumentar a irritação popular com eles e transformar a delação da Odebrecht num genocídio da espécie.
Temer e a cúpula do PMDB, embora estejam trabalhando para estabilizar a economia, confirmam as piores suspeitas. Seu grande objetivo é desmontar a Lava Jato. Considerei o impeachment um momento importante para atenuar a crise brasileira.
Achei que era preciso dar um crédito inicial de confiança para que o desastre econômico fosse reparado. Pouco se avançou nesse campo. Mas eles andam rápido no projeto de autoblindagem.
O que não faz o medo? Se Temer, Moreira, Geddel e Padilha, o quarteto do Palácio, partem para essa luta com Renan Calheiros e Rodrigo Maia, o jovem ancião da política brasileira, eles abrem uma nova frente.
Quais são seus motivos? Geddel, por exemplo, já aparece em algumas delações premiadas. Seu enriquecimento é visível.
Moreira Franco, também citado cobrando propinas em obras de aeroporto, e Padilha, como Geddel, são velhos sobreviventes.
ACM o chamava de Eliseu Quadrilha. O próprio Temer tem dois apelidos na delação da Odebrecht.
No momento em que abrem o jogo, não deixam outro caminho a não ser o de uma oposição implacável.
Contam com um grande número de deputados e senadores, mas esses estão apenas cavando mais profundamente sua sepultura.
Comandados por Renan Calheiros e o quarteto do Palácio, os políticos brasileiros temem encarar a sua batalha decisiva. Ou liberam a corrupção que sempre os alimentou ou vão para o inferno.
Na biografia de Renato Russo, há menções a Geddel Vieira Lima, que frequentava a mesma escola do cantor.
Geddel chegava sempre num carro verde e dizia que seu sonho era ser político. Renato Russo o achava insuportável.
O que diria hoje diante da bela paisagem que Geddel ameaçava em Salvador?
Não pude ir à Bahia porque a crise no Rio me levou aos presídios de Bangu.
Agora que um ex-governador está lá dentro, vale a pena conhecer o que é aquilo.
Passei uma noite em claro para documentar o esforço das famílias em visitar os presos.
Existe uma visão geral de que as famílias também são culpadas e devem pagar um pouco pelos crimes de seus filhos, pais e maridos.
É um equivoco. Com a prisão de Cabral, o sistema penitenciário tem dois caminhos: ou cria um regime de exceção para ele e sua família ou racionaliza a visita de todos os 26 mil presos no complexo.
Parece mais fácil criar um regime de exceção. Mas com um bom aplicativo, o que leva horas de espera, pegar uma senha, poderia ser feito pelo telefone.
Pelo menos, os problemas com Cabral em Bangu são mais fáceis de equacionar do que os da cúpula do PMDB.
Presos, ainda dão trabalho. Muito menos, no entanto, do que a Renan Calheiros e ao núcleo do Planalto, que mantêm o poder em Brasilia e trabalham, intensamente, numa blindagem de aço especial que consiga, simultaneamente, anular a Lava Jato com suas evidências e a opinião pública com sua justificada fúria.
Que país é esse? Renato Russo dizia na letra da canção: “na morte eu descanso/ mas o sangue anda solto/ manchando papéis e documentos fiéis”.
Como Cabral, Geddel foi às compras.
Roubar uma paisagem de nada adianta, porque, na cadeia, o que se vê é o sol nascer quadrado.