Em nome da estabilidade 09/12/2016
- ELIANE CANTANHÊDE - O ESTADO DE S.PAULO
Já que o Supremo Tribunal Federal (STF) virou a Geni da vez, que tal entrar na contramão e defender a decisão do plenário, que estancou uma crise institucional e evitou mais um grave sacolejo na já frágil situação política, econômica e social?
Nada nessa vida é perfeito, mas o Supremo, empurrado para uma situação difícil, em que qualquer decisão seria duramente criticada, optou pela saída possível: a de meio-termo.
Atual inimigo número 1 da população brasileira, Renan Calheiros (PMDB-AL) foi impedido de assumir eventualmente a Presidência da República no caso de ausência de Michel Temer, mas manteve a cadeira de presidente do Senado por mais um mês e meio.
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Na prática, significa que o Supremo deu alguns dias de vida útil para o supervilão da hora, já que o recesso parlamentar começa na semana que vem e o sucessor de Renan será eleito na reabertura dos trabalhos em fevereiro.
Então, objetivamente, o STF interrompeu uma crise institucional de proporções imprevisíveis, em um momento em que o País já está saturado de crises por um preço razoável: dar sobrevida de seis ou sete dias para Renan que não muda um milímetro o destino dele.
A sorte do senador e de seus 12 inquéritos está lançada.
Questão de tempo.
O problema foi o custo da decisão do STF na opinião pública: uma imensidade de críticas, um enorme desgaste. Os brasileiros estão exaustos com o tamanho, a disseminação e os valores estratosféricos que a corrupção assumiu.
Logo, querem sangue, troféus, execuções em praça pública.
A democracia e a justiça, porém, não se fazem assim.
É preciso maturidade, serenidade e até coragem pessoal de homens e mulheres públicos para remar contra a corrente.
Foi isso que ministros como a presidente Cármen Lúcia e o decano Celso de Mello acertaram, até mesmo com representantes do governo e com parlamentares responsáveis e experientes como o vice-presidente do Senado, Jorge Viana (PT-AC).
Todos eles têm horror a que se diga que houve “acordão”, mais ainda “acordão para salvar Renan”.
Mas houve, sim, acordo, só que não para salvar Renan.
Nenhum deles quer ou vai salvar Renan de coisa nenhuma.
Mas para preservar o equilíbrio entre Poderes, a estabilidade institucional.
Ao afastar o presidente de um outro Poder por uma liminar, sem haver urgência e fato novo, o ministro Marco Aurélio Mello não só atravessou o samba e um julgamento em andamento como mexeu com os brios do Senado e jogou o Supremo em uma emboscada, espremido entre endossar o arroubo do colega ou partir para o confronto direto com o Legislativo.
Não por acaso a liminar do ministro foi no dia seguinte às grandes manifestações em 25 Estados e no Distrito Federal, em que os grandes vilões foram o Congresso, o desvirtuamento das dez medidas anticorrupção e, diretamente, Renan.
O ministro ficou “bem” com a opinião pública.
Mas deixou Supremo “mal”.
Para conceder a liminar em um caso assim, como lembraram Cármen Lúcia e Celso de Mello, deveria ter havido urgência e fatos novos, ingredientes sobejamente existentes na liminar do ministro Teori Zavascki afastando Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara e do próprio mandato.
Por que a liminar de Teori contra Cunha foi aprovada por unanimidade no plenário?
E por que a de Marco Aurélio contra Renan não foi?
Reflitam, por favor.
Renan, que é Renan, só piora as coisas, ou joga gasolina na fogueira, recusando-se a receber a notificação do oficial de justiça, descumprindo uma liminar do STF e ontem tripudiando e chocando com uma frase que soa como sarcasmo ou provocação:
“Decisão judicial do STF é para se cumprir”.
Sinal de desespero?
Só pode ser.
Porque Renan Calheiros sobreviveu a essa batalha, mas não vai ganhar a guerra com a Justiça.