Assim como o Congresso tem o mau hábito de aprovar medidas irresponsáveis no escuro da madrugada, o governo federal deixa para praticar algumas maldades no remanso do final do ano. Assim se deu com a amputação da Floresta Nacional do Jamanxim, no Pará.
A poucos dias do Natal, o Planalto deu a fazendeiros, posseiros e grileiros o presente por que eles tanto ansiavam desde 2006, quando a Flona do Jamanxim foi criada: de 13 mil km2, uma área 60% maior do que a região metropolitana de São Paulo, ela encolheu para 5.600 km2.
Outro vício comum em Brasília consiste em tentar fazer passar por positivas medidas obviamente deletérias para a ordem legal. No caso, a desfiguração da Flona veio embutida num pacote de ampliação de áreas protegidas em 2.300 km2, com a criação de novas unidades de conservação (UCs).
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Para rematar, o embrulho foi atado por meio de medidas provisórias. Parece evidente que não se achavam presentes os requisitos constitucionais de relevância e urgência para recorrer a esse expediente autocrático.
Os conflitos fundiários na região de Novo Progresso (PA) se arrastam há mais de década. Incapaz de conter a violência de grileiros e exploradores ilegais de madeira, porém, o Estado brasileiro desistiu de se impor por ali.
Há meros seis meses um policial terminou morto numa emboscada logo após participar de operação de desmonte de acampamento de madeireiros clandestinos. Há dois anos, a Operação Castanheira desbaratou uma quadrilha que grilava terras, ainda hoje, inclusive na Flona Jamanxim.
Não é impossível que alguns fazendeiros tenham comprado de boa-fé terras na floresta nacional. Mas são raros os que têm títulos para comprovar que não o fizeram depois de criada a UC, ou que não se tratava de áreas obtidas por meio de esbulho fundiário.
Nesses poucos casos, o mais correto seria indenizá-los em montante justo para manter a integridade da floresta nacional –sempre supondo que a demarcação da UC obedecera, na época, critérios técnicos de relevância ecológica da área a ser conservada.
Ao ceder às pressões dos beneficiários da grilagem, atuais ou antigos, o governo de Michel Temer (PMDB) não só concede um prêmio em alguns casos concretos como também emite péssimo sinal em abstrato: reafirma que apoderar-se de terras públicas continua a ser um bom negócio, pois algum dia o Estado acaba por reconhecê-las como propriedade legítima.