Gigantismo e ineficiência 08/01/2017
- O ESTADO DE S.PAULO
Em vários momentos, nas últimas décadas, a disposição de luta na defesa de seus representados demonstrada por um punhado de sindicatos resultou em ganhos expressivos para os trabalhadores.
Embora não raras vezes a atitude de muitos dirigentes desses sindicatos tenha beirado a arrogância e a ilegalidade, os resultados alcançados com suas ações pareciam demonstrar o vigor da estrutura sindical que viceja no País basicamente sob regras instituídas há mais de sete décadas, na ditadura do Estado Novo.
Fossem efetivamente fortes e, sobretudo, representativos dos trabalhadores que dizem defender, os sindicatos estariam aptos a assumir o papel que deles esperam seus representados nesse período de crise em que as negociações coletivas se tornam bem mais difíceis e o País começa a discutir novas relações de trabalho.
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Estarão as entidades sindicais preparadas para cumprir a tarefa que delas têm razão de esperar os trabalhadores?
Serão elas capazes de participar de maneira produtiva dos debates que, se bem conduzidos, resultarão na necessária modernização das relações entre empregados e empregadores?
O gigantismo da estrutura sindical brasileira sugere alto grau de representatividade das organizações sindicais de diversos níveis.
Há hoje no País 16.491 organizações de natureza sindical, representando tanto os interesses econômicos (patronais) como os profissionais (de trabalhadores), reconhecidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, como mostrou o sociólogo e técnico em planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) André Gambier Campos, no estudo "Sindicatos no Brasil: o que esperar no futuro próximo?", publicado pela instituição.
O número inclui todos os sindicatos, federações, confederações e centrais sindicais, de empregadores e de trabalhadores.
O trabalho está concentrado na avaliação da estrutura e do grau de representação dos sindicatos profissionais, que totalizam 10.817 organizações, o que corresponde a 65,6% do total.
O que o autor constatou foi que cerca de 80% desses sindicatos têm área de representação restrita (municipal ou formada por poucos municípios) e seus filiados não passam de 16,2% dos trabalhadores de sua base.
Embora muito baixo, o índice de sindicalização sugere uma situação muito melhor do que a que se observa na prática.
A média é puxada por alguns grandes sindicatos, inclusive os de funcionários públicos.
A maior parte das organizações sindicais tem número muito limitado de filiados, “o que provavelmente resulta em problemas na representação e na defesa dos trabalhadores”, observa o autor do estudo.
Há, de fato, um sério descompasso entre o número de sindicatos e seu real poder de representação.
Em grande parte dos casos, os sindicatos foram criados não por necessidade legítima de defesa dos interesses dos trabalhadores, mas por esperteza de um grupo de pessoas que, interessadas na apropriação de uma fatia do imposto sindical retirado do salários dos empregados, criaram uma organização sindical de baixa representatividade e pouquíssimo interesse nos problemas de sua categoria.
Além da garantia de recebimento automático de uma parcela do imposto sindical, os sindicatos são protegidos pela regra da unicidade – um só sindicato por categoria profissional numa determinada base territorial –, que impede a formação de outras associações efetivamente interessadas nos problemas dos trabalhadores.
Além disso, só sindicatos formalmente constituídos podem realizar negociações coletivas.
Protegidos e sustentados desse modo, muitos sindicatos se tornaram fonte de poder e receita para dirigentes mais interessados em seu próprio futuro do que nos problemas da categoria da qual se apresentam como líderes.
Terão dirigentes sindicais dessa estirpe competência e disposição para defender os interesses de seus representados nesses tempos de mudanças no mundo do trabalho?
As reformas trabalhistas não serão completas se não incluírem a revisão do sistema de representação dos trabalhadores.