Uma estátua para Donald Trump 25/01/2017
- ELIO GASPARI
Na sua primeira semana de governo, o presidente Donald Trump detonou o acordo tarifário dos Estados Unidos com 11 países da região do Pacífico e anunciou que vai renegociar o tratado de livre comércio com o México e o Canadá. Como Trump já havia acusado o México de roubar empregos dos americanos, a Casa Branca avisou: “Se nossos parceiros recusarem uma renegociação que dê condições justas aos nossos trabalhadores, o presidente anunciará a intenção dos Estados Unidos de se retirar do Nafta (sigla que denomina o tratado).”
A estátua de Trump deve ficar no Itamaraty, e a homenagem nada teria a ver com a essência de suas decisões. Serviria apenas para lembrar que os países precisam de políticas nacionais. Certas ou erradas, mas nacionais. Quem brinca de vagão acaba abandonado no meio da estrada. Cuba foi vagão da União Soviética e deu-se mal. Em 1994, o México atrelou-se aos Estados Unidos e hoje se vê ofendido, humilhado, como se o Nafta fosse um acordo lesivo aos interesses americanos. Não é, mas o presidente dos Estados Unidos acha que é, e foi eleito com essa bandeira.
Em 2001, quando a diplomacia americana tentava atrair outros países americanos para o que seria uma ampla associação de livre comércio, a Alca, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, diretor do Instituto de Pesquisas de Relações Internacionais do Itamaraty, disse o seguinte:
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“A negociação da Alca é a negociação de um patíbulo. Trata-se de um processo no qual os Estados Unidos, na condução dos seus interesses, querem que o Brasil entre numa zona de livre comércio abrindo mão da possibilidade de ter políticas comerciais, industriais e tecnológicas. Por que a Europa não faz uma zona de livre comércio com os Estados Unidos? E o Japão? Se eles não fazem, por que devemos fazê-lo?” (Mais tarde, o Japão entrou no acordo do Pacífico que Trump mandou às favas.)
Pinheiro Guimarães foi demitido. Violência desnecessária, mas era o tempo do fascínio do tucanato e de muita gente boa pela globalização nos termos dos americanos.
Trump está mostrando ao mundo que países não devem ir atrás de locomotivas. Tem autoridade para dar essa lição porque está no comando da locomotiva, abandonando vagões. Os Estados Unidos têm seus objetivos e não compartilham soberania. Ir atrás de Washington pode ser uma fria.
Durante boa parte do século passado, o Brasil foi vagão. Afastou-se da China e em 1971 passou pelo vexame de ver o professor Henry Kissinger apertando as mãos de Mao Tse-Tung. Rompeu com Cuba em 1964 e, no ano seguinte, enfeitou uma intervenção americana na República Dominicana. Era o que convinha aos Estados Unidos, mas à época o México não se atrelou a essas duas iniciativas.
A história diplomática brasileira tem grandes momentos de independência, infelizmente pouco apreciados e até escondidos. Em 1975, os Estados Unidos meteram-se numa aventura em Angola, e o Brasil alinhou-se com o governo do MPLA. Veio do próprio secretário de Estado, Henry Kissinger, o reconhecimento de que fizera bobagem. (Hoje o MPLA de Angola é uma cleptocracia, mas essa é outra história.) Num episódio menos conhecido, em 1982, o presidente americano Ronald Reagan estava pronto para invadir o Suriname e mandou o diretor da CIA ao Brasil, para buscar apoio. Não o teve e desistiu.