Padilha confessou o que todos escondem 15/02/2017
- BLOG DE RICARDO NOBLAT - O GLOBO
Nada que não saiba o caboclo mais bronco de um remoto igarapé da Amazônia, ou do que possa chocar as almas mais ingênuas reclusas no convento das carmelitas descalças em Porto Alegre, foi revelado, ontem, pelo ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, em palestra durante um evento promovido pela Caixa Econômica Federal, em Brasília.
O que causou espanto nos que ouviram Padilha foi ele contar, com uma sinceridade jamais exibida antes por uma autoridade do seu nível, como costumeiramente são preenchidos os cargos públicos no Brasil. No caso, cargos de ministros de Estado. Padilha assumiu sem tergiversar que o governo negociou cargos em troca de apoio no Congresso.
Ele disse que o presidente Michel Temer aceitou a indicação de Ricardo Barros, feita pelo partido dele, o PP, para o Ministério da Saúde como parte da estratégia de composição da base parlamentar do governo. Áudio obtido pelo jornal “O Estado de S. Paulo” registra a fala de Padilha. A intenção inicial do governo era a de indicar um nome técnico para a Saúde.
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Foi entre médicos de São Paulo que o governo encontrou o nome que procurava, mas que Padilha não revelou qual era. “Lembram que quando começou a montagem do governo diziam: ‘Não, mas queremos nomear só ministros que são distinguidos na sua profissão em todo Brasil, reconhecido, os chamados notáveis?”, perguntou Padilha. E prosseguiu:
- Aí nós ensaiamos uma conversa de convidar um médico famoso em São Paulo. Ele ia ser ministro da Saúde. Aí nós fomos conversar com o PP: ‘O Ministério da Saúde é de vocês, mas gostaríamos de ter um ministro da Saúde’. ‘Tá, o senhor nos dê um tempo para pensar e tal’. Depois eles mandaram o recado por mim: ‘Diz para o presidente que o nosso notável é o deputado Ricardo Barros’.
Padilha disse que tratou do assunto com Temer, mas prevaleceu a opinião de que era importante ampliar a base de parlamentares. “Nosso objetivo era chegar nos 88% (de apoio no Congresso). Até chegamos mais do que a gente imaginava, mas a gente queria ter uma base consistente. Muito bem, vamos conversar. ‘Vocês garantem todos os nomes do partido em todas as votações?’. ‘Garantimos’. ‘Então o Ricardo será o notável’”, concluiu Padilha em conversa com dirigentes do PP.
Lula teve mais sorte quando preencheu o Ministério da Saúde do seu segundo governo. Por sugestão de amigos, ele escolheu José Gomes Temporão, médico sanitarista do Rio de Janeiro. Mas era preciso que algum líder político o apadrinhasse. Então Lula telefonou para Sérgio Cabral, então governador do Rio, e propôs que o PMDB carioca assumisse como sua a indicação de Temporão. Cabral topou.
Na época, ouvi de Cabral: “Como um governador pode se recusar a patrocinar a nomeação de um ministro do gosto do presidente da República?” Somente Lula poderia dizer quanto custou ao governo federal o apoio de Cabral a Temporão. O apoio do PP ao governo Temer custou, além do Ministério de Saúde, pelo menos mais uma dezena de cargos. Mas isso Padilha não admitiu. Pelo menos não dessa vez.