Combinado não sai caro 19/02/2017
- O ESTADO DE S.PAULO
Apenas no ano passado, 3 milhões de novas ações trabalhistas foram ajuizadas nos tribunais de todo o País – número que faz do Brasil o campeão mundial em processos dessa natureza –, sobrecarregando ainda mais o já assoberbado Poder Judiciário.
É razoável inferir que o volume de reclamações trabalhistas seria menor caso a sabedoria popular consagrada pelo provérbio que dá título a este editorial também fluísse, como nas ruas, pelas páginas da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), hoje em absoluto descompasso com a realidade daquilo que pretende proteger.
Esta é uma das distorções que a reforma trabalhista em discussão no Congresso pretende corrigir.
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Entre as medidas que visam a arejar a arcaica legislação da década de 1940, a prevalência do acordo negociado entre empregados e empregadores sobre o disposto em lei é das mais auspiciosas.
Em recente seminário sobre o tema, ocorrido na Fundação Fernando Henrique Cardoso, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Martins Filho, alertou para o que chamou de “ativismo judiciário” ao tratar do caráter intervencionista da Justiça trabalhista.
Segundo Martins Filho, “há um ativismo judiciário que chega ao cúmulo de partir de princípios próprios para criar normas”.
Tão pernicioso é esse “ativismo” na Justiça trabalhista, prossegue o ministro, que “há casos que podem levar empresas ao fechamento”.
Esse furor normativo tem custado caro aos brasileiros, tanto do ponto de vista econômico como da qualidade da prestação jurisdicional, inversamente proporcional às pilhas de processos que hoje atravancam os gabinetes dos magistrados e desestabilizam as relações entre empresas e trabalhadores.
Um número tão grande de ações trabalhistas pode levar à conclusão de que ser desprovido de quaisquer escrúpulos parece ser condição para os empregadores contratarem no Brasil; ou de que as normas que regem as relações de trabalho ora em vigor distanciaram-se das atuais necessidades de patrões e empregados.
Não obstante os abusos ainda praticados por empregadores leoninos, parece clara a prevalência da segunda hipótese.
A necessidade da reforma trabalhista impõe-se, nos termos propostos pelo governo federal, de um lado, para desafogar a Justiça e, consequentemente, melhorar a prestação jurisdicional às partes.
De outro, para trazer maior segurança jurídica às relações entre as empresas e os trabalhadores.
A insegurança jurídica nas relações de trabalho não escaparia da apreciação do Supremo Tribunal Federal.
No início de 2015, a Corte foi instada a manifestar-se sobre a questão no julgamento da validade do acordo coletivo celebrado entre o Banco do Estado de Santa Catarina (Besc) e o sindicato dos empregados, antes da incorporação do banco catarinense pelo Banco do Brasil, em 2008.
Pelo acordo, as indenizações pagas à época dariam quitação geral de débitos trabalhistas, ou seja, o pagamento impediria futuros questionamentos na Justiça.
O TST julgou nula esta cláusula por seu caráter genérico.
Já no Supremo, foi determinante o voto do ministro Luís Roberto Barroso, relator do processo, que entendeu ser válido o acordo à luz da Constituição, que “prestigiou a autonomia coletiva da vontade como mecanismo pelo qual o trabalhador participará da formulação das normas que regerão a sua própria vida, inclusive no trabalho”.
O julgamento não teve repercussão geral por ter sido o primeiro dessa natureza a tramitar na Corte Suprema, prolongando, assim, o conflito com o entendimento do TST de que a negociação coletiva não se sobrepõe aos direitos garantidos por preceito de lei.
A reforma trabalhista ora em discussão no Congresso é um imperativo para pacificar as relações de trabalho, trazer equilíbrio para o processo decisório nos tribunais – hoje notoriamente favoráveis a um dos lados contendores, o dos empregados – e fomentar o desenvolvimento da atividade econômica, muitas vezes tolhida por um arcabouço jurídico intimidador.