Passará o Céu e o Inferno 19/03/2017
- CARLOS BRICKMANN - CHUMBOGORDO.COM.BR
O Inferno vem antes: com o avanço da Operação Lava Jato e a entrega ao Supremo da Lista de Janot, na qual há pedidos de abertura de inquérito sobre 107 pessoas – todas, de alguma forma, poderosas – Brasília parou.
A oposição decidiu ir à guerra: entre os envolvidos, estão Dilma e Lula, e os ex-ministros Palocci e Mantega.
O Governo não sabe bem como agir: os ministros Eliseu Padilha, Gilberto Kassab, Moreira Franco, Aloysio Nunes fazem parte da lista.
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Que fará Temer, com tantos ministros sob suspeita?
Boa pergunta: o que não falta, nos meios políticos, é gente imaginando fórmulas para se livrar da prisão.
A mais simples é definir especificamente a Caixa 2 como crime.
Em seguida, enquadrar nessa definição o maior número possível de políticos e empresários.
E, como a lei que especifica que a Caixa 2 é crime será recente, todos os acusados serão inocentes, já que quando a praticaram ainda não havia lei que a definisse como crime.
As tentativas de livrar-se legalmente da cadeia podem não dar certo, se a opinião pública se mantiver atenta (e mobilizada, o que será demonstrado no próximo dia 26).
Entretanto, ao menos para o pessoal mais poderoso, os pedidos de inquérito podem incomodar, mas dificilmente os atingirão.
Há dois anos, Janot pediu ao Supremo a abertura de 27 inquéritos envolvendo pouco mais de 40 políticos.
Passados dois anos, seis estão sendo processados.
Para quem tem foro privilegiado, o Supremo é o Céu.
ATRAVÉS DO ESPELHO
Toda verdade tem múltiplas facetas.
A nota acima pode perfeitamente ser lida ao contrário.
Há quem conteste a existência do foro privilegiado; há quem até o aceitaria, mas discorda de uma legislação que joga nas costas de um tribunal constitucional, já sobrecarregado de processos, o julgamento de réus, o que não é sua especialidade, e desprovido de recursos para dar aos casos a celeridade que deveria ser a norma.
Para a população, que espera Justiça, e a quem os julgamentos deveriam mostrar que o crime não compensa, Céu e Inferno se invertem.
OS ANJOS DA GUARDA
Há profissionais da política cuja especialidade é resolver o insolúvel (e em tornar insolúvel, se o retorno não for o esperado, aquilo que poderia ser resolvido).
Não estamos falando de moral, de ética, de serviço público, mas de política no sentido básico do termo, de luta pelo poder.
É um pessoal competente – um pessoal que, para atender a seus interesses, conseguiu fazer com que o impeachment de Dilma deixasse de incluir a perda de seus direitos políticos.
Eles não vão deixar, sem luta, que seus privilégios sejam atingidos.
Já estão com pintura de guerra e as flechas preparadas.
VEREDAS DA SALVAÇÃO
O primeiro passo dos Anjos do Mal é garantir a manutenção do foro privilegiado.
Ou seja, uma reforma eleitoral a ser aprovada até setembro, válida para as eleições do ano que vem.
Se alguém mexer no foro privilegiado, eles estarão reeleitos, podendo argumentar que, ao eleger-se, esse direito lhes estava assegurado.
A formatação da reforma eleitoral vem sendo discutida por gente que conhece o tema: proteção para quem usou Caixa 2 (anistia, ou definição de que o crime é crime só de agora em diante); criação de um fundo eleitoral – com dinheiro público, claro – para custear as campanhas, sem contribuições de empresas nem de pessoas físicas; e voto em lista fechada.
Cada eleitor vota num partido.
Cada partido tem uma lista eleitoral elaborada por seus caciques.
Conforme o número de votos, são escolhidos os nomes conforme a ordem da lista.
Lava Jato?
Quem tiver foro privilegiado não precisará se preocupar com isso.
E mais, dará forte apoio ao combate “sem tréguas” à corrupção.
O NOME DAS COISAS
Fundo público, Fundo eleitoral são nomes bonitos.
Talvez “Mão no Tesouro” não seja tão elegante, mas descreve com mais precisão a ordenha que Suas Excelências estão propondo.
O Fundo Eleitoral teria entre R$ 4 bilhões e R$ 8 bilhões (e não se misturaria com o Fundo Partidário, onde os partidos mamam mais R$ 1 bilhão por ano).
Em vez de algum prestador de serviços pagar, quem paga é o contribuinte.
Mas quem garante que as vacas leiteiras de sempre desistirão da propina e das vantagens que ela traz?
O DESTINO DA IDEIA
Há listas fechadas de candidatos em diversos países, e funcionam bem.
Na Alemanha, metade dos parlamentares se elege pela lista, a outra metade por voto distrital (cada um vota em quem conhece, e o custo da propaganda se reduz muito).
E por que aqui o sistema seria ruim?
Porque na Alemanha, por exemplo, entram na lista os líderes partidários, aqueles que fazem campanha por seus companheiros.
Aqui até poderia ser assim: Sérgio Cabral, Renan, Palocci, Aécio, Demóstenes Torres, todos são líderes partidários.
E, encabeçando a lista, sua reeleição seria garantida e fácil.