Juntando as pontas 06/05/2017
- MERVAL PEREIRA - O GLOBO
De duas, uma: ou todo mundo resolveu contar a mesma história só para incriminar Lula, ou o ex-presidente era mesmo o "chefe, o grande chefe, o nine”, identificado, como revelou ontem o ex-dirigente da Petrobras Renato Duque, por um movimento passando a mão na barba.
Somente com uma santa ingenuidade é possível ainda acreditar que Lula não sabia de nada, não tinha nada com o que acontecia na Petrobras e em outros setores do Estado brasileiro pilhado pela máquina petista e seus aliados.
Trava-se agora uma batalha jurídica, já que a política está liquidada, prevendo que a eleitoral, ainda a ser disputada em 2018, pode reverter o quadro que as pesquisas de opinião revelam no momento.
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Lula é o líder das pesquisas, especialmente devido à popularidade que ainda mantém no nordeste, mas é também o campeão de rejeição.
Só ainda não acontece com ele o mesmo que aconteceu com candidatos de outras paragens, especialmente tucanos, por que ele é um líder populista diferenciado, que ainda carrega consigo lembranças de melhores tempos em que ele era o “salvador da pátria”.
Natural que em regiões menos informadas custem a chegar as informações sobre a corrupção que chefiou, segundo relato de vários delatores e denúncia que está sendo processada na Procuradoria-Geral da República.
A denúncia sobre o “quadrilhão”, que o coloca como o chefe do esquema criminoso, já foi feita pelo Procurador-Geral da República Rodrigo Janot que, em 2016, pediu a inclusão do ex-presidente Lula como um dos investigados no inquérito 3.989.
Ao descrever o papel do ex-presidente no caso, pedindo ao Supremo uma investigação mais aprofundada, Janot afirmou “Pelo panorama dos elementos probatórios colhidos até aqui e descritos ao longo dessa manifestação, essa organização criminosa jamais poderia ter funcionado por tantos anos e de uma forma tão ampla e agressiva no âmbito do governo federal sem que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva dela participasse.”
Desde então, o processo do quadrilhão que, a exemplo do do mensalão é dividido em núcleos e por enquanto tem cerca de 50 investigados, vem sendo acrescido das novas informações que surgem nas delações premiadas e em depoimentos como o de ontem de Renato Duque.
Não é a primeira vez, por exemplo, que o ex-presidente surge na narrativa orientando seus cúmplices a destruir provas.
Segundo Leo Pinheiro, presidente da OAS, Lula perguntou se tinha feito pagamentos no exterior ao PT, e disse que se tivesse provas de encontros de contas com o PT no pagamento de caixa 2, que as destruísse.
Ontem foi a vez de Duque revelar que Lula lhe ordenou que não tivesse contas no exterior das propinas oriundas das sondas da Sete Brasil ou da empresa holandesa SMB.
O interessante é que o ex-presidente fez essas perguntas por que disse que a então presidente Dilma Rousseff estava preocupada pois soubera que um dirigente da Petrobras recebera propina da holandesa SMB.
Mas Dilma estava preocupada não com a roubalheira, pois não foi para parar com ela que Lula chamou Duque para conversar.
O que preocupava era que os rastros da propina no exterior fossem descobertos.
Os detalhes narrados por Renato Duque, há anos identificado como o homem do PT dentro do esquema de corrupção da Petrobras, nem um bom ficcionista criaria se não fossem baseados em “fatos reais”.
Aliás, se juntarmos todos os relatos já obtidos em delações premiadas na Operação Lava Jato, veremos que eles têm relação entre si e formam uma narrativa coerente que não poderia ser inventada por tantos envolvidos de diferentes empresas.
Há uma lógica interna nas narrativas que as confirma, deixando abismados os brasileiros.
O próprio Renato Duque ontem, na sua fase de arrependido, disse que ele mesmo ficava espantado com a ganância de seus pares.
Seu parceiro Barusco amealhou U$ 100 milhões, e ele diz que quando alcançou a cifra de U$ 10 milhões, deu-se por satisfeito.
Mas tudo indica que não parou de roubar, e promete devolver tudo.
Lula está cada vez mais sozinho na sustentação de que tudo não passa de uma conspiração contra ele.
A cada dia fica mais difícil acreditar nas teses de sua defesa.
Nada indica que o depoimento do dia 10 em Curitiba desfaça essa impressão.