A delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista representou o perdão de crimes cujas penas somadas poderiam alcançar de 400 anos a até 2 mil anos de prisão, informou Marcelo Godoy no Estado. Ainda que impressionem, os números não vão ao extremo. Se o juiz tivesse mão pesada, a pena podia chegar a quase 2.500 anos de cadeia.
A conclusão é resultado de uma simples conta aritmética. Os irmãos Batista contaram à Procuradoria-Geral da República (PGR) que tiveram 240 condutas criminosas, sendo 124 casos de corrupção e 96 de lavagem de dinheiro.
Para compilar a listagem completa dos crimes, foram necessários 42 anexos, entregues ao Supremo Tribunal Federal (STF).
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Pois bem, a Lei 12.683/2012 prevê pena de reclusão de 3 a 10 anos, além de multa, para quem comete o crime de lavagem de dinheiro.
Já o Código Penal estabelece para o crime de corrupção ativa a pena de reclusão de 2 a 12 anos, mais multa.
Se fossem aplicadas penas máximas às condutas narradas, a pena dos irmãos Batista chegaria a 2.448 anos.
Diante desse expressivo passivo penal, o mínimo que se deveria esperar da PGR era uma extrema prudência na negociação com os irmãos Batista, sem deixar margem para que a tão contumazes criminosos o crime compensasse.
Ao mesmo tempo, todo esse histórico criminal conferia uma confortável posição de negociação à Procuradoria, já que os irmãos Batista tinham muito a acertar com a Justiça.
A não concretização do acordo de colaboração premiada deixaria os srs. Joesley e Wesley numa situação delicada, expostos a várias investigações criminais.
Como se vê, havia muito terreno para negociar, já que era possível recortar muita pena e ainda sobrar outro tanto, dando-se por cumprida, ainda que imperfeitamente, a lei penal.
E no caso de ainda a Procuradoria-Geral ter alguma insegurança a respeito de suas margens de negociação, ansiosa que estava por não perder a oportunidade de saber quais eram aqueles graves crimes que os irmãos Batista tinham a delatar, a PGR podia se valer do exemplo proporcionado pela negociação com o sr. Marcelo Odebrecht.
Não foi preciso perdoar-lhe todas as penas para que o empreiteiro contasse o que sabia.
Surpreendentemente, a PGR não aproveitou qualquer espaço de negociação de que dispunha e concedeu, assim se lê no termo do acordo de colaboração premiada assinado com o sr. Joesley Batista, “o benefício legal do não oferecimento de denúncia” em relação a todos “os fatos apresentados nos anexos (...), objeto de investigação criminal já em curso ou que poderá ser instaurada em decorrência da presente colaboração”.
Sem dúvida, o caso dos irmãos Batista constituirá um capítulo esquisito da história da Procuradoria-Geral.
Comprometeu-se a PGR a conceder completo perdão a centenas de crimes com a simples condição de que eles fossem narrados aos procuradores.
O que for aqui contado, parece dizer o termo assinado pela PGR, estará imediatamente perdoado.
Certamente, a população gostaria de saber a razão de se conceder tamanha indulgência a um pessoal que, pelo que se deduz de suas próprias palavras, não era nada exemplar.
Pela lei, seus crimes mereceriam 2 mil anos de prisão.
Como se não bastasse o caráter inexplicável do acordo, fugindo da lógica de qualquer negociação, seus termos são expressamente ilegais, já que a Lei 12.850/2013 veda o benefício concedido pela Procuradoria-Geral da República aos irmãos Batista a quem liderar organização criminosa.
O sr. Janot achou que os irmãos Batista não eram os líderes?
A coroar o triste episódio de impunidade, quem tinha o dever de sustar toda essa ilegal negociação também foi iludido pelos irmãos Batista.
Para surpresa de uma população que ainda deposita esperanças no Poder Judiciário, o ministro do STF, Edson Fachin, homologou, sem atinar para as evidentes ilegalidades, o perdão dos 2 mil anos de prisão à dupla.
Certamente, merece outro nome essa generosidade, que tão flagrantemente fere a lei e os bons costumes.