Você escolhe a lei, ainda que não goste dela, ou o arbítrio que faz a sua vontade? 08/06/2017
- BLOG DE REINALDO AZEVEDO
O debate de ontem, no Tribunal Superior Eleitoral, que teve como protagonistas Herman Benjamin, relator da ação que pede a cassação da chapa que elegeu Dilma-Temer, e Gilmar Mendes, presidente do tribunal — com participações laterais, mas importantes, em ambos os polos —, exibiu um mérito inegável: opôs duas visões de direito.
Ou, para ser mais preciso: opôs uma concepção que tem espinha dorsal, a expressa por Mendes, e outra, que dá mais atenção ao alarido do que à letra da lei — nesse segundo caso, estamos falando do gelatinoso terreno do chamado “interesse público”, em nome do qual muitos crimes se cometem.
Vamos pensar. Há prazo para que os interessados ajuízem uma Aije (Ação de Investigação Judicial Eleitoral), que é precisamente o que se enfrenta no TSE: vai até a diplomação do eleito.
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Ao acusar a “chapa tal” de, por exemplo, abuso de poder político e de poder econômico, é preciso que o denunciante aponte os indícios que podem vir a se tornar provas.
Outra ação é a Aime (Ação de Impugnação de Mandato Eletivo). Nesse caso, o prazo para acionar a Justiça Eleitoral é um pouco mais dilatado: estende-se por 15 dias além da diplomação.
Vocês já devem ter ouvido falar por aí: a Justiça Eleitoral atua quando provocada.
Obviamente, não lhe cabe ir além daquilo que constitui o libelo acusatório.
Tem o dever de, nas suas multiplicas diligências, verificar a veracidade dos elementos elencados como provas.
Ora, a vontade popular é o principal pilar da democracia.
Imaginem se, a qualquer tempo, se pudesse entrar com uma ação para cassar uma chapa ou um eleito.
Estaríamos no pior dos mundos.
A vontade popular seria submetida à permanente judicialização, de sorte que um estatuto sufocaria o outro — e o sufocado seria justamente o sufrágio.
Assim, agiu muito mal o ministro Herman Benjamin quando, fazendo o que a Justiça Eleitoral não deve fazer, resolveu empreender uma investigação como se Ministério Público fosse — segundo disse, com a anuência do ministro Edson Fachin, relator do petrolão no Supremo (não me diga!).
Convocou, então, o testemunho de delatores ligados à Odebrecht, além de João Santana, ex-marqueteiro do PT.
Ora, pergunte-se: e por que, então, não se suspende o processo para ouvir Joesley Batista? E depois Antônio Palocci? E em seguida o Zé Mané!
A coisa não teria fim.
Em nome da salubridade legal do processo, espero que a maioria dos ministros rejeite esses depoimentos.
Todos sabem que considero que o melhor para o país seria a permanência de Temer. Mas isso não orienta a minha avaliação. É que o respeito à ordem legal está na essência de um regime democrático de direito.
Sim, dispõe o Artigo 23 da Lei Complementar 64/90:
“O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.”
Jurisprudência do Supremo diz algo muito parecido sobre qualquer assunto.
Mas atenção! O que se pretende aí é exaltar a independência do juiz, não a sua dependência de alaridos organizados.
Ademais, quem disse que os testemunhos dos empreiteiros e de Santana são “fatos públicos e notórios” ou “provas”?
Ainda não. Tudo está sob investigação.
A questão, leitor amigo, é a seguinte: você escolhe a lei, ainda que NÃO aponte para o lugar que você quer, ou o arbítrio, desde que adequado a seu gosto?
Quem escolher o segundo caminho estará, em nome de uma satisfação passageira e oportunista, entrando voluntariamente na fila da guilhotina.