Santo da liberdade e da alegria 19/06/2017
- CARLOS ALBERTO DI FRANCO*
Quem teve, como eu, a experiência de conhecer um santo sabe que certas datas têm o condão de despertar muitas lembranças e imensa saudade.
Na segunda-feira que vem, 26 de junho, a Igreja Católica celebra a festa de São Josemaría Escrivá. Na Catedral da Sé, em São Paulo, às 19 horas, será celebrada missa em honra de São Josemaría.
O mesmo será feito em diversas outras capitais e cidades brasileiras.
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Há 43 anos, em maio e junho de 1974, São Josemaría visitou o Brasil e se apaixonou pelo que viu: a diversidade de raças, o convívio aberto e fraterno, a alegria, a musicalidade da nossa gente.
Apalpam-se no Brasil, dizia ele, comovido, todas as combinações que o amor humano é capaz de realizar. Liberdade, tolerância e cordialidade, traços característicos de nosso modo de ser, atraíram profundamente o fundador do Opus Dei.
A figura amável de São Josemaría e a força de sua mensagem tiveram grande influência em minha vida pessoal e profissional. Aproveitando a efeméride, quero compartilhar com você, amigo leitor, algumas ideias recorrentes na vida e nos ensinamentos de São Josemaría: seu amor à verdade e sua paixão pela liberdade. Trata-se de convicções que constituem uma pauta permanente para todos os que estamos comprometidos com a tarefa de apurar, editar, processar e transmitir informação.
“Peço a vocês que difundam o amor ao bom jornalismo, que é aquele que não se contenta com rumores infundados, com boatos inventados por imaginações febris. Informem com fatos, com resultados, sem julgar as intenções, mantendo a legítima diversidade de opiniões, num plano equânime, sem descer ao ataque pessoal. É difícil que haja verdadeira convivência onde falta verdadeira informação; e a informação verdadeira é aquela que não tem medo da verdade e que não se deixa levar por desejos de subir, de falso prestígio ou de vantagens econômicas.” A citação, extraída de uma das entrevistas do fundador do Opus Dei à imprensa, é um estímulo ao jornalismo de qualidade.
Apoiado na força de sólidas convicções, o pensamento de São Josemaría suscita ao mesmo tempo uma visão aberta, serena, pluralista. Sempre me impressionou o tom positivo da sua pregação. Sua defesa da fé não é, de fato, antinada, mas a favor de uma concepção cristã da vida que não pretende dominar à força da imposição, mas, ao contrário, quer se apresentar como uma alternativa cuja validade depende da resposta livre do homem.
Sua doutrina se contrapõe a uma doença cultural do nosso tempo: o empenho em confrontar verdade e liberdade. Frequentemente as convicções, mesmo quando livremente assumidas, recebem o estigma de fundamentalismo. É o covarde recurso de rotular negativamente quem pensa de modo diverso. Impõe-se, em nome da liberdade, o que se poderia chamar de dogma do relativismo. Essa relativização da verdade não se manifesta apenas no campo das ideias. De fato, tem inúmeras consequências na prática jornalística.
A tendência a reduzir o jornalismo a um trabalho de simples transmissão de diversas versões oculta a falácia de que a captação da verdade é um sonho romântico. Com efeito, se a verdade fosse impossível de alcançar, a simples apresentação das versões (ouvir o outro lado) representaria o único procedimento válido. Josemaría Escrivá rejeita essa atitude míope e empobrecedora. “Informar”, diz ele, “não é ficar a meio caminho entre a verdade e a mentira.” O bom jornalista é aquele que aprofunda, vai atrás da verdade que, como dizia o grande jornalista Claudio Abramo, frequentemente está camuflada atrás da verdade aparente. É, sobretudo, aquele que não se esconde por trás de uma neutralidade falsa e cômoda.
Ao mesmo tempo que defende os direitos da verdade, São Josemaría Escrivá não deixa de enfatizar o valor insubstituível da liberdade humana – particularmente da liberdade de expressão e de pensamento – contra todas as formas de sectarismo e de intolerância. E ao contemplar o dogmatismo que tantas vezes preside as relações humanas, manifesta uma sentida queixa: “Que coisa triste é ter mentalidade cesarista e não compreender a liberdade dos demais cidadãos, nas coisas que Deus deixou ao juízo dos homens”. Para ele, o pluralismo nas questões humanas não é apenas algo que deve ser tolerado, mas, sim, amado e procurado.
Na sua defesa da liberdade, no entanto, não ficava num conceito descomprometido, mas mergulhava na raiz existencial profunda da liberdade: o amor – amor a Deus, amor aos homens, amor à verdade. O bom jornalismo, verdadeiramente livre, está profundamente comprometido com a dignidade do homem e com uma perspectiva de serviço à sociedade.
Simpático e carismático, São Josemaría vislumbrava no cotidiano, nas coisas simples e comuns, o ponto de encontro entre Deus e os homens. “A vocação cristã consiste em transformar em poesia heroica a prosa de cada dia”. A família, o trabalho, as relações sociais, tudo o que compõe o mosaico da nossa vida é matéria para ser santificada. O cristianismo encarnado nas realidades cotidianas: eis o miolo da proposta de Escrivá. E sublinhava, numa advertência contra todas as manifestações de espiritualismo mal-entendido e de beatice: “Ou sabemos encontrar o Senhor na nossa vida de todos os dias, ou não o encontraremos nunca”.
São Josemaría, um santo alegre e otimista, olha a vida com uma lente extremamente positiva: “O mundo não é ruim, porque saiu das mãos de Deus”. O autêntico cristão não vive de costas para o mundo nem encara o seu tempo com inquietação ou nostalgia do passado. “Qualquer modo de evasão das honestas realidades diárias é para os homens e mulheres do mundo coisa oposta à vontade de Deus.” A luta do nosso tempo, com suas luzes e suas sombras, é sempre o desafio mais fascinante.