Governos já ajudariam se não atrapalhassem 20/07/2017
- ROBERTO MACEDO*
O enorme tamanho e a ineficiência do Estado brasileiro são, em particular na esfera federal, problemas tão conhecidos como não resolvidos.
Comparo-o a um hipopótamo, muito eficiente para comer tributos, acumular gorduras e chafurdar na lama.
Seus shows no lamaçal ganharam amplitude nos anos recentes, incluindo também atores privados a devorar enormes recursos públicos.
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Sou economista e acredito no potencial econômico do Brasil, mas me desiludi com a classe política que o comanda, ressalvadas exceções individuais cada vez mais excepcionais.
Ela vem atrapalhando o desenvolvimento econômico-social do País, em lugar de ajudá-lo.
Certa vez, ao trabalhar num banco, um colega cometeu um erro e foi chamado à chefia.
Ao voltar sintetizou o que lhe foi dito: muito ajuda quem não atrapalha.
Na economia, o noticiário permanece focado na recessão que resultou dos desmandos dos governos petistas.
Mas há também algo ainda mais grave no seu alcance temporal e nas dificuldades de solução: uma estagnação econômica que está próxima de completar quatro décadas!
Estagnação não é crescimento zero. É quando o PIB de um país não cresce à altura do seu potencial econômico.
Desde os anos 1980 até 2016 o PIB do Brasil cresceu em média míseros 2,4% ao ano.
E na década atual essa média anual foi ainda pior, 1,4% até 2016, com destaque para os tombos de 3,8% em 2015 e 3,6% em 2016.
Dos anos 1940 aos 1970, a média anual foi muitíssimo maior, 6,8%. Hoje o País deveria buscar pelo menos 5%.
A estagnação veio principalmente de políticas econômicas equivocadas adotadas por alguns governos. Como o de Geisel, que tentou escapar da chamada crise do petróleo, quando seus preços se elevaram abruptamente, em 1973.
Optou por ampliar a dívida externa do País, levando-o à insolvência internacional a partir do final da mesma década e prejudicando a que veio em seguida.
Nela se destacou nas barbeiragens o governo Sarney, de forte viés populista, criador de problemas, avesso a soluções dignas do nome, deixando um mau legado.
FHC fez o Plano Real, mas não conseguiu consolidar o ajuste das contas públicas, que acabaram caindo na irresponsabilidade de Lula e, muito principalmente, de Dilma Rousseff.
Não vejo muito sentido em rótulos como esquerda, direita, neoliberal, intervencionista, desenvolvimentista e outros.
Há políticas públicas que funcionam e outras que não funcionam no alcance de um desenvolvimento econômico-social sustentável.
A realidade econômica e social tem enorme complexidade, que transcende esses rótulos simplistas.
Defendo uma economia com mais liberdade para desenvolver o seu potencial e também a ação social do Estado, indispensável em face do lamentável histórico de desigualdade social do País.
Mas tudo deve ser buscado com rigorosa gestão das contas públicas.
A Lei de Responsabilidade Fiscal, herdada de FHC, não impediu a imensa irresponsabilidade que marcou a gestão Dilma.
Com posições preconcebidas, sem pensar nas consequências, ela também extrapolou em intervenções setoriais equivocadas.
Isso além de colocar o D do BNDES a serviço do capitalismo de compadrio, nada fazendo para acabar com a corrupção generalizada que tomou o governo federal.
Com seus desmandos como gestora, “hipopotamizou-o” ainda mais e em larga escala.
Isso resultou em enorme déficit nas contas federais e expansão acelerada de sua dívida pública, ainda em andamento.
E há também um sério problema de composição dos gastos.
É preciso um equilíbrio entre a ação social do Estado e a voltada para fortalecer a economia, mediante investimentos, como em infraestrutura.
Se a primeira sempre se sobrepõe a esta, a economia sofre, prejudicando a ação social pela carência de recursos tributários.
Ilustrativa desse desequilíbrio foi uma notícia do jornal Valor na segunda-feira:
Investimentos da União têm maior retração em 10 anos.
No detalhe, a reportagem informou que, de “janeiro a maio deste ano, os investimentos representaram apenas 2,47% das despesas primárias (...), contra 4,7% do mesmo período do ano passado e 8,7% em 2014”.
Enquanto isso, do lado social, os benefícios previdenciários passaram de 40,9%, em 2016 para 43,3% do mesmo agregado nos primeiros cinco meses deste ano, o que de novo reforça a imperiosa necessidade de reforma que prefiro chamar de salvação de uma pecaminosa previdência pública.
E mais: os gastos com pessoal e encargos passaram de 20,7% para 23,1% na mesma comparação, resultado de um injustificável reajuste dos salários dos servidores federais dado por Temer como um privilégio.
Servidores estaduais e municipais em geral não tiveram reajustes semelhantes, quando tiveram algum, e entre eles há quem tenha salários atrasados, como no Rio de Janeiro.
Por que essa diferença?
É que o governo federal não tem teto para se endividar e o faz com irresponsabilidade, ao mesmo tempo que submete Estados e municípios a tetos.
Não se deve concluir daí que a saída estaria em tirar os tetos desses outros entes federativos, mas, sim, em criar um teto também para o endividamento da União.
Portanto, com seu viés pró-corporações que atuam no seu âmbito, e focado numa ação social financeiramente insustentável, o governo federal prejudica investimentos indispensáveis ao crescimento econômico do País.
Em lugar de ajudar, está mesmo é atrapalhando.
Falei também de Estado porque essa lamentável postura transcende governos, embora na linguagem popular ele seja mais visto como governo.
Na estagnação, a maioria deles foi de trapalhões, uns menos, outros mais ou mesmo muitíssimo mais, como Dilma.
E no título acima usei governos por motivo importante, o de que colocar o Estado nos trilhos é tarefa de sua competência.
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*Economista (Ufmg, Usp e Harvard), é consultor econômico e de ensino superior