UMA IDEIA DESINTEGRADORA 01/09/2017
- MIGUEL LUCENA*
Tanto fizeram que houve a separação, diz o cancioneiro popular, de quem peço o verso emprestado para analisar o surgimento de um projeto de partido denominado Frente Favela Brasil, destinado a eleger negros ao Congresso Nacional.
Não basta apenas ser negro, tem de ser favelado. Homens bem-sucedidos como Pelé ou Ronaldo Fenômeno, mesmo sendo negros, não teriam vez, porque se exige a combinação de preto e morador de favela.
O partido aceita gente do asfalto, desde que se submeta às lideranças da favela.
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“A gente não tem que votar para cobrar direitos, a gente tem que votar para ter poder. Queremos debater a política do Brasil sob o olhar de quem assina, não de quem pede ou apenas vota”, reivindica Celso Athayde, líder do movimento.
Um partido desse naipe tem o mesmo significado desintegrador da sociedade que um partido nordestino ou sulista, incentivando o apartheid entre brasileiros brancos e negros.
Além disso, ao alimentar a guerra entre afrodescentes e caucasianos, se é que existe descendência pura no Brasil, são excluídos os amarelos (índios) e mestiços, chamados de pardos pelos registros oficiais.
Pelo critério adotado, a meu ver, os mestiços deveriam ter maioria no Congresso, porque formam a maioria da população brasileira.
Aliás, antes da mestiçagem de brancos com negros, houve a mistura de portugueses com nativos índios e em seguida destes com os africanos, resultando no caboclo que vemos no Norte do País.
O Brasil não precisa de divisão, mas de união para superar as enormes dificuldades que enfrentamos e o histórico atraso que nos aprisiona em sentimentos de inferioridade.
É um sentimento que vem lá de trás, pela falta de um pai. Os brasileiros são filhos da mãe, pelo menos o foram durante mais de 100 anos, quando os portugueses fizeram filhos nas índias e nas negras e não assumiram a paternidade.
Os brasileiros foram conhecer o pai depois que os descendentes de índios, africanos e portugueses casaram entre si, mas uma parcela considerável da sociedade continua a perguntar quem é o pai desse menino.
É justo e legítimo que as populações de favelas e comunidades semelhantes se organizem para conquistar espaços de poder, mas a segregação é mais um passo em direção ao precipício em que nos encontramos.
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*Delegado de Polícia do Distrito Federal e jornalista.