Aliança política é um pouco como casamento. Tem dia marcado para se concretizar e não tem hora agendada para o divórcio. Mas os tucanos querem estabelecer data para a separação de corpos. Enroscado há seis meses no drama shakespeariano de ficar ou sair do governo Michel Temer, o PSDB corre contra o relógio. Não é possível mais postergar uma decisão.
Por ter perdido o timing – a decisão de sair do governo poderia ter sido tomada em maio, quando veio a público a delação da JBS – ou sai agora ou corre o risco de ser saído. Não só por causa dos olhos gordos do Centrão, mas por ter se revelado um aliado não confiável.
O Dia D será 9 de dezembro, data da convenção nacional do partido.
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Se decidir continuar no governo pela força da inércia terá produzido muito barulho por nada. Sem falar no risco de ser expurgado um pouco mais à frente. Para sair, contudo, terá de operar a retificação de sua estratégia, ou melhor, adotar outra estratégia - a de redução de danos - por meio de um duplo movimento. Do contrário, serão coadjuvantes da disputa presidencial, como alertou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em seu artigo mais recente.
Primeiro os tucanos terão de cuidar do seu front interno, de pacificar suas fileiras. Na política também se aplica a velha lei da guerra, segundo a qual nenhum exército sairá vitorioso se for para o campo de batalha com suas tropas divididas.
O racha pela metade da bancada de deputados dá bem a dimensão do enrosco. É como se existissem dois PSDB. Aliás, Tasso Jereissati foi cristalino: “o PSDB desses caras não é o meu”.
Se saírem da convenção sem a unidade necessária, não estarão em condições de apresentar uma candidatura competitiva e aglutinadora do campo democrático. Quem não agrega os seus, não vai conseguir aglutinar os parceiros. Simples assim.
Só este movimento não basta. A coesão interna será inócua se acontecer à despeito da reconciliação do PSDB com os eleitores, que, diga-se de passagem, andam fulos com os tucanos. E com razão.
A pesquisa encomendada pela direção partidária não deixou margem quanto ao sentimento de repulsa do eleitorado, com repúdio explícito às guerras intestinas, ao atrelamento a um governo de baixíssimo padrão ético e à pusilanimidade no acerto de contas com o senador Aécio Neves.
O reencontro com o sentimento das ruas não acontecerá se o desembarque do governo Temer não for acompanhado pelo aprofundamento do “mea culpa” inaugurado por Tasso Jereissati.
Tem razão o presidente do PSDB/SP, Pedro Tobias, quando afirma que continuar no governo “é partir para o suicídio coletivo”. Mas pular fora equivalerá a dar cavalo de pau em navio, se a manobra estratégica não for bem operada.
Sem autocrítica quanto aos seus desvios e sem apresentar à nação um projeto reformista e socialmente justo, o desembarque pode ser entendido por amplas parcelas da sociedade como uma manobra oportunista, meramente eleitoreira.
A pecha só não vingará se o partido tiver coragem de cortar a própria carne. São incontornáveis as perguntas: por que só agora, por que não antes? Os eleitores cobrarão respostas convincentes.
Sair do governo por sair não levará o PSDB a lugar algum. É preciso qualificar o ato. O manifesto assinado por Edmar Bacha, Pérsio Arida, Elena Landau, Bolívar Lamounier e Luiz Roberto Cunha joga luz sobre o debate necessário.
Aponta para questões importantes, como o resgate da ética, a redefinição do papel do Estado, a defesa da austeridade fiscal, do não intervencionismo estatal, da modernização do ambiente de negócios.
Mas há propostas que precisam ser melhor debatidas para entender o seu sentido. O que os autores quiseram dizer com a afirmação “O Governo não precisa ter escolas, nem hospitais. Não precisa contratar professores ou médicos. Mas precisa prover saúde e educação de qualidade. Tem que ter indicadores de eficiência na tomada de decisão de como gerir os recursos das áreas de educação e saúde” ?
A dificuldade em operar um movimento duplo de tamanha magnitude está na peculiaridade dos conflitos atuais. A tradição tucana é de disputas em torno de projetos pessoais, muitas vezes equacionadas em círculos fechados. O atual conflito foge à tradição. É de fundo e impossível de ser administrado à moda antiga.
Há, claro, enfoques diferenciados quanto à tática eleitoral. Os adeptos da continuidade na base do governo apostam na força da caneta presidencial para garantir a reeleição dos parlamentares tucanos. A outra ala entende que os tucanos estarão praticando haraquiri eleitoral se continuarem no governo.
Mas há uma questão maior, que no fundo diz respeito ao que o PSDB se pretende. Se vai se conformar com a sua “peemedebização ou se vai retornar às suas origens e valores socialdemocratas, ou ainda se vai assumir o perfil de um partido social liberal similar a outros tantos que já existem na praça.
É a isso que a convenção do dia 9 tem de responder para o PSDB sair do governo de cabeça erguida e não ser saído pelas portas do fundo.
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*Professor e membro do Conselho Estadual de Educação (SP). Lecionou na Escola Politécnica da USP e no Colégio Bandeirantes e foi secretário-adjunto de Educação do Governo do Estado de São Paulo