Miller envia e-mail a Miller (!) que evidencia que ações contra Temer e Aécio foram mesmo armações 08/11/2017
- BLOG DE REINALDO AZEVEDO
Pois é… E o comprometimento ilegal do Ministério Público Federal com a delação dos Batistas (Joesley e Wesley) e associados é, tudo indica, maior do que se poderia supor, conforme revela reportagem da Folha desta quarta.
Até agora, a doutora Raquel Dodge está muda. A continuar assim, ainda se acaba achando que ela não tem o que dizer.
Antes que chegue ao ponto, algumas considerações.
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O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a soprano do golpe que tentaram dar no presidente Michel Temer, recorreu até ao Supremo contra a CPMI da JBS.
O homem acha que o Poder que ele próprio integra não tem competência e autonomia para investigar lambanças que eventualmente envolvam atos do Ministério Público Federal.
Mais: a ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) também decidiu apelar ao tribunal para impedir que Eduardo Pelella, ex-chefe de gabinete de Rodrigo Janot, fale à comissão na condição de testemunha.
Senador e entidade afirmam que ela busca intimidar os sacrossantos procuradores e o trabalho virtuoso que se faria lá no Ministério Público Federal.
Será mesmo?
Não fosse a CPMI, não se teria quebrado até agora o sigilo de mensagens enviadas por e-mail por Marcelo Miller, o ex-procurador que era um dos bravos de Janot e que já admitiu ter participado de forma indevida de entendimentos para que a JBS chegasse a um acordo de delação.
Na sua versão, limitou-se a fazer correções gramaticais em textos.
De fato, já se sabe que o papel do MPF foi muito maior.
Um e-mail enviado por Miller para seu próprio endereço — é uma forma a que pessoas recorrem para guardar anotações e fazer lembretes — sugere que ele fez, na verdade, o roteiro da delação.
O texto é do dia 9 de março, dois dias depois de Joesley gravar a conversa com Michel Temer, e 15 dias antes da gravação com o senador Aécio Neves, em que este pede R$ 2 milhões ao empresário.
Segundo Janot, em sua denúncia, trata-se de “propina”.
Ele só não diz o que Aécio ofereceu em troca.
O e-mail de Miller é impressionante porque evidencia que:
1: JANOT FALTOU COM A VERDADE EM DOCUMENTO OFICIAL
No dia 8 de março, Mario Celso Lopes, um ex-sócio dos Batistas, foi preso no âmbito da operação Greenfield em razão de operações realizadas quando ligado ao grupo.
Escreve Miller:
“Perguntar por que o MPF postulou a prisão do ex-sócio se a empresa já se apresentou à colaboração”.
IMPORTÂNCIA DO TRECHO
Ora vejam: então, no dia 9 de março, a empresa já havia acertado a colaboração com o MPF.
Ocorre que, em documento oficial, Janot assegurou que o primeiro contato da JBS para fazer uma delação só ocorreu no dia 27 de março.
Já se sabia que isso, muito provavelmente, era mentira.
Francisco de Assis e Silva, advogado do grupo e um dos delatores, afirmou ter tratado da delação com Pelella no dia 2 de março.
Mais: à Corregedoria do MPF, ele afirmou que as tratativas para uma delação começaram a ser feitas no dia 20 de fevereiro.
Poderia ser palavra contra palavra, certo?
O, digamos, auto-e-mail de Miller não deixa dúvida sobre a inverdade de Janot, a menos que o então procurador tivesse o hábito de mentir para si mesmo.
2: AS GRAVAÇÕES COM MICHEL TEMER E AÉCIO NEVES FORAM ARMAÇÕES PREVIAMENTE COMBINADAS
Escreve Miller:
“Estamos trazendo, pela primeira vez, BNDES, que era a última caixa preta da República, estamos trazendo fundos, Temer, Aécio, Dilma, Cunha, Mantega e, por certo ângulo, também Lula. Temos elementos muito sólidos de corroboração.”
IMPORTÂNCIA DO TRECHO
Notaram?
Ele escreve dois dias depois de Joesley ter feito a gravação com Temer, o que evidencia que ela era parte da trama.
Mais impressionante: Joesley gravaria a conversa com Aécio, aquela que trata dos tais R$ 2 milhões, apenas 15 dias depois.
Estava tudo planejado.
Aquilo a que se chamou “Ação Controlada” era, na verdade, um flagrante armado.
A propósito: tentem achar em que trecho o senador promete algo ao empresário, o que caracterizaria “corrupção passiva”.
Não há.
Janot assegurou em diversas entrevistas que só ficou sabendo da gravação que Joesley fizera com Temer quando a empresa o procurou, no dia 27 de março, propondo um acordo.
Eis aqui: pegar o presidente, como se nota, era mesmo parte da tramoia, da conspiração.
Mas pegar com o quê?
Bem, relembrem a gravação.
Com nada!
Um “nós” e um “eles”
Outra coisa que impressiona no e-mail que Miller mandou para si mesmo é o uso dos pronomes.
Ele era do Ministério Público Federal, lotado na Procuradoria Geral da República, mas, sempre que se refere ao MPF, este aparece como “eles”; todas as vezes em que surge um “nós”, Miller está se referindo à JBS.
Acontece que ele só deixou o MPF no dia 5 de abril.
No dia 11, para escândalo dos escândalos, já participou de uma reunião sobre acordo de leniência como advogado… da JBS, aquela mesma para o qual fez o roteiro de delação premiada.
Também em documento oficial, Janot asseverou que Miller não teve participação nenhuma nas delações.
Está provado ser mentira.
Quantas vezes afirmei aqui que a operação toda é legalmente imprestável?
Eis aí a qualidade das delações homologadas por Edson Fachin, cujo papel, em todo esse rolo, não me parece devidamente esclarecido.
Como esquecer que Ricardo Saud o acompanhou a gabinetes de senadores quando candidato ao STF?
Por quê?
Quais são os vínculos?
Ora, Saud veio a ser justamente um dos beneficiários do imoral acordo de delação, homologado pelo ministro.
A cada dia fica mais claro: tratava-se mesmo de uma tentativa de golpe.