Temer, a raposa, repõe na ordem do dia a Previdência; os bichos-preguiça não entenderam nada 09/11/2017
- BLOG DE REINALDO AZEVEDO
Pode ser, sim, que a reforma da Previdência seja destravada — ainda que numa versão enxuta. E, acreditem!, há quem não enxergue nisso a sutil atuação de Michel Temer.
Antes de se tornar presidente da República, Temer era visto pela quase totalidade dos jornalistas como uma hábil raposa política. E isso era um elogio.
A expressão se referia à sua óbvia destreza para caminhar de forma macia entre contrários.
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Sempre foi um negociador competente e comandou com brandura, mas com firmeza, a máquina gigantesca e diversa que é o PMDB.
Nas fábulas, a raposa é símbolo de sagacidade.
Parte da crítica passou a emprestar viés negativo à metáfora durante o impeachment.
O vice, então, dizia-se, estaria conspirando contra a “presidenta”.
Obviamente foi preciso ignorar que Dilma o demitira da coordenação política depois de alguns poucos meses porque os petistas passaram a atuar para derrubá-lo.
Enchiam a orelha da dita-cuja com a conversa de que ele jogava em seu próprio nome.
Acharam que era uma boa ideia ela cuidar pessoalmente da relação com os políticos.
Pois é…
Em seu pronunciamento de segunda, Temer disse com todas as letras: está, sim, comprometido com a reforma da Previdência; quer realizá-la, mas é balela que a sorte de seu governo dependa disso.
E foi explícito: ele quer a reforma, mas, se o Congresso não quiser, se a imprensa não quiser, se a sociedade não quiser, então reforma não haverá.
Poderia haver maneira mais sutil e mais eficaz de voltar a botar o tema da ordem do dia?
Os primeiros a reagir foram os mercados. E com razão.
Sem as mudanças, o futuro do país está comprometido. As expectativas se deterioraram.
E todos se lembraram, ora pois, que mudar a Previdência não depende da vontade pessoal do presidente. Sozinho, ele não pode fazê-lo.
Onde estão os políticos que a defendem?
A propósito: o que pensam a respeito, de maneira explícita e mobilizada, os que se querem pré-presidenciáveis?
O único escancaradamente a favor é Henrique Meirelles, ministro da Fazenda.
E os outros?
A propósito: o que Luciano Huck pensa sobre o tema?
E a questão voltou ao debate com a urgência que merece.
Os tontos saíram por aí a propalar que o presidente tinha dado um tiro no próprio pé.
Vai ver sobreviveu a duas poderosas urdiduras golpista porque é bobo, porque é ingênuo, porque não conhece política e os políticos.
Vai ver está onde está apenas porque é um sem-noção, que se deixa tragar por vagas de opinião…
Seu pronunciamento foi um alerta.
A reação dos mercados, uma antecipação de resultado.
O fato é que são poucos os analistas políticos. O que temos é torcida organizada em clima de boteco.
O governo vai tentar uma versão mitigada da reforma.
Deve manter a idade mínima da aposentadoria em 65 anos para homens e 62 para mulheres.
Haverá alterações na forma originalmente imaginada para a aposentadoria rural.
Também se estuda diminuir o tempo mínimo de contribuição, de 25 para 15 anos, para ter acesso ao benefício.
Assim como os mercados reagiram negativamente na terça à notícia de que poderia não haver reforma nenhuma, reagiram positivamente ontem à de que lideranças se mobilizaram em favor da mudança.
Era o esperado.
Assim, nada mais providencial do que aquele pronunciamento do presidente, que foi lido pelos bobos como um tiro no pé.
Ora, tiro no pé por quê?
Temer será deposto se a reforma não acontecer?
Terá prejudicado o seu esforço para a reeleição?
Mas qual reeleição?
O que pode perder o presidente?
Algumas linhas na enciclopédia, que não trarão, então, as mudanças que terá efetivado na Previdência.
Não fazer a mudança é que é um tiro no peito do futuro do Brasil e dos brasileiros.
Ocorre que o chefe do Executivo estava lá, a falar quase sozinho sobre o tema.
Agora, os tais mercados, descendo e subindo, lembraram a quantos estejam interessados que fazer a reforma não deriva da vontade exclusiva de Temer.
Há também o Congresso.
O presidente sempre se dispôs a liderar o processo.
No sentido virtuoso, continua uma raposa.
O problema é o raciocínio curto dos bichos-preguiça que fazem análise política.