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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

Em nome da isenção
02/12/2017 - BLOG DE REINALDO AZEVEDO

O grupo Globo precisa começar a usar consigo mesmo os critérios que emprega com alguns terceiros — critérios que o levaram a pedir a cabeça de Michel Temer antes mesmo de uma investigação formal.

O envolvimento no nome da empresa em pagamento de propina referente à transmissão de jogos da Copa do Mundo e da Copa América preocupa, claro, o principal braço do conglomerado de comunicação: a TV Globo.

Quem levou tão longe a histeria persecutória vê-se em lençóis quando menos incômodos quando recebe uma acusação formal de pagamento de propina.


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Há indícios suficientes de que, naquele ambiente, as coisas seguiam padrões éticos muito peculiares.

Leiam o que informa o Estadão. Volto em seguida.

"O ex-funcionário da empresa argentina Torneos y Competencias José Eladio Rodríguez, testemunha de acusação no julgamento do ex-presidente da CBF José Maria Marin, apresentou nesta quinta-feira no Tribunal Federal do Brooklin, em Nova York, planilhas que registram pagamento de US$ 1 milhão ao ex-executivo da Rede Globo, Marcelo Campos Pinto.

O atual presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, também aparece como destinatário de pagamentos ilícitos.

Campos Pinto negociou a compra de direitos de transmissão para o Grupo Globo até o final de 2015, quando deixou a empresa.

De acordo com documentos apresentados por Rodríguez, ele seria o ‘MCP’ que consta na planilha de pagamentos ilegais da empresa argentina — inicialmente havia dito que a sigla era referente a Del Nero; depois corrigiu.

Os pagamentos teriam sido feitos em 2013. Mas o ex-funcionário da TyC, encarregado de fazer as remessas da empresa, disse ao júri que não conhecia Campos Pinto.

Nas planilhas também apareceu referência a ‘MP’, que seria Del Nero.

Ao depor no dia anterior, quarta-feira, Eladio Rodríguez afirmou ter pago US$ 4,8 milhões em propinas para Del Nero e Marin.

Na quinta, a defesa do ex-presidente da CBF, que cumpre prisão domiciliar em Nova York, voltou a dizer ao júri que era Del Nero, e não Marin, que recebia propinas.

Para isso, exibiu alguns documentos, entre eles um e-mail de 6 de junho de 2013, enviado por Rodríguez a ele mesmo como um lembrete de atividades que teria de fazer.

Entre elas consta ‘telefonar para Marco Polo para transferência’.

Isso levou James Mitchell, advogado de Marin, a perguntar ao ex-funcionário da TyC se ele havia pago propina a Del Nero.

A resposta foi positiva.

Rodríguez disse também que o termo ‘brasileiro’ usado nas planilhas indicavam pagamentos feitos a presidentes da CBF e que, para ele, Marin e Del Nero eram um só, pois ‘estavam sempre juntos’.

A testemunha também foi confrontada por dois documentos, igualmente apresentados por James Mitchell.

Num deles, havia referência a pagamento de US$ 900 mil feito a ‘brasileiro’ (MP) e outra pagamento no valor US$ 2 milhões pela Copa América de 2015 — US$ 1 milhão teria sido pago.

A citação a Campos Pinto apareceu quando a promotoria mostrou um documento de pagamento de US$ 10 milhões feito pela Globo à empresa holandesa TyC por um contrato de transmissão.

Uma anotação em especial indicava um pagamento da T&C a Campos Pinto no valor de US$ 1 milhão.

Rodríguez disse à promotoria que o pagamento foi feito.

Marcelo Campos Pinto não foi localizado. O Grupo Globo se manifestou por nota:

“Sobre a afirmação de uma testemunha no julgamento que acontece em Nova Iork de que o ex-diretor do Grupo Globo, Marcelo de Campos Pinto, recebeu em 2013 pagamento de uma empresa do Grupo Torneos Competencias, que atua na área de marketing esportivo, o Grupo Globo esclarece que nunca teve conhecimento de tal pagamento.

Caso tal pagamento tenha ocorrido, foi, evidentemente, contrário aos interesses da empresa.

O Grupo Globo reafirma que não tolera nem paga propina".

Marco Polo Del Nero também reagiu por meio de nota:

“Com referência à citação feita pelo delator premiado José Eladio Rodríguez na Corte de Justiça do Brooklin, New York, EUA, o presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, reitera que o depoimento se mostra contraditório, confuso e inverossímil, eis que afirma sequer saber quem era o presidente da CBF à época dos fatos ou identificar o significado de supostas iniciais lançadas em uma determinada planilha.

Reitera definitivamente que não assinou nenhum contrato objeto das investigações seja pela CBF, entidade da qual não era o presidente à época, seja pela Conmebol, onde nunca exerceu nenhum cargo.

Por fim, reafirma que nunca participou, direta ou indiretamente, de qualquer irregularidade ao longo de todas atividades de representação que exerce ou tenha exercido”’.

Voltei

Convém não confundir as coisas.

Em dois depoimentos, o executivo Alejandro Burzaco acusou a Globo, a mexicana Televisa e a empresa Torneos y Competencias de terem pagado propina em troca dos direitos de transmissão das Copas do Mundo de 2026 e 2030.

Juntas, teriam, como direi?, agraciado Julio Humberto Grondona, ex-chefe do futebol argentino, com US$ 15 milhões.

Burzaco disse ainda que ele conversou com Marcelo Campos Pinto, então o todo-poderoso do futebol na emissora brasileira, sobre o pagamento de propinas para a Conmebol por intermédio da Torneos (empresa do argentino) em troca de direitos da Libertadores e da Copa Sul-Americana.

A partir de transferências bancárias à empresa holandesa, os valores eram repassados a dirigentes sul-americanos, como o ex-presidente da CBF José Maria Marin.

O tal José Eládio Rodriguez fez mais do que eventualmente dar a entender que o funcionário da Globo teria recebido propina em vez de pagar — como sugere nota da Globo.

Braço direito de Burzaco, o dono da Torneos y Competencias (T&C), ele confirmou ao tribunal de Nova York que uma offshore dessa companhia foi criada na Holanda para receber os pagamentos de grupos de comunicação, inclusive a Globo.

Assim, a suspeita, referendada pela nota da Globo — de que o então representante da emissora possa ter recebido propina pessoal — não se sobrepõe ao fato de que a acusação principal de Burzaco é a de que a Globo integrou o grupo que pagou propina, coisa muito distinta de um desvio pessoal de funcionário.

Ao ponto

Vazamentos de depoimentos — áudios ou vídeos — viraram a coqueluche da Lava Jato.

O jornalismo brasileiro, muito especialmente a Globo, nunca atentou para sua legalidade ou ilegalidade, não?

Não assistimos a falas intermináveis de Ricardo Saud acusando Rodrigo Loures de aceitar os tais R$ 500 mil para dividir com Temer?

Se vocês se lembram, não há uma só gravação entre Saud e Loures em que isso seja dito.

Nada!

Convenham: se o deputado estava pegando propina para repassar ao presidente, seria, digamos, natural que abordasse o assunto com a fonte pagadora.

Mas isso simplesmente inexiste. Como inexiste qualquer outra circunstância que aponte para algo semelhante.

O que há, de sobejo, são gravações de Saud com os procuradores, em que a acusação é feita.

Então temos o seguinte mecanismo perverso:

1: o locutor do Jornal Nacional afirma que delator diz que dinheiro era para o presidente.

E a prova?

2: ora, é o depoimento do próprio delator ao procurador, como se ele conferisse à coisa ares de verdade.

E aí esse depoimento é reproduzido no “Bom Dia Brasil”, no “Jornal Hoje”, no “Jornal Nacional”, no “Fantástico” e umas 35 vezes na GloboNews…

Esse tipo de jornalismo não se faria em nenhuma outra democracia do mundo.

Quem usa a palavra do acusador como prova são regimes como o venezuelano, o turco, o russo…

As ditaduras escancaradas matam e pronto.

É claro que não emprego aqui a palavra “prova” em sentido técnico.

Afirmo que, aos olhos do telespectador, a gravação da acusação de Saud soava como prova provada.

Era receita para derrubar presidente.

Mas ele não caiu nem atendeu ao editorial do Globo, que mandou que renunciasse.

Para arrematar: será que as gravações em que fica clara a tramoia, a urdidura, a conspiração a que se dedicou a turma da JBS, em parceria com membros do MPF, mereceu o mesmo destaque?

A pergunta é retórica.

A resposta é “não”.

Agora ao ponto

A Globo deveria escalar seus repórteres investigativos para conseguir o áudio das acusações que envolvem o nome da emissora e colocá-los em horário nobre, repetindo em todos os jornalísticos.

Em nome da isenção.

Na hora do “outro lado”, em vez de baixar a voz de Deus na figura do âncora, apareceria alguém de carne e osso para falar a respeito.

A propósito: já sabemos o que ganham os delatores brasileiros se acusam aqueles que estão na listinha previamente elaborada pelos procuradores.

Ganham a impunidade.

Cabe fazer a pergunta: o que Buzarco ganha acusando a Globo?

Delator que mente, no Brasil, ganha direito a entrevista exclusive a veículos empenhados em derrubar o presidente.

Nos EUA, se isso acontecer, ganha é uma cana feia.


  

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