Medidas de suposto combate à corrupção preveem aberrações 11/12/2017
- BLOG DE REINALDO AZEVEDO
O movimento “Não Aceito Corrupção”, que é bom de lobby porque conta com alguns nomes com trânsito na imprensa e financiadores poderosos, tem uma pauta.
O grupo lançou uma petição em que defende 12 ações contra a corrupção, entre medidas originais e apoio a projetos de lei ou Propostas de Emenda Constitucional já em curso.
E, bem, não é mera coincidência que seja um promotor, Roberto Livianu, o presidente e fundador da entidade.
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Aprovadas as medidas, a gente poderia buscar outro nome-fantasia para esse lobby: “Não Aceito Democracia”. Comento as medidas.
1: Fim do foro especial: o grupo anuncia apoio à PEC 333/17, já aprovada no Senado e que agora está na Câmara. Mantém prerrogativa de foro apenas para presidentes de Poderes e procurador-geral da República.
Na prática, qualquer um dos mais de 17 mil juízes do país poderia mandar prender quem lhe desse na telha. Não procurem paralelo em democracias do mundo. Não há.
Até Roberto Barroso, entusiasta da ideia, admite que, dada a estrutura do Judiciário brasileiro, forçoso seria que se criassem duas Varas Especiais: uma para crimes comuns e outra para crimes de improbidade.
2: Alternância de poder no legislativo: limitar a dois o número de mandatos consecutivos num mesmo cargo no Legislativo.
Houve um tempo em que cheguei a flertar com essa ideia, até concluir que é uma estupidez. É só jogada para a torcida.
O contraponto do político profissional é o político ocasional — vale dizer: o lobista. Não vai se ocupar da coisa pública, mas usar o público para garantir interesses privados.
De resto, nada impede que entidades sindicais do capital e do trabalho promovam uma alternância entre os seus, de sorte que a renovação se torne mera fachada.
Mais: é até provável que tivéssemos uma Câmara e um Senado mais sensíveis ao alarido da hora.
Pergunto: isso interessa à estabilidade democrática? Respondo: não!
Todos os dias, nas minhas orações, peço que Deus proteja Angela Merkel, por exemplo.
Essa proposta é uma bobagem.
3: Fim de indicações políticas para os tribunais de contas: dita a coisa assim, parece tão simpático como afirmar: “Não aceito corrupção”.
O movimento quer a aprovação da PEC 329, do petista Francisco Praciano, que prevê a realização de concurso público de provas e títulos para as carreiras dos órgãos de contas.
Bacana? Pois é…
A cereja do bolo é outra: os tribunais ficariam sob a vigilância do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público.
Entenderam?
Como a gente sabe, ali só se reúnem os virtuosos, né?
O Legislativo seria solapado, uma vez mais, pelo Judiciário e pelo MPF.
4: Criação do Fundo Nacional de Combate à Corrupção: mais uma vez, o nome engana o propósito.
A petição da turma fala em apoio ao PL 5.208/16, que regulamenta os acordos de leniência.
O que se quer com o tal fundo, vamos ser claros, é outra coisa: há muito o Ministério Público reivindica ser o gestor, acreditem!, de recursos desviados pela corrupção e que são recuperados pela via dos acordos de leniência ou das delações.
Pouca gente sabe, mas a Força Tarefa da Lava Jato incluiu em todos os acordos de leniência o repasse ao MPF de até 20% da multa paga pelas empresas.
Entenderam?
Os bravos procuradores privatizaram mais do que a Justiça.
Privatizaram a bandalheira também.
5: Transparência na prestação de contas partidária a turma sugere que o TSE faça mais exigências da prestação de contas.
Nada contra.
É preciso ver se existe mão de obra para fiscalizar o que está sendo declarado.
Resposta: não existe! Com o fim da doação de empresas, então, teremos a festa da uva do caixa dois.
Mas aposto que o “Não Aceito Corrupção” é favorável ao fim da doação de pessoas jurídicas.
6: Fim da vitaliciedade para STF, STJ e tribunais de contas: de todas as propostas, é a mais demagógica e irresponsável.
A força de um tribunal constitucional é sua memória jurisprudencial.
Alguns dos desatinos em curso no país decorrem de ministros que estão mais apegados ao alarido do que à letra da lei.
Mundo afora, encontramos democracias sólidas com cortes vitalícias, como EUA e Canadá, e outras que têm uma forma de mandato, como a alemã e a portuguesa, para citar dois casos.
Nesses dois países, pode-se dizer, sem medo de errar, que a população interfere menos na composição do tribunal do que no Brasil, onde um presidente eleito indica um nome, que é submetido, por sua vez, a um Senado também eleito.