Em poucos dias surge o primeiro grande obstáculo à viabilização das promessas duvidosas da dupla Bush-Lula de, algum dia, Brasil e Estados Unidos mudarem a matriz energética do mundo. Levantou-se o singular presidente da Venezuela, Hugo Chávez, não em defesa da independência da América Latina contra as investidas de nossos irmãos do Norte, mas buscando assegurar a sobrevivência de seu país através da prevalência do petróleo. Afinal, é o único produto de que dispõe para arreganhar os dentes e mostrar as garras contra Bush, mas, na verdade, mordendo e arranhando Lula.
Para Chávez, aumentar a cultura do álcool de cana é condenar à fome as populações miseráveis do continente, porque a área plantada a ser ampliada é a que serve para plantio de feijão e arroz. Lula rebateu, dizendo provir a fome da falta de condições de parte do povo para consumir. De tabela, ainda prometeu que não seriam utilizadas terras da Amazônia e do Pantanal para plantar cana.
E o carrasco ri
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Essa é uma disputa grave. Porque se um dos caminhos do Brasil para vencer o subdesenvolvimento passa pelo álcool, a via para desmanchar igual objetivo da Venezuela, também. As previsões são de que não haverá amizade latino-americana nem identidade ideológica entre Chávez e Lula capaz de superar impasse de tal magnitude. Batemos de frente com nossos ¨hermanos¨ bolivarianos, ou vice-versa.
O périplo desenvolvido pelo presidente venezuelano pelos países não visitados por Bush envolve mais razões do que a vontade de chamar o presidente americano de satanás. O que ele pretende é assegurar petróleo barato aos vizinhos próximos e remotos, uma forma de desestimulá-los da transferência energética para o etanol. Cujos maiores produtores somos nós.
Não vamos chegar ao exagero de contar quantos moderníssimos aviões de caça russos Hugo Chávez comprou, nem o número de fuzis por ele adquiridos para armar a população. Mas é bom tomar cuidado. Qual seria a resposta de Caracas se Brasília tivesse o desplante de oferecer tecnologia de álcool ao seu governo, senão uma sonora gargalhada e uma rejeição até pouco educada? Resta saber se a recíproca será verdadeira, inversamente: se a Venezuela rompesse os acordos com o Brasil para parceria na implantação de refinarias, se negasse os acordos de fornecimento de gás, não poderíamos rir. Muito ao contrário.
De mais essa dor de cabeça que o presidente Lula deve estar sofrendo, impedido de pedir auxílio aos Estados Unidos por motivações políticas, tiram-se duas conclusões: George W. Bush demonstrou inteligência ao visitar o Brasil na semana passada e estimular a alternativa energética do álcool como forma de prejudicar Hugo Chávez. Como, também, a eterna lição da História que nunca aprendemos direito: apoio nas próprias forças, ampliação do mercado interno e desconfiança total na globalização e no livre diálogo entre fracos e fortes.
É sempre bom lembrar que a guilhotina não dialoga com o pescoço. O perigo é ficarmos batendo cabeça, ou mais do que isso, com a Venezuela, enquanto lá de cima, segurando a cordinha da guilhotina, o carrasco dá risadas homéricas ao acionar a lâmina mortal sobre os dois países. Afinal, conseguiu o que pretendia...