Jabuti não sobe em árvore 24/03/2018
- O ESTADO DE S.PAULO
No jargão político, “jabuti” é o nome que se dá a uma emenda parlamentar com o objetivo de inserir em um projeto de lei uma medida diversa da proposta original.
Trata-se, portanto, de uma artimanha para fazer tramitar sem alarde matérias em geral controvertidas ou impopulares.
O termo vem de um dito segundo o qual “jabuti não sobe em árvore, se está lá é porque alguém o colocou”.
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Rejeitado pela Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania (CCJ) do Senado por 13 votos contrários e apenas 2 favoráveis, no início deste mês, o Projeto de Lei (PLS) 186/2014, de autoria do senador Ciro Nogueira (PP-PI), que trata da liberação dos jogos de azar no Brasil, está prestes a se tornar um “jabuti” pelas mãos do ministro Marx Beltrão, do Turismo.
Não é de hoje que o ministro apoia a legalização da jogatina. Em novembro de 2016, durante o seminário Latin American Investment Forum (Laif), em Londres, Marx Beltrão já havia defendido o projeto para um grupo de investidores.
“O Ministério do Turismo vê com muito bons olhos a legalização dos cassinos, como já existem em vários lugares do mundo”, disse o ministro, um dia após o projeto de lei ter sido aprovado pelos integrantes da Comissão Especial do Desenvolvimento Nacional, também no Senado.
Em face do recente revés na CCJ do Senado, o ministro do Turismo agora planeja erguer seu “jabuti” na Câmara dos Deputados incluindo um artigo no Projeto de Lei (PL) 2.724/2015, conforme noticiou o jornal Valor.
Este projeto, de autoria do deputado Carlos Eduardo Cadoca (PCdoB-PE), trata do aumento da participação do capital estrangeiro com direito a voto nas companhias de transporte aéreo.
Não tem, como se vê, nada a ver com a liberação dos cassinos e a exploração de caça-níqueis e mesas de carteado.
O relator do PL 2.724/2015, deputado Paulo Azi (DEM-BA), justifica o estratagema alegando que “o projeto trata de vários pontos relacionados ao turismo”.
Segundo ele, os cassinos, caso sejam autorizados, seriam instalados nos chamados “resorts integrados”, grandes empreendimentos turísticos que seriam liberados “em número limitado”.
Como se nada mais urgente e importante estivesse sobre a mesa de trabalho do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) pautou para a sessão de terça-feira passada um requerimento de urgência para levar o projeto de lei à votação pelo plenário da Casa.
Se aprovado o pedido de urgência, o projeto fica livre de passar pelo crivo de outras comissões legislativas.
Toda a articulação para a tramitação do PL 2.724/2015 e a velocidade com que ela se dá têm as digitais de Marx Beltrão, que pretende ver as medidas aprovadas antes de deixar o Ministério do Turismo, em abril.
Assim como já foi rejeitado o PLS 186/2014, o “jabuti” no PL 2.724/2015 também deve ser.
Como já foi defendido nesta página, qualquer iniciativa com o fim de liberar a jogatina no País deve ser combatida.
Nenhum bem ela há de fazer à Nação, já envolta com toda a sorte de mazelas que desafiam os Três Poderes da República na busca por soluções.
Há muitas medidas que podem ser adotadas pelo Ministério do Turismo a fim de estimular o afluxo de turistas e capitais para o País, gerando mais receitas e mais empregos.
Um grande esforço de cooperação interministerial, por exemplo, com foco na solução dos conhecidos problemas na infraestrutura de transporte aéreo, marítimo e rodoviário; capacitação das equipes de recepção aos turistas de todos os órgãos da Administração Pública nos postos de entrada no País; acordos bilaterais com outras nações a fim de facilitar a concessão de vistos mútuos; ações no campo da segurança pública, entre outras.
Nada de bom, repita-se, há de vir da liberação da jogatina no Brasil.
A insistência com que certos grupos de pressão tentam fazer passar a nefasta medida só não se assemelha ao vício do jogo porque pode ser fruto de interesses sobre os quais há absoluto controle das ações em sua defesa.