A crise da Embrapa 22/04/2018
- O ESTADO DE S.PAULO
A agropecuária brasileira alimenta os 214 milhões de habitantes deste país e ainda exporta para mais um sexto da população mundial, ou 1,3 bilhão de pessoas.
Nossa estrutura de produção agropecuária hoje é flexível e diversificada, capaz de se articular com mercados distantes e demandas bastante variáveis.
Nas últimas décadas, a lavoura se tornou a salvação da economia brasileira.
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E, na presente crise econômica, o agro foi o único setor a crescer no ano passado (13%), garantindo um suado aumento de 1% do PIB.
Grande parte de tal crescimento deve-se a ganhos de produtividade, resultantes de inovações tecnológicas adaptadas às variadas situações de solo e clima do Brasil.
Centenas de milhares de tecnologias foram produzidas, desenvolvidas e testadas nos 44 centros de pesquisa da Embrapa.
A Embrapa foi criada em 1973, focada em duas únicas metas: reduzir o preço dos alimentos no mercado nacional e tornar competitivas as exportações de produtos agropecuários.
Cumpriu ambos os objetivos e foi muito além, criando uma base tecnológica ajustada à realidade e com viabilidade econômica.
Mas, hoje, infelizmente, a estatal vive uma deplorável decadência, fruto de desorientação administrativa e estratégica.
Durante os governos petistas, a Embrapa perdeu relevância e protagonismo, em função de numerosos erros de seus dirigentes.
Passou a contribuir cada vez menos para a competitividade da agropecuária, respondendo apenas marginalmente pelos resultados alcançados.
A maior parte dos mais de R$ 3 bilhões anuais que custa ao Tesouro Nacional é gasta em atividades-meio.
A oferta de tecnologia agora vem de empresas privadas.
A estatal passou do claro sucesso experimentado em seus primeiros 20 anos para uma situação paulatina de dificuldades, nos últimos 25 anos.
O descolamento da realidade do campo teve início na gestão 1995-2000.
Então diretor, o atual presidente, Maurício Lopes, implantou seis “macroprogramas”, aos quais todos os projetos de pesquisa foram submetidos, de modo compulsório.
A mudança se mostrou distante dos problemas reais e a pesquisa aplicada gradativamente deu lugar à produção acadêmica de papers, com temas dispersos.
Em meio a outras deficiências de visão – como o abandono dos Laboratórios da Embrapa no Exterior (Labex) – instalou-se um regime interno de direção central, facilitado pelo clima de temor e inquietação.
Acabaram-se as discussões democráticas, abertas e francas, como seria da natureza de organizações dedicadas à ciência e às práticas científicas, sobretudo as de caráter público.
No início do ano, a imagem da Embrapa sofreu enorme desgaste perante o mundo rural e a sociedade.
O presidente, Maurício Lopes, demitiu sumariamente um renomado pesquisador por um artigo crítico, escrito para este jornal (Por Favor, Embrapa: acorde!, O Estado de S. Paulo, 15/1/2018).
O gesto suscitou centenas de reações contrárias e foi criticado publicamente por associações, instituições e personalidades, antigos presidentes da Embrapa, secretários de Agricultura, lideranças do agronegócio e acadêmicos.
O pesquisador só retornou à Embrapa após decisão da Justiça do Trabalho.
O ministro Blairo Maggi, nessa ocasião, externou claramente a necessidade de mudanças na Embrapa, para reaproximá-la do setor produtivo.
Ainda assim, já no final de seu mandato, o presidente da estatal promove mudanças internas, sem debater com os dirigentes dos 44 centros de pesquisa e sem ouvir opiniões externas, seja de associações do agronegócio ou parceiros do setor produtivo.
Pesquisadores e analistas são o maior patrimônio da organização, mas não há recursos para novos projetos de pesquisa.
A insegurança e a apatia tomam conta dos outrora centros de excelência.
Isso precisa mudar.
A Embrapa deve voltar a ser um centro de excelência, produtor de pesquisas aplicadas e tecnologia de ponta.
Sua direção será renovada em breve.
Com a renovação, espera-se que retome seu relevante papel na construção do futuro do agronegócio.