A receita dos sindicatos 05/06/2018
- O Estado de S.Paulo
A reforma trabalhista alterou significativamente as receitas dos sindicatos. Antes, uma vez por ano era descontado do salário do funcionário o equivalente a um dia de trabalho a título de contribuição sindical.
Não havia escolha. Todos os empregados eram obrigados a repassar parte da sua renda ao sindicato da sua categoria profissional.
Com a entrada em vigor da Lei 13.467/2017, que alterou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), as contribuições sindicais tornaram-se voluntárias.
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Elas só podem ser descontadas do salário "desde que prévia e expressamente autorizadas", diz o novo art. 578 da CLT.
O caráter facultativo da contribuição sindical fez despencar as receitas dos sindicatos.
Em reação, várias entidades recorreram à Justiça com o objetivo de relativizar a necessidade de autorização do empregado.
Almejam, por exemplo, que a autorização individual possa ser suprida por uma aprovação coletiva em assembleia.
Tal manobra, como é obvio, fere o que está previsto na Lei 13.467/2017 e cabe à Justiça dar o devido rechaço a essa liberalidade com o salário do empregado.
A voracidade dos sindicatos parece, no entanto, não ter limites.
Recentemente, foi noticiado um novo arranjo para avançar sobre o salário do empregado sem o seu consentimento.
O Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias dos Estados do Maranhão, Pará e Tocantins (Stefem) firmou com a Vale um acordo que, entre outros pontos, cria uma nova contribuição a ser feita pelo empregado, chamada de "cota negocial", para custeio das despesas do sindicato.
A empresa fará um desconto anual, equivalente a meio dia de trabalho, do salário de cada empregado.
Na tentativa de dar à "cota negocial" uma aparente conformidade com a reforma trabalhista, o acordo estabeleceu que os funcionários não sindicalizados não serão obrigados a contribuir com o valor previsto.
Para tanto, eles terão de manifestar expressamente que não estão de acordo com a cobrança.
Essa exigência é uma inversão em relação ao que prevê a Lei 13.467/2017, que fala em autorização prévia do empregado.
Além disso, o acordo não prevê que os funcionários sindicalizados possam manifestar sua oposição à nova cota.
O mais estranho nessa história é que o vice-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Renato de Lacerda Paiva, referendou o tal acordo, como se ele não contivesse patentes ilegalidades.
Segundo o ministro, "o acordo é resultado de várias negociações, fruto de um consenso entre trabalhadores e empresa, com anuência do Ministério Público do Trabalho".
Este, pelo visto, também não se deu conta de que a CLT tem agora novos requisitos para a cobrança de contribuição em favor do sindicato.
Com a Lei 13.467/2017, o trabalhador tem o direito de decidir se deseja ou não contribuir com o sindicato. Não existe acordo capaz de extinguir ou relativizar o exercício desse direito.
Vale lembrar também que esse direito do trabalhador não é uma afronta ao sindicato. Antes, deve ser um poderoso estímulo para que essas entidades assumam a sua verdadeira missão, que é representar o interesse dos empregados.
A reforma trabalhista não extinguiu a fonte de receita dos sindicatos. A contribuição sindical continua existindo. Ela apenas deixou de ser obrigatória.
É um equívoco, portanto, pensar, como às vezes se diz, que a Justiça do Trabalho teria agora de se preocupar em criar fontes alternativas de renda para essas entidades.
O que é necessário é uma mudança de atitude dos sindicatos, para adequar-se à lei e também ao seu próprio caráter de órgão de representação.
Em primeiro lugar, eles têm de perceber que o equívoco não está na situação atual, mas no regime anterior, que forçava o trabalhador a contribuir, em confronto com a liberdade de associação sindical prevista na Constituição.
A receita continua disponível aos sindicatos, mas, para obtê-la, eles devem necessariamente se aproximar do trabalhador e defender claramente os seus interesses.
De outra forma, parece impossível que alguém se disponha a dar parte do seu salário a entidades interessadas primordialmente na boa vida de seus dirigentes.