May-Day 09/09/2018
- PEDRO ROGÉRIO MOREIRA - DIÁRIO DO PODER
Um canal de TV a cabo exibe um programa com o título acima. Na fraseologia aeronáutica, é o vocábulo que nenhum piloto jamais imagina ter de proferi-la.
Tampouco os passageiros que ele carrega atrás gostariam de sabê-la dita da cabine de comando para um controlador de voo.
Significa que o piloto já fez tudo o que podia ser feito e o desastre é iminente.
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A série de documentários é destinada, aparentemente, aos aficionados da aviação ou a quem aprecia assistir ao perigo que os semelhantes correm na vida, pois sabemos que viver é perigoso, em terra, no mar e no ar.
Mas só na aparência os filmes exibidos visam apenas a estes dois públicos-alvo. Eles são pedagógicos para todos os fins, não somente para a aviação.
Especialmente porque mostram que um desastre de avião é um acontecimento infausto como os demais acontecimentos infaustos na vida.
Sobretudo porque não é causado por um único motivo, a pane no motor, o flap que não foi estendido na graduação exigida, o excesso de neve acumulado sobre as asas, um inesperado vento de cauda no momento do pouso, uma distração do comandante e assim por diante.
O avião cai por mais de um problema, às vezes pequenos detalhes somados, de que não se deram conta o piloto, o pessoal de terra, o fabricante.
Muitas vezes todos juntos não atinaram para os equívocos ou os consideraram de pequena monta, sem risco.
A facada em Jair Bolsonaro é um desses acontecimentos infaustos ao qual os especialistas que produzem May-Day dedicariam uma dissecação detalhada para explicar por que o mineiro tomado de ódio fez o que fez.
A facada é o derradeiro ato a lastimar no desastre ocorrido em Juiz de Fora.
Não basta, há que lastimar mais.
Uma série de detalhes ou de equívocos escancarados sobre os quais nós todos, o pessoal de terra, o fabricante e o piloto não se deram conta ou minimizaram seus efeitos deletérios para a consumação do desastre.
É muito fácil culpar o piloto, o erro humano explicaria o acidente, mostra a série de documentários da TV.
E muitos o fazem agora, depois da facada.
É uma simplificação de investigadores desejosos de ter um culpado imediato pelo desastre.
Combinemos que foi erro de um piloto soberbo, falacioso de seus inexistentes dotes técnicos, inapto para o comando.
É mais uma simplificação dos investigadores apressados que procedem à dissecação dos equívocos a que o Brasil assiste há anos.
Conhecemos as suas identidades e CPFs ideológicos, de amplo espectro.
Lastimam a facada, mas vão escrever no relatório que a causa foi falha do piloto.
Erro humano foi, de todos nós.
Desde o famigerado Mensalão assistimos ao perigoso dividir da nação em duas parcialidades.
Divisão fomentada pelas próprias instituições nacionais: Universidade, Mídia, Legislativo, Executivo, Judiciário, órgãos de classe etc.
Até o Bar, grande instituição da sociedade brasileira moderna, fomenta a divisão.
E chegou no setor mais sensível: a Família.
Uma parcialidade é a que não enche o tanque de combustível o quanto deveria; outra, a que finge não avistar no radar meteorológico a tempestade que pode produzir o vento de través que vai obrigar o avião a voar mais tempo e acabar caindo de pane seca.
Paremos por aqui a linguagem metafórica.
O que precisa ser dito é uma velha platitude: as sociedades odientas não prosperam, a História está aí para nos lembrar.
O Brasil não pode proferir a palavra terrível aos aviadores: may-day.