Lula avisa a Evo Morales que não vai aceitar calote na Petrobras 19/04/2007
- Vera Rosa - O Estado de S.Paulo
Reunião entre os presidentes termina sob tensão após boliviano dizer que não pagará o valor real das refinarias da estatal tomadas pela nacionalização no país
Voltaram a ficar tensas as relações do Brasil com a Bolívia por causa da política nacionalista do presidente Evo Morales na área de petróleo e gás. Depois de uma reunião de 45 minutos entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Evo, na manhã de terça-feira, o presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, não escondeu o mal-estar que caracterizou a conversa. ¨As coisas voltaram a ficar ruins¨, desabafou, após o encontro a portas fechadas, no último dia da Cúpula Energética Sul-Americana, em Isla Margarita, na Venezuela.
Não foi só retórica: na reunião, Evo disse que sua intenção era retomar o controle das refinarias da Petrobras sem pagar o valor real. Irritado, Lula ameaçou cortar todos os investimentos na Bolívia e desestimular projetos privados no país vizinho. O presidente brasileiro saiu do encontro e foi direto para um café da manhã com Hugo Chávez, seu colega da Venezuela. Lula sugeriu a Chávez que conversasse com Evo.
O boliviano, que deixou a reunião visivelmente contrariado, quer nacionalizar as refinarias pagando menos da metade do preço das duas unidades, instaladas em Santa Cruz e Cochabamba. Ao ouvir os planos de Evo, Lula foi taxativo: afirmou que, se a idéia for concretizada, Brasil e Bolívia entrarão em rota de colisão. Aborrecido, repetiu o mesmo argumento minutos depois a Chávez.
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A dura conversa foi assunto de reunião realizada na quarta-feira, no Palácio do Planalto, entre Lula, Gabrielli e os ministros Dilma Rousseff (Casa Civil) e Silas Rondeau (Minas e Energia). Dilma ficou surpresa com a atitude de Evo, já que há dois meses o governo brasileiro concordou em elevar o preço do gás boliviano. Para uma fonte próxima ao Planalto, a questão saiu do plano comercial e entrou no político. Mas o clima é o pior possível.
O decreto que prevê a nacionalização das refinarias da Petrobras completará um ano no dia 1º de maio. ¨Se não houver acordo, o assunto irá para arbitragem internacional, mas, evidentemente, sem o ressarcimento devido ao Brasil, vamos considerar que não há segurança para novos investimentos na Bolívia¨, destacou Marco Aurélio Garcia, assessor de Relações Internacionais da Presidência, que estava presente ao encontro com Evo, na terça-feira, ao lado de Lula, Gabrielli, Rondeau e do ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim.
Evo não apresentou a sua proposta à queima-roupa. Antes, demonstrou preocupação com o narcotráfico e combinou com Lula a formação de uma comissão mista entre os dois países para tratar do assunto. Os dois presidentes conversaram, ainda, sobre a situação de imigrantes brasileiros e bolivianos. Só depois desses salamaleques Evo expôs o projeto que provocou a fúria de Lula.
Desde 2006, quando editou o decreto de nacionalização, o presidente da Bolívia transformou em bandeira política a renegociação dos contratos com as companhias estrangeiras para obter aumento do preço do gás. Em fevereiro, conseguiu seu objetivo: após dois dias de conversa com Lula, no Planalto, o governo concordou em reajustar o preço do gás boliviano.
Na época, Lula disse que a negociação exigira ¨muito diálogo, muita paciência e, sobretudo, muita inteligência¨ e defendeu uma ¨parceria estratégica¨ com a Bolívia. ¨Não somos os imperialistas que alguns dizem que somos¨, afirmou há dois meses.