Bolsonaro diz que vetaria aumento nos contracheques do STF se fosse Temer 11/11/2018
- BLOG DE JOSIAS DE SOUZA - UOL
Jair Bolsonaro divulgou nas redes sociais, ontem, trecho de entrevista que concedeu à Record.
Falou sobre o reajuste salarial de 16,38% para os ministros do Supremo, cujos vencimentos passaram de R$ 33,7 mil para R$ 39,2 mil.
Transferiu a batata quente integralmente para o colo de Michel Temer.
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“Está nas mãos do Temer”, disse, referindo-se ao projeto aprovado na última quarta-feira pelo Senado.
“Não sou o Temer, se fosse, você sabe qual seria minha posição.”
O repórter quis saber se Bolsonaro vetaria o reajuste. Ele respondeu afirmativamente:
“Não tem outro caminho no meu entender, até pela questão de dar exemplo. Falei antes da votação que é inopoturno, o momento não é esse para discutir esse assunto.”
Temer dispõe de um prazo 15 dias para vetar ou sancionar o texto aprovado de surpresa pelos senadores, após permanecer no freezer desde 2016, quando havia sido aprovado na Câmara.
A decisão do Senado foi vista como a primeira derrota legislativa de Bolsonaro, antes mesmo da posse.
A aparência de derrota se consolidou depois que o presidente eleito afirmou, horas antes da votação, que considerava o reajuste inoportuno.
Na entrevista, Bolsonaro cuidou de se eximir de responsabilidade. Colocando-se dentro dos sapatos de Temer, insinuou que teria tentado evitar a votação.
“…Estamos no vermelho há muito tempo. É mais uma preocupação para o ano que vem. Eu procuraria, se fosse presidente, o presidente do Senado para ver se esse projeto não entrava em pauta. Já que entrou em pauta, se o governo Temer quiser, pela Lei de Responsabilidade Fiscal, ele pode vetar esse reajuste porque, afinal de contas, essa é a classe que mais ganha no Brasil, e complica para a gente, quando fala em fazer reforma da Previdência, tirar dos mais pobres e aceitar uma reajuste como esse. Está nas mãos do Temer. Não sou o Temer, se fosse, você sabe qual seria minha posição.”
Rocha Loures tenta provar que é um débil mental
Um ano e meio depois de ter sido filmado pela Polícia Federal recebendo uma mala com propina de R$ 500 mil da J&F, Rodrigo Rocha Loures, ex-deputado e ex-assessor de Michel Temer, prestou depoimento na Justiça Federal pela primeira vez.
Adotou uma linha de defesa sui generis. Para refutar a acusação que o mantém em prisão domiciliar, o personagem se esforçou para provar que é apenas um débil mental, não um corrupto.
Foi como se Rocha Loures tentasse se livrar de suas culpas ateando fogo às próprias vestes — sempre tendo o cuidado de se despir de sua autoestima antes de riscar o fósforo.
Reconheceu tudo o que era inegável: a missão recebida de Temer para que ouvisse “as demandas” da J&F, holding da JBS; as conversas com sócio do grupo Joesley Batista; a mala recebida do executivo Ricardo Saud; a intermediação do célebre encontro de Joesley com Temer no Jaburu… Tudo.
O problema é que Rocha Loures, dotado de uma doce e insuspeitada ingenuidade, insinuou durante o depoimento não foi capaz de enxergar o óbvio.
Para tomar o depoimento como verdadeiro é preciso aceitar a premissa de que o ex-assessor de Temer esbarrou no óbvio várias vezes, tropeçou no óbvio, mas foi incapaz demorou uma eternidade para perceber que o óbvio era o óbvio. Quando notou, entrou em pânico.
Nessa versão, o óbvio escapou de Rocha Loures numa conversa que manteve com Joesley Batista:
“Ele me diz, atrapalhadamente, ele pega e fala assim: ‘Se você resolver esse assunto pra mim, tem lá 5% disso, 5% daquilo’. (…) Eu não entendi que foi uma oferta de propina, eu não entendi que ele estava oferecendo a mim esses valores e eu não iria fazer nada por ele, como não fiz.”
Ricardo Saud também falaria sobre propina com Rocha Loures. Mas o óbvio lhe fugiu novamente. E não era um óbvio qualquer. Tratava-se de um óbvio robusto, pois há nos autos um grampo captado pela PF no qual Saud:
“Você, por ter nos ajudado, já tem quinhentos mil guardadinho. Tá guardado comigo em casa. E eu não quero ficar.”
O homem da mala, monossilábico, balbucia no grampo: “Tá.”
O depoimento de Rocha Loures ocorreu há quatro dias, na última quarta-feira. Ele falou ao juiz federal Jaime Travassos, da 15ª Vara Federal de Brasília.
O repórter Aguirre Talento obteve o vídeo. Exibiu o conteúdo em reportagem veiculada no site do Globo, ontem.
De acordo com a versão do próprio réu, “a ficha caiu” apenas num encontro que teve com Ricardo Saud em 28 de abril do ano passado. Foi nesse dia que entrou em cena a mala com os R$ 500 mil.
Com a ficha já bem arriada, operou-se uma revolução na personalidade de Rocha Loures.
Um sujeito que os grampos e as filmagens indicavam ser capaz de tudo apresentou-se perante o juiz como um pobre diabo incapaz de todo.
Encontrou-se com Ricardo Saud primeiro num shopping. Informado sobre a mala de dinheiro, marcou um segundo encontro na noite do mesmo dia, dessa vez numa pizzaria.
Em timbre lacrimoso, Rocha Loures disse ao magistrado que o inquiriu que foi à pizzaria para colocar um ponto final naquela tratativa ilícita.
Entretanto, por alguma razão que não soube explicar, teve um surto. Fora de si, mostrou o que tem por dentro.
Em vez de agredir o seu benfeitor, como diz ter cogitado, saiu correndo com a mala, em "pânico".
Rocha Loures contou que, ao chegar à pizzaria, não viu seu interlocutor. Quando saía, ouviu um grito vindo do estacionamento: “Rodrigo, Rodrigo…” Era Ricardo Saud.
“Eu vou até ele, aí ele pega, com esta mala na mão, diz assim: ‘Olha a sua mala, pega que você vai perder o avião, corre que você vai perder o avião’,” contou o réu ao juiz, num relato entrecortado por choramingos.
“Naquele momento, Excelência… Eu entrei em pânico, no meio da rua, e saí correndo. As imagens, eu não sabia o que fazer. E eu fugi. Eu corri. Eu não consegui, eventualmente, agredi-lo, se fosse o caso. E me desfazer dessa situação ali, naquele momento, até pra que ficasse gravado. E o meu inferno começou. Eu pego essa mala, deixo na casa dos meus pais, aonde eu tenho lá um quarto de hóspedes, coloco dentro do armário e eu não sei o que fazer.”
Submetido a uma versão tão, digamos, incrível, o juiz Jaime Travassos fez uma interrogação com um quê de exclamação:
“Quero saber o que justificou a um deputado federal com uma ampla história profissional e pessoal a se seduzir por esses convites, e chegar a se reunir com pessoas que o senhor afirma que não tinha empatia pessoal, quatro dias após um primeiro encontro, que já lhe sugeriu algo que não encaixava as peças do quebra-cabeça.”
Rocha Loures declarou: “Então, eu vou lhe responder. O presidente (Temer) havia pedido para eu ouvir as demandas do grupo (J&F). O presidente não pediu pra eu resolver, nem fazer ilícitos com quem quer que seja. O presidente pediu pra ouvir as demandas do grupo. Então, Excelência, até prova em contrário, ou até mudar esse acordo com o presidente, eu sou uma pessoa solícita, mas eu não sou venal, não sou corrupto.”
“Pessoa solícita”… Poucas vezes um réu conseguiu empurrar para dentro de um processo em que é acusado de corrupção passiva um eufemismo tão delicado para conversa fiada.
Para um juiz, a principal característica da dificuldade de conduzir um processo deve ser a tarefa de ouvir um réu durante um longo depoimento para chegar à conclusão de que ele não tem nada a dizer em sua própria defesa.
Para o réu indefeso, deve ser dolorosa a percepção de que uma hipotética absolvição depende do seu talento para desmoralizar a si mesmo, exibindo uma parvoíce que ultrapassa as fronteiras da debilidade mental.
Quanto ao brasileiro em dia com seus impostos, há dois inconvenientes.
Um é a saudade do tempo em que mala era apenas um utensílio para o transporte de roupas.
Outro é a descoberta de que ainda há no lixão da política gente que supõe que o Brasil é um país habitado por idiotas.