A mais rica cidade do Brasil é atravessada de ponta a ponta, ao longo de quase 25 quilômetros, por um dos mais extensos, perigosos e sinistros esgotos a céu aberto do planeta ─ o Rio Tietê.
Essa fossa, riquíssima em tudo o que pode haver em matéria de coisa podre, de lixo e de tóxicos em seus estados mais agressivos, é confinada entre avenidas gigantes dos dois lados, as célebres “Marginais”, pelas quais passam diariamente cerca de 2 milhões de veículos com toda a emissão de gás carbônico a que têm direito.
Um sujeito que cair ali dentro pode perfeitamente não ter tempo de se afogar ─ corre o risco real de morrer envenenado antes, no meio da pasta química mortal que substitui há décadas a água corrente do rio.
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Nenhuma forma conhecida de vida sobrevive dentro desse horror.
Isso é só uma parte do problema.
Pouco antes de sair do município de São Paulo, em direção à sua foz 1.100 quilômetros adiante, o Tietê encontra o canal do Rio Pinheiros ─ outro sério concorrente ao título de Oitava Maravilha da Poluição Urbana do Mundo, negro de imundície e igualmente ladeado por duas avenidas de tráfego insano.
Sua única vantagem: é um pouco mais curto que a cloaca irmã.
Parece claro que existe aí um problema ambiental monstruoso, desses que teriam de ser resolvidos antes de quaisquer outros pelas autoridades e defensores da natureza em qualquer país mais ou menos civilizado do mundo ─ até porque prejudica diretamente os 21 milhões de brasileiros que moram na área metropolitana de São Paulo.
Parece, mas não é.
Não apenas não é: não passa pela cabeça de ninguém que possa ser assim, entre os milhares de ambientalistas, ecologistas, engenheiros ambientais, naturalistas, indigenistas, procuradores, fiscais e o resto dos burocratas que infestam as repartições de defesa do meio ambiente nos três níveis da administração.
Isso sem contar, naturalmente, com as ONGs “do verde”; para essas, então, falar em poluição urbana é praticamente um crime.
A única questão ambiental válida, em tal mundo, é o pacote que engloba florestas, cerrados, mangues, ilhas perdidas, fauna, flora, bagres de rio ─ tudo, em suma, que não inclua o ser humano, salvo se ele for índio.
O Rio Tietê que se dane.
O que interessa é pegar o cidadão que cortou um pé de gabiroba num sítio perdido em algum fim de mundo, ou exigir prisão inafiançável para o infeliz que matou um macaco-prego no sertão do Ceará.
O verdadeiro desastre ambiental do Brasil do século XXI não está no meio do mato, e sim na cara de todo o mundo, todos os dias; não afeta sapos ou papagaios, mas mata gente de carne e osso.
Centenas de cidades brasileiras com mais de 50.000 habitantes são envenenadas por rios mortos como o Tietê e o Pinheiros.
Não menos que 50% da população, ou 100 milhões de pessoas, não dispõem de esgotos.
Uns outros 40 milhões, possivelmente, não têm acesso a água tratada de boa qualidade.
Há 3.000 lixões em pleno funcionamento em 1.600 cidades por todo o país ─ aterros ao ar livre onde lixo e todo tipo de detritos são jogados e abandonados, sem qualquer tratamento.
Desde 2014 não deveria mais existir nenhum lixão aberto no Brasil, por exigência da lei; só que há mais lixões hoje do que havia cinco anos atrás.
Essas cordilheiras de dejetos contaminam a água, poluem o ar e envenenam o solo.
Cerca de 95 milhões de cidadãos, segundo cálculos das empresas de limpeza pública, têm sua saúde e qualidade de vida diretamente prejudicadas pelo descarte no lixo no meio da população em geral.
Mas quem é que está ligando para isso, entre os autocratas ambientais?
Suas paixões são outras.
Entre os surtos que vivem tendo, tornou-se conhecido, recentemente, o bloqueio que o Ministério Publico comanda há oito anos contra a construção da linha mestra de transmissão de energia elétrica em Roraima.
Como os 350 índios waimiri ─ isso mesmo, 350 ─ que vivem nos 225.000 quilômetros quadrados de Roraima têm objeções ao linhão, o MP vem vetando sistematicamente as obras, desde sua aprovação em 2011.
Com isso, a maior parte do território do Estado, e seus 500.000 habitantes, não recebem um único watt de eletricidade brasileira.
São obrigados a depender de fornecimento importado da Venezuela ─ que hoje não consegue produzir nem papel higiênico, e vive falhando na entrega.
Há, agora, um esboço de solução.
A população de Roraima reza.
O universo ecológico diz que o Brasil deveria, ao mesmo tempo, eliminar seus problemas ambientais urbanos, permitir o progresso e preservar a natureza.