A verdade mostra a cauda 10/07/2019
- CARLOS BRICKMANN - CHUMBOGORDO.COM.BR
A história é deliciosa: duas pessoas comendo algo que ambas apreciam, que se sabe que eles apreciam, mas que por motivos políticos não poderiam devorá-lo em público.
Algum desavisado os fotografou; algum mentiroso mandou esconder o prato; algum incompetente fez o trabalho, bem mal feito.
A deliciosa história envolve o embaixador de Israel e o presidente do Brasil.
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As leis alimentares judaicas, que só os ortodoxos seguem, proíbem o consumo de lagosta.
Não é o caso dos governantes de Israel, laicos – mas, como dependem do apoio de partidos religiosos, não comem em público alimentos proibidos.
Shelley violou essa norma política e, pouco antes do jogo entre Brasil e Peru, comeu lagosta no almoço com Bolsonaro – que, como tenta demonstrar, só gosta de hambúrguer, cachorro-quente, bandejão e pão com leite condensado.
Lagosta é coisa de ministro do Supremo, gente chique, que usa toga francesa em vez de camiseta do Palmeiras.
Shelley e Bolsonaro gostam de lagosta, claro, mas não gostam que isso seja divulgado.
Algum desavisado fotografou o almoço (para a Embaixada de Israel, que postou as imagens).
Algum pouca-prática mandou retocar a foto, apagando a lagosta (um photoshop a transformaria numa saladinha).
Algum inepto rabiscou as lagostas, mas sobrou cauda suficiente para identificá-las.
Outro desavisado postou a foto assim mesmo.
Onde já se viu isso, políticos que nem mentir sabem direito?
Viraram notícia até no Washington Post.
Tudo errado
Imaginemos que o inepto que rabiscou as lagostas tivesse feito um bom serviço.
Todos iriam querer saber o que é que Shelley e Bolsonaro mandaram ocultar.
Não podia dar certo. Por que não os flagraram enquanto ainda estavam no couvert, comendo azeitonas, cenoura, pão e ovinhos de codorna?
A Previdência…
A reforma da Previdência, espera o Governo, será aprovada até o fim da semana na Câmara; daí seguirá para o Senado.
Joice Hasselmann, a líder do Governo no Congresso, está confiante nisso.
Bolsonaro mais atrapalhou do que ajudou – e, diga-se em seu favor, não distribuiu cargos nem pixulecos a deputados de cujo voto precisa.
Liberou R$ 1,4 bilhão de verbas para emendas parlamentares, mas previstas em lei.
O máximo que fez pela reforma foi demitir alguns ministros para que reassumissem na Câmara e garantissem mais votos à aprovação.
Jogou limpo.
Mas quem realmente está empurrando a reforma é o presidente da Câmara, Rodrigo Maia.
…e daí?
Imaginemos que a reforma passe por Câmara e Senado, sem grandes modificações.
E que é que o Governo vai fazer no dia seguinte?
Como fará para que a reforma gere empregos e dê algum empuxo à economia do país?
O próximo passo é a reforma tributária.
Mas mais uma vez o Congresso toma a frente: enquanto a equipe econômica ainda não definiu a sua reforma, a Câmara retomou a proposta do líder do MDB, Baleia Rossi, assessorado pelo competente economista Bernard Appy, que de início unifica cinco impostos e toma medidas contra a guerra fiscal entre os Estados.
Acaba a mamata de hoje, em que o empreendedor negocia com vários Estados para ver qual lhe oferece mais vantagens, o que faz com que alguns bilhões de impostos não sejam arrecadados.
Serão atingidos interesses como os da Zona Franca de Manaus, e não se tem ainda ideia de como compensá-los.
Mas o trem anda.
O caminho das urnas
As várias reformas previstas poderão mexer positivamente na economia, o que fortalece a candidatura de Bolsonaro à reeleição, em 2011 (sim, é cedo, mas João Doria já é candidato e Rodrigo Maia flerta com a ideia).
Bolsonaro tem hoje o apoio de um terço do eleitorado: a pesquisa XP-Ipespe, feita a pedido da corretora XP, informa que 34% da população consideram que o Governo é ótimo ou bom (a pesquisa Datafolha é semelhante: 33%), 28% regular (Datafolha, 31%) e 35% ruim ou péssimo (Datafolha, 33%).
Mas o fato é que Bolsonaro perdeu boa parte de seus adeptos do início do Governo até hoje.
Em parte, por motivos políticos: ele conseguiu simbolizar a luta contra o PT.
Hoje, parte de seus aliados volta ao centro e busca candidato.
Os partidos
O caro leitor acha que os 33 partidos de hoje são muitos?
Bom, eram 35, e dois desapareceram: o PRP foi incorporado pelo Patriotas e o PPL pelo PCdoB.
Outro deve sumir; o PHS, absorvido pelo Podemos.
Mas tudo para por aí: já há no TSE dois pedidos de novas legendas, o Partido Nacional Corinthiano e o Partido da Evolução Democrática.
A UDN espera renascer a partir da anulação do Ato Institucional nº 2, que em 1965 extinguiu todos os partidos políticos.
E há 73 legendas que iniciaram processo de formação.
Montar partido é bom e barato, já que dão acesso ao Fundo Partidário.
Há anos, antes do aumento brutal dos recursos do Fundo, o dirigente de um partido nanico se queixava de ter só R$ 100 mil por mês para as despesas.