O presidente era sempre o primeiro a chegar na reunião de segunda-feira. Os ministros já sabiam que o encontrariam na cabeceira da mesa, conversando à boca pequena com uma ou outra liderança partidária, diante de uma pilha de anotações que resumiam a pauta do dia.
Todos sabiam que o clima da reunião tinha relação direta com o “Fantástico” da noite anterior.
Se as notícias eram boas, a reunião era animada e cheia de piadas. Se surgisse alguma denúncia, era um deus nos acuda.
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O ministro da Casa Civil, sentado à direita do mandatário, costumava marcar o ritmo e, assim que todos os outros ministros estivessem acomodados, dava um passa-moleque nos políticos, pedia que os jornalistas fizessem as últimas fotos e iniciava os trabalhos da semana.
Segunda-feira passada os ministros chegaram e nada do presidente. Mau sinal.
Alguém perguntou quanto tinha sido o jogo do Palmeiras.
– Não teve jogo — lembrou o ministro da Economia.
– Xi. Alguém viu o “Fantástico”? — perguntou o titular da Educação.
– Nada demais. Só escândalo requentado — respondeu a da Agricultura.
Mau sinal.
O da Casa Civil saiu discretamente.
Meia hora depois, batia na porta do quarto, após ser informado que o presidente não havia saído da cama.
– Estava no celular quando entrei para pegar a bandeja do café da manhã. Nem encostou no requeijão — revelou o mordomo.
Mau sinal.
O ministro insistiu com mais três batidas na porta. Nada. Nenhuma resposta.
Cuidadosamente, por uma fresta, pôde ver o presidete de pijamas, no quarto escuro, com os olhos vidrados no celular.
– Presidente?
– Me deixa.
– Mas presidente, estão todos esperando o senhor.
– Diz que eu tô gripado.
O ministro, ignorando o bom senso, foi se aproximando da cama lentamente.
– Mas, presidente… Temos muito o que decidir: a reforma, a posse de armas, a Previdência! Vamos lá. Ânimo!
– Você leu a pesquisa do Datafolha?
– Ah, presidente! Quem é que liga para pesquisa?
– Não importa quem liga. Importa que eu tô despencando.
O ministro sabia que a situação era grave. Afinal, depois de seis meses de governo, o presidente era mais impopular que Collor e Dilma no mesmo período.
Uma foi “impichada” e o outro só não caiu por ter deixado o cargo antes.
– Isso não significa nada presidente. Além do mais, não é culpa sua.
O presidente olhou o ministro com curiosidade.
– Culpa de quem então?
O ministro, pego de surpresa, improvisou.
– Culpa do… Do Rodrigo, do Olavo, do Davi. Culpa dessa gente aí que não ajuda o senhor a governar.
O presidente não se convenceu. Ele sabia que a culpa de um governo impopular é sempre do governante.
E olha que tentou de tudo.
– Falei mal de gay, tirei foto de sandália de dedo, meti o pau nos índios, nas ONGs, nos quilombolas, virei trend do Twitter uma centena de vezes e nem assim.
O ministro pensou em sugerir que talvez aquelas atitudes fossem a causa da sua impopularidade. Mas não teve coragem.
– Eu sou testemunha, presidente. O senhor mandou muito bem. Pode ficar tranquilo.
– Né?
– É.
– Então o que é que eu tenho que fazer para reverter esse quadro?
O ministro não fazia a menor ideia. Mas, no desespero, deu uma sugestão.
– Aproveita alguma notícia boa, presidente. Sabe como é. Associe seu nome com alguma unanimidade. Surfe em uma onda positiva.
Os olhos do presidente brilharam. O ministro tinha razão.
Meia hora depois, ele entrou na sala de reuniões envergando a camisa da seleção que ganhou do Everton Cebolinha.