Ataque à paradeira com o FGTS 25/07/2019
- CELSO MING - O ESTADO DE S.PAULO
E a montanha vai parir algo mais do que um rato. Mas a improvisação diz mais sobre a maneira como são tomadas (e anunciadas) certas decisões no governo do que sobre a disposição de virar a paradeira.
A primeira informação sobre a disposição do governo de liberar recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para reforço do orçamento do consumidor sugeriu o despejo de R$ 42 bilhões no mercado, volume que poderia ajudar a reativar o consumo e, a partir daí, empurrar para um adicional de PIB em torno de 0,3%.
Mas aí vieram as pressões dos empresários da construção civil, que querem o uso quase exclusivo do FGTS para amortização da compra de moradia, portanto, para azeitar seu negócio.
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Assim, o governo aceitou com surpreendente facilidade certa desidratação da proposta original.
Com isso, os saques ficarão limitados a R$ 500 por conta do FGTS e, ainda assim, em volume proporcional ao saldo em conta.
Como 81% dos 260 milhões de contas não têm saldo superior a esses R$ 500, para essa faixa a retirada de recursos acabará sendo inferior a uma diária de faxineira.
Assim, o bolão de R$ 42 bilhões originais não deverá passar de R$ 28 bilhões, volume insuficiente para desencadear uma onda de otimismo no mercado de consumo.
A opção não foi combater a seca no canavial com irrigação de pivô, mas com aspersões de água de torneira.
Sempre haverá quem argumente que pouco é sempre melhor do que nada ou, então, que ao paliativo é preciso acrescentar o principal.
Ou, então, que o objetivo é ganhar tempo até que as reformas comecem a produzir resultados.
De todo modo, o que deveria chegar como importante decisão de reativação da economia leva boa dose de decepção, não propriamente porque o governo cedeu ao lobby das construtoras, mas porque mostrou improvisação e falta de avaliação prévia sobre o inicialmente pretendido.
Ninguém espera por milagres. Mas o previamente anunciado inflou as expectativas.
Na hora em que o trabalhador meter no bolso a parte que lhe couber no pacotinho, o sentimento tenderá a ser de certo desapontamento.
A área econômica do governo passa, assim, três sinais:
(1) que vem sendo surpreendida pela falta de reação do setor produtivo;
(2) que não tem plano claro para enfrentar a paradeira, não propriamente por uma política contracíclica, que não é do DNA desta equipe, mas com providências que, de alguma maneira, possam servir de motor de arranque da economia; e
(3) que não sabe como evitar desgastes políticos provenientes de um plano mal divulgado.
Efeito de mais longa duração poderá acontecer a partir da semana que vem, quando o Copom começará a reduzir os juros básicos (Selic), parados nos 6,5% ao ano desde abril de 2018.
A pesquisa Focus mostra que a economia espera a queda dos juros para 5,5% ao ano, nas próximas quatro reuniões do Copom agendadas para este resto de 2019. Juros mais baixos põem mais dinheiro na roda.
Nesse sentido, os recursos do FGTS podem contribuir para que o segmento de baixa renda da população resgate parte de suas dívidas.
Seria o primeiro passo para enfrentar a inadimplência e abrir caminho para que o crédito possa atuar.
O deslize do dólar
Desde o pico dos R$ 4,11 atingido em 20 de maio, as cotações do dólar caíram 8,6%. Em julho, o recuo é de 2,37%; e desde o início do ano, de 2,86%.
É trajetória que mostra menor procura por moeda estrangeira e menor disposição para montar defesas contra crises de confiança.
Apesar do mau desempenho do lado fiscal, as contas externas continuam em excelente condição.
O saldo comercial deverá fechar o ano em torno dos US$ 50 bilhões e a entrada de investimento estrangeiro, nos US$ 85 bilhões.