Manobra da oposição coloca Lula nas mãos de Renan 28/09/2007
- Blog de Josias de Souza - Folha Online
Senador retém MP que, se enviada à Câmara, obstrui CPMF
Na mesma noite em que rejeitou a medida provisória que dava emprego de ministro a Roberto Mangabeira Unger, o Senado aprovou outras quatro. Numa delas, a oposição injetou uma emenda que modificou o texto original. Graças à alteração, a MP precisa voltar à Câmara, para que os deputados a reapreciem. Renan Calheiros, porém, sentou em cima do documento.
Na prática, a velocidade da votação da CPMF está agora submetida aos humores do presidente do Senado. Se enviar a medida provisória para o prédio ao lado, Renan provocará o trancamento da pauta do plenário da Câmara. Antes de votar, em segundo turno, a emenda que dá sobrevida ao imposto do cheque até 2011, os deputados seriam obrigados a relatar, discutir e votar a MP modificada pelos senadores.
Pela lei, as MPs têm preferência sobre todas as outras matérias legislativas. Nada pode ser votado antes delas. Na noite de quarta-feira (26), enquanto os senadores votavam a medida provisória que carrega o cavalo-de-tróia oposicionista, os deputados concluíam, a toque de caixa, o primeiro turno de votação da CPMF. Os líderes Arthur Virgílio (AM), do PSDB, e José Agripino Maia (RN), do DEM, pressionaram Renan para que enviasse imediatamente a MP emendada à Câmara.
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Se atendesse ao pedido, Renan provocaria a interrupção instantânea da sessão da Câmara. Deputados tucanos e ‘demos’, alertados, estavam prontos a levantar em plenário questões de ordem exigindo o sobrestamento da votação da CPMF. Renan, porém, fez ouvidos moucos para os apelos de Virgílio e Agripino. Só o líder do PSDB repisou a solicitação cinco vezes. E nada.
Assim, com o assentimento de Renan, o PMDB impôs ao governo uma humilhação calibrada. Transformou-se Mangabeira Unger em ministro sem pasta. Mas evitou-se jogar gasolina na fogueira que a oposição planejava acender na Câmara. Livre da chegada incômoda da medida provisória, os deputados governistas puderam concluir o primeiro turno de votação da CPMF. Deu-se às duas e meia da madrugada de quinta (27).
Nesta quinta-feira (27), Renan continuou fingindo-se de morto. Se a MP não for remetida à Câmara até o início da próxima semana, a oposição ameaça retomar a operação padrão que parou o Senado na semana passada. “Se procrastinarem o retorno da medida provisória à Câmara, partiremos, de novo, para a obstrução”, disse Agripino Maia ao blog.
O segundo turno da votação da CPMF na Câmara só pode ocorrer a partir de quinta-feira (4) da semana que vem. O regime impõe uma espera de cinco sessões legislativas. Ou seja, para evitar percalços ao governo, Renan teria de manter a medida provisória na gaveta por pelo menos mais seis dias úteis.
A MP na qual a oposição injetou a sua manobra é a de número 374. Trata de questões previdenciárias. Num de seus artigos, autoriza Estados e municípios a parcelarem dívidas com o INSS em 240 meses (20 anos), comprometendo 1,5% de suas receitas líquidas. Um percentual que, dependendo do valor do débito, poderia levar a uma liquidação em prazo inferior aos 20 anos estabelecidos na MP.
A emenda oposicionista alterou a redação, para permitir que governadores e prefeitos optem por parcelas inferiores a 1,5% de suas receitas, de modo a que a rolagem atinja o prazo máximo de 240 meses. Para desassossego do Planalto, não houve quem votasse contra a modificação no Senado. Todos os partidos administram executivos estaduais e municipais. Armou-se, então, a encrenca que acomodou Lula, uma vez mais, na mão de Renan Calheiros.