Mesmo com ¨auto-suficiência¨, aumenta déficit na balança do petróleo 02/01/2008
- Humberto Medina- Folha de S.Paulo
O déficit na balança comercial de petróleo aumentou, mesmo com ¨auto-suficiência¨ na produção do combustível, proclamada em abril de 2006
A quantidade de petróleo importada pelo país de janeiro a outubro de 2007 cresceu quase 17% na comparação com o mesmo período de 2006. O déficit na transação comercial do combustível subiu de US$ 2,141 bilhões para US$ 4,457 bilhões --mais do que duplicou.
De janeiro a outubro de 2006, o Brasil importou 17,7 bilhões de litros de petróleo. Em igual período de 2007, a quantidade subiu para 21,3 bilhões de litros, segundo informa a ANP (Agência Nacional do Petróleo). Na compra do petróleo no mercado internacional, o país gastou aproximadamente US$ 7,7 bilhões em 2006 (até outubro). Em 2007, esse valor subiu para cerca de US$ 9,5 bilhões.
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A auto-suficiência não é alcançada na prática por causa das características do petróleo produzido no Brasil.
O país produz óleo pesado (mais viscoso, mais barato) e não tem condições de refinar essa matéria-prima e produzir derivados (óleo, gasolina, querosene etc). O refino do petróleo pesado é mais caro e tem dificuldades técnicas. Por isso, é necessário importar petróleo leve (menos viscoso, mais caro) e misturar ao pesado.
¨Nós temos uma auto-suficiência virtual¨, afirma o pesquisador Giuseppe Bacoccoli, da Coppe (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação de Engenharia da UFRJ).
¨Importamos o petróleo mais valioso e exportamos o menos valioso¨, afirma.
Segundo ele, a situação pode melhorar no médio prazo, caso as expectativas da Petrobras com a produção do campo de Tupi se confirmem.
De acordo com a análise feita pelo professor Saul Suslick, diretor do Cepetro (Centro de Estudos do Petróleo da Unicamp), o déficit na balança comercial de petróleo se deve a atrasos e dificuldades na operação das plataformas da Petrobras. Ele avalia que a balança comercial do petróleo deverá deixar de ser deficitária a partir do final deste ano.
¨Há várias plataformas entrando em operação, que vão produzir um óleo mais leve do que o que está sendo atualmente produzido. Isso deve melhorar a balança comercial¨, disse.
De acordo com Suslick, a Petrobras não errou ao divulgar a auto-suficiência. ¨A Petrobras sempre foi muito correta nos seus comunicados. O problema é a pirotecnia que se faz depois¨, afirmou.
Ainda de acordo com o diretor do Cepetro, a descoberta do campo de Tupi não deverá contribuir para resolver a questão da balança comercial de petróleo no curto prazo. ¨Se as reservas se confirmarem, na melhor das hipóteses, a produção em grande escala vai acontecer em torno de 2014 ou 2015¨, disse.
De acordo com Felipe Dias, do setor de Economia e Política Energética do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis), a produção nacional de petróleo se manteve relativamente estável de 2006 a 2007 (1,72 milhão de barris por dia em 2006 e 1,75 milhão em 2007).
¨A produção não cresceu como se esperava no inicio de 2007, possivelmente por questões técnicas¨, informou, via correio eletrônico.
Segundo ele, não há recuo de produção que justifique piora no saldo comercial.
Para o analista, a explicação se deve mais ao tipo de petróleo produzido no país (pesado, de menor valor) e às cotações no mercado internacional.
¨Para obter um saldo comercial zero, temos de exportar mais que importar, em algum nível que equilibre esse diferencial de preço [entre óleo pesado e leve]. Pois bem, o que aconteceu ao longo de 2007 foi uma piora das condições comerciais para o país nessa transação¨, analisa.
¨Não apenas o preço do petróleo subiu fortemente, mas este diferencial entre o preço de óleos de melhor e pior qualidade também aumentou, afetando negativamente o saldo comercial brasileiro¨, explica Dias. Ele, no entanto, espera uma mudança nessa situação a partir deste ano.
Novas unidades
¨Neste ano devemos observar uma inversão desta situação, com a entrada em produção das novas unidades previstas no Plano de Negócios da Petrobras. Breve teremos um saldo positivo em exportações líquidas que compense esse diferencial de preços¨, afirmou. Ainda segundo ele, o futuro aponta para uma situação bem mais confortável.
¨Na próxima década, a produção de petróleo no Brasil deverá crescer a uma média de cerca de 7% ao ano, enquanto o consumo, caso o Brasil retome de fato um ritmo mais intenso e sustentável de crescimento, não deve passar dos 3% ao ano.¨