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O OUTRO LADO DA NOTÍCIA

Reajuste com tom político
03/05/2008 - O Estado de S.Paulo

O governo segurou o preço dos combustíveis o quanto pôde. Afinal, a majoração dos preços da gasolina e do diesel é uma medida impopular, seja porque afeta diretamente o bolso de todos, seja porque pode aumentar a inflação. Mas do último aumento que autorizou, em setembro de 2005, até agora, o preço do petróleo subiu quase 100% e o governo não tinha mais como postergar o reajuste - de 10% para a gasolina e de 15% para o óleo diesel, nas refinarias. Mas, em nova demonstração do que é capaz para não abalar sua popularidade, decidiu abrir mão de parte da receita tributária - cuja preservação dizia ser essencial à política fiscal - para reduzir ao máximo o efeito da alta nos postos de combustíveis.

O represamento do preço da gasolina e do óleo diesel por dois anos e cinco meses corroía os resultados operacionais da Petrobrás e já comprometia sua capacidade de investimentos. Até razões de mercado - entre as quais a necessidade de competir com o álcool, mais barato do que a gasolina - foram invocadas para justificar a decisão do governo de não aumentar os combustíveis. Essas explicações seriam aceitáveis se tal política não provocasse distorções. Mas provocou.

Para os acionistas da empresa - o maior dos quais é o próprio governo -, a mais evidente foi a redução da rentabilidade da empresa, que seus dirigentes tentaram justificar com argumentos como o aumento dos custos de manutenção das plataformas ou o atraso na entrega de equipamentos encomendados.


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Outra distorção foi a perda da capacidade de investimentos da Petrobrás, justamente no momento em que ela precisa investir nos novos campos de petróleo e gás identificados na Bacia de Santos. Apenas num desses campos, o de Tupi, por exemplo, os investimentos necessários são calculados em, no mínimo, US$ 20 bilhões. Além de aplicar em exploração, a empresa precisa investir também em refinarias, para as quais vem procurando sócios, mas a contenção artificial dos preços dos combustíveis afugentava os que podiam ter interesse na associação com a Petrobrás.

Rendendo-se, finalmente, a uma necessidade econômico-financeira inquestionável da Petrobrás, o governo não perdeu de vista seus interesses político-eleitorais. Aumentou o preço dos combustíveis nas refinarias, mas, para que o aumento não fosse repassado integralmente para os consumidores, cortará de R$ 0,28 para R$ 0,18 o valor da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) cobrado sobre o litro de gasolina, e de R$ 0,07 para R$ 0,03 por litro de óleo diesel.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, prevê que, com o corte da Cide, o aumento da gasolina nas refinarias não terá nenhum efeito sobre o preço cobrado do consumidor nas bombas. No caso do diesel, como o aumento nas refinarias foi maior e a redução da Cide, bem menor, o impacto sobre o preço final pago pelo consumidor pode chegar a 8,8%. Diesel mais caro encarece o transporte de mercadorias e de passageiros. Em algum momento, isso terá efeito sobre os preços em geral e sobre as tarifa dos ônibus, em particular.

Economistas que acompanham os índices de preços estimam que, se o ministro da Fazenda estiver certo a respeito do efeito dos aumentos agora anunciados sobre o preço dos combustíveis nos postos, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) - que é utilizado como baliza para a política de metas inflacionárias do Banco Central - registrará impacto de 0,01 ponto porcentual em maio. Efeito maior será captado pelo Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), que, por ter forte influência dos preços no atacado (que respondem por 60% do índice), sentirá mais o aumento dos preços nas refinarias. Mesmo assim, o impacto desse aumento no IGP-M será de 0,07 ponto porcentual.

Do ponto de vista fiscal, o corte da Cide terá um efeito não desprezível. Calcula-se que o corte imporá ao governo perda de R$ 2,5 bilhões a R$ 3 bilhões da receita com esse tributo em um ano. Como a receita total da Cide tem sido de cerca de R$ 8 bilhões por ano, a perda ficará entre 30% e 40% da arrecadação. É um corte profundo, que o governo, normalmente resistente a todo tipo de redução de receita, desta vez aceita sem hesitação, por entender que este é o preço a pagar para não agravar as pressões inflacionárias e para preservar sua popularidade.

  

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