A falta de fertilizantes 15/05/2008
- O Estado de S.Paulo
Uma nova forma de protecionismo, desta vez imposta por alguns países exportadores, ameaça a produção agrícola mundial. Depois que alguns países limitaram as exportações de grãos, como arroz, para garantir o suprimento interno, agora são produtores de fertilizantes que restringem o embarque do produto para o exterior. O Brasil está entre os grandes produtores agrícolas mundiais e já começa a sentir os efeitos desse novo protecionismo, pois depende de fertilizantes importados. A alta excepcional do preço desses insumos nos últimos meses já começa a ser vista como ameaça para a safra recorde de 142 milhões de toneladas de grãos prevista pelo governo.
Em reais, o preço dos fertilizantes subiu 73% em 12 meses até abril, e mais de 40% só em 2008, de acordo com o Índice de Preços por Atacado (IPA), o principal componente do Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI), da Fundação Getúlio Vargas. Outros insumos agrícolas, como sementes e herbicidas, também subiram muito nos últimos meses. Mas a alta dos fertilizantes tende a ser mais sentida pelos produtores.
Áreas degradadas de pastagens, que poderiam receber plantações de soja, por exemplo, já estão sendo descartadas pelos produtores. ¨Agora, nem se sonha em abrir uma área com um custo desses, especialmente hoje que a cotação da arroba do boi gordo está em níveis recordes¨, disse o presidente da Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Glauber Silveira da Silva, à repórter do Estado Márcia De Chiara.
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Em Sorriso (Mato Grosso), o município que mais produz soja no mundo, o fertilizante representou 57% do custo da última safra; na próxima, representará mais de 60%. Os agricultores escolherão melhor as áreas de plantio para reduzir o emprego de adubo. No Paraná, também grande produtor de grãos, o uso de adubo será restrito, diz o presidente da Cocamar Cooperativa Agroindustrial.
A maior produtora mundial de fertilizantes, a China - que é também o maior consumidor mundial, absorvendo 30% da produção -, bloqueou as exportações, com a imposição de pesadas tarifas. As exportações chinesas de nutrientes derivados de nitrogênio são taxadas entre 100% e 135%. Outro grande produtor mundial, a Rússia, impôs taxação de 6,5% sobre os embarques para o exterior de enxofre, indispensável para a produção de fosfatados, e de 5% sobre os embarques de nutrientes de potássio. Nitrogênio, fosfato e potássio são as principais fontes de nutrientes para os adubos.
A alta do petróleo encareceu também a nafta, um derivado utilizado na composição de defensivos agrícolas, o que fez crescer ainda mais os custos da produção agrícola.
Por outro lado, está muito aquecida a demanda mundial de fertilizantes. Atrás da China, como grandes consumidores, estão a Índia (que consome 14% da produção mundial), Estados Unidos (12%) e Brasil (6%). A associação internacional da indústria de fertilizantes estima que, neste ano, o consumo mundial ficará em 175,8 milhões de toneladas, 5,5 milhões de toneladas a mais do que em 2007.
Quanto à produção mundial, o Brasil responde por apenas 1% de adubos nitrogenados e derivados de potássio e 4% dos adubos fosfatados. A baixa disponibilidade de fontes de matérias-primas, o alto custo dos investimentos em produção e a diferença de tratamento tributário do produto nacional e do importado desestimulam projetos industriais na área.
Se o ritmo de crescimento da demanda das commodities agrícolas se mantiver, sem que haja um aumento expressivo da produção nacional, pode-se chegar a uma situação em que os gastos com importação de fertilizantes afetarão os saldos comerciais do agronegócio brasileiro. Preocupado, o governo começa a procurar formas para ampliar a produção nacional de nitrogênio, fósforo e potássio. Ainda que esse esforço tardio tenha êxito, os resultados demorarão a aparecer.
A elevação dos custos, puxada pelos fertilizantes, diz o analista Flávio Roberto de França Jr., da consultoria Safra & Mercados, ¨será o calcanhar-de-aquiles da próxima safra brasileira de grãos¨.